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Cristina Kirchner e Lula (Foto: Cristina Kirchner / Flickr)

Denúncia em Haia e cruzada diplomática: após condenação, Cristina Kirchner vai seguir passos de Lula

Não se trata apenas de dar visibilidade ao caso em nível global, mas de alertar sobre a deterioração institucional que representa excluir do processo eleitoral argentino a principal figura da oposição

Paula Marussich
Página 12
Buenos Aires

Tradução:

Guilherme Ribeiro*

O advogado de Cristina Kirchner, Gregorio Dalbón, viajou nesta terça-feira (10) à Corte Penal Internacional (CPI) em Haia para denunciar a perseguição política, judicial e midiática desencadeada na Argentina contra a ex-presidenta e atual líder do Partido Justicialista (PJ). “A luta será global”, antecipou Gregorio Dalbón, ao confirmar que serão ativados todos os mecanismos de revisão internacional disponíveis. Paralelamente, o PJ colocou em marcha uma ofensiva diplomática por meio de sua Secretaria de Relações Internacionais, que já articula com os principais representantes do progressismo regional e mundial. Tendo como base o antecedente brasileiro, o PJ se espelha na experiência de Lula para coordenar seus próximos passos e levar a denúncia da proscrição à arena internacional.

A encruzilhada política que a proscrição de Cristina Fernández de Kirchner abre reativou no peronismo seu histórico reflexo internacionalista, guiado por uma das máximas do pensamento de Perón: “A verdadeira política é a política internacional”. O objetivo é projetar a denúncia para além do cenário local e avançar com apresentações formais perante os principais organismos multilaterais.

Não se trata apenas de dar visibilidade ao caso em nível global, mas de alertar sobre a deterioração institucional que representa a exclusão da principal figura da oposição do processo eleitoral argentino. “Estamos vivendo uma situação muito similar à de outros países latino-americanos, que todos qualificam como ‘governos ditatoriais’. Em pleno processo eleitoral, vão proscrever a candidata mais importante que a oposição tem”, denunciou a senadora Juliana Di Tullio, da sede nacional do PJ.

Na segunda-feira, na histórica sede da rua Matheu 130, as distintas correntes do peronismo se reuniram para definir uma linha de ação comum diante de um cenário que já previam adverso. Embora ainda faltassem 24 horas para a divulgação da sentença que inabilitou Cristina Fernández de Kirchner para exercer cargos públicos de forma vitalícia e a condenou a seis anos de prisão, uma voz do Instituto Patria pediu para “unificar as iniciativas” e evitar ações individuais que pudessem diluir o impacto político da resposta, conforme detalhado pelo Página 12. A mensagem foi clara: concentrar esforços em uma estratégia internacional coordenada, capaz de reunir pronunciamentos dos principais líderes progressistas do mundo.

A responsabilidade de articular essa ofensiva diplomática recaiu sobre a Secretaria de Relações Internacionais do PJ, chefiada por Gustavo Menéndez, que já começou a ativar contatos com dirigentes e governos dispostos a se manifestar. A confirmação da condenação já foi comunicada formalmente a mandatários como Gustavo Petro e Luiz Inácio Lula da Silva, e haviam sido iniciadas gestões com líderes de peso global como Vladimir Putin e Xi Jinping. No caso brasileiro, o canal privilegiado é o Instituto Lula — que já se pronunciou sobre a questão —, mas também existe um vínculo direto com o chanceler Celso Amorim, que mantém o presidente informado sobre cada passo. Nesta quarta-feira, às 16h, os representantes da área internacional voltarão a se reunir na sede partidária para ajustar a estratégia regional e global.

Paralelamente, o Instituto Patria organiza para esta sexta-feira (13) uma atividade internacional junto ao Instituto La Boétie da França: uma conversa aberta sobre a perseguição política, judicial e midiática contra CFK. O encontro é articulado com o movimento A França Insubmissa, liderado por Jean-Luc Mélenchon, e contará com a participação de Sophia Chikirou, deputada nacional francesa.

A denúncia internacional

“A luta continua. E será global”, escreveu Dalbón em sua conta no X assim que a condenação foi confirmada. “A sentença não resiste ao mais mínimo controle de constitucionalidade nem de convencionalidade. Não tem legitimidade jurídica nem moral”, acrescentou. Por isso, anunciou que foram ativados os principais canais de revisão internacional: a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, o Conselho de Direitos Humanos da ONU, a própria Corte Penal Internacional e cada fórum jurídico multilateral onde ainda se defenda o Estado de Direito. A proposta, sublinhou, não é apenas em defesa da ex-presidenta, mas da democracia como sistema. “Quando um poder judicial deixa de proteger os inocentes para servir ao poder, o que está em jogo não é apenas a liberdade de uma pessoa: é a própria saúde da democracia”, concluiu.

Com as instâncias de apelação já esgotadas na Justiça argentina, o plano internacional adquire um peso decisivo na estratégia jurídica do peronismo. Assim explicou o advogado Carlos Beraldi, ao detalhar que a condenação impõe duas sanções: uma pena de prisão e uma inabilitação perpétua para exercer cargos públicos. Apesar das arbitrariedades denunciadas durante o processo, ambas as sanções foram confirmadas e sem possibilidade de revisão interna, o que — segundo afirmou — obriga a recorrer ao sistema interamericano de direitos humanos. “A forma de impugná-la seria perante a Comissão Interamericana, que conta com mecanismos que permitem um tratamento mais rápido que outras instâncias”, sustentou. Caso se obtenha uma decisão favorável, poderá ser apresentado um recurso de revisão na Argentina que permita a aplicação imediata da resolução internacional e anule a proscrição.

Beraldi advertiu que os prazos do processo são um fator-chave. Em sua opinião, aqueles que promoveram a “arbitrariedade judicial” sabiam que conseguiriam excluir Cristina do cenário eleitoral, ao menos por um tempo. “O mais grave — lamentou — é que isso vai resultar em uma sanção internacional contra a Argentina. E, no fim das contas, por culpa de funcionários que não cumprem seus deveres institucionais, é o país que termina sendo punido”, lamentou. Embora o documento divulgado pela Corte conceda cinco dias úteis para que a ex-presidenta cumpra a condenação, o Página12 soube que o advogado recomendou não abandonar as ruas.

Os primeiros pronunciamentos

A ratificação da condenação também ativou uma onda de reações no plano internacional. O Grupo de Puebla — que reúne ex-presidentes e representantes do progressismo ibero-americano como Dilma Rousseff, Rafael Correa, José Luis Rodríguez Zapatero e Ernesto Samper — foi um dos primeiros espaços a repudiar a sentença. “A justiça jamais pode ser uma ferramenta de proscrição política. Nosso apoio total e absoluto a @CFKArgentina”, publicaram no X. Em diálogo com este jornal, um de seus líderes assegurou que o acompanhamento das repercussões é constante: “Estamos acompanhando minuto a minuto” e acrescentou: “Vamos apoiar a denúncia internacional, e se ela decidir apelar à CIDH, estaremos lá”.

Página/12, especial para Diálogos do Sul Global – Direitos reservados.
* Tradução feia com apoio de IA e conferida.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

Paula Marussich

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