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No Peru, um cenário que provoca asco

Revista Diálogos do Sul

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Hoje, para ver o que acontece no Peru é preciso consumir previamente uma alta dose de anti-vomitivos. É que tudo se mostra, simplesmente, nauseabundo. Podemos afirmar que passamos pelos horrores de todos os infernos para impedir que o Peru volte à Década Dantesca dos anos 90; mas mesmo assim o perigo subsiste.

Gustavo Espinoza M.*

Há alguns anos, dissemos que a Máfia Fuji Aprista do Peru havia aviltado a vida nacional. Não nos enganamos. Mas havia muito mais. Não só a aviltou, mas, além disso, a degradou ao extremo até convertê-la em uma massa de esterco e outras substâncias do mesmo tipo.

Hoje, para ver o que acontece no Peru é preciso consumir previamente uma alta dose de anti-vomitivos. É que tudo se mostra, simplesmente, nauseabundo.

No ano 2000 vimos uma parte dos vídeos filmados na salinha do SIN. Ali esteve Genaro Delgado Parker, com Guisela Valcárcel comprometendo a Televisão Peruana; José Francisco Crousillat portando a lealdade de lacaio de Laura Bozzo; o atual marido de Cecilia Valenzuela pondo preço às pesquisas de opinião;  Luz Salgado, Martha Chávez, María Luisa Cuculiza, reptando a partir dos corredores do Congresso; Álamo Pérez Luna –hoje sócio de Betho Ortiz; Agustín Mantilla Campos recebendo dinheiro para a APRA; e muitos outros espécimes da fauna política daqueles tempos em que as “verdinhas” saltavam aos montes para escárnio da miséria de milhões de peruanos.

Hoje, as coisas não são essencialmente diferentes. São Juízes, Procuradores e Promotores os que correm a galope pelos caminhos da corrupção; enquanto os congressistas os protegem desde seus postos blindados, e ministros – junto com outros altos funcionários – não agem sequer como amigos dos delinquentes, senão como cúmplices e beneficiários de suas trapaças.

A Máfia entronizada no Poder Judicial une todos os cabos imagináveis

Os vídeos, apresentados como em uma série sucessiva de nauseabundas projeções, tiveram a virtude de levantar a ira dos peruanos, adormecida há algum tempo, mas mesmo assim, pronta para a batalha.

Foi essa ira que fechou o caminho de Keiko em 2011 abrindo uma rota que finalmente se frustrou pela inépcia de seu condutor; e tornou a se fechar com cadeado de aço em 2016, para dizer outra vez NÃO à “senhora K” que ainda pretende se converter em Imperadora deste martirizado país.

Bem podemos afirmar que passamos pelos horrores de todos os infernos para impedir que o Peru volte à Década Dantesca dos anos 90; mas mesmo assim o perigo subsiste, e assim será enquanto reine a confusão e se organize o caos para servir como ponte ao mais deplorável do cenário nacional.  

A Máfia entronizada no Poder Judicial une todos os cabos imagináveis. César Hinostroza – ainda livre – é homem de Keiko, como são também o empresário Antonio Camayo, de Iza Motor; e José Luis Cavassa; enquanto que Mario Mendoza, o é da APRA e Walter Ríos se soma aos dois com uma detestável quadrilha de vândalos.

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[/pullquote]Vários deles ditaram as sentenças condenatórias para os réus que não puderam ou não quiserem “soltar verdinhas” nos últimos anos, e absolveram os culpados. Hoje deveriam sair os que estão dentro e entrar os que estão fora; seria talvez uma elementar maneira de restituir os casos ao seu estado inicial para ver se é possível, mais adiante, realmente administrar justiça.

A mensagem do Presidente Vizcarra ante o Congresso Nacional por ocasião das Festas Pátrias, não foi um barril vazio, como ocorreu em outros casos. Agora conteve algumas novidades. O Referendo talvez seja a mais interessante.

Trata-se, por certo, de uma resposta fraca, quase inconsistente, a uma sociedade que está a ponto do colapso; mas que, ainda assim, pode ser legitimamente usada pela cidadania. 

O simples fato de que o Referendo seja considerado como um caminho, isso outorga legitimidade às demandas cidadãs, que querem outro Poder Judicial, mas também outro Congresso da República e até outro governo que reúna apenas dois requisitos mínimos: que seja honrado e eficiente.

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[/pullquote]É claro que nossos males, são maiores: o Neoliberalismo como esquema econômico; a Constituição de 93 como corda no pescoço dos peruanos; a corrupção galopante e a insegurança cidadã; em suma, o sistema de dominação capitalista, apodrecido até os ossos. 

Mas para isso não faz falta um Referendo, mas sim uma Revolução, na acepção e no sentido que lhe dera José Carlos Mariátegui, em 1929.

A inútil “maioria parlamentar” –que continua sendo apesar de tudo – buscará eludir a todo custo qualquer consulta cidadã que afete seus interesses e privilégios. Dirá, desde o início, que nada tem contra um Referendo – qualquer Referendo – com a condição “de que se juste à lei”. E depois procurará uma “interpretação autêntica da lei” que lhe permita assegurar que a consulta não poderá ser feita a não ser que o Congresso – “Primeiro Poder do Estado” –considere oportuno.

A partir daí buscará somar novos temas aos pontos propostos. A Pena de Morte, por exemplo; a exigida “retirada” da Corte Interamericana de Direitos Humanos, para não pôr em risco o Indulto; o “matrimônio gay”, e outras lindezas. E quando se lhes faça ver que já são muitas as perguntas do Referendo, aceitará com prazer “tirar algumas”, por exemplo, a que se refere à reeleição dos Congressistas. Assim, já não haverá muitas interrogantes para o cidadão que compareça ao Referendo.

Há quem creia que “a saída” no marco desta crise é a eleição imediata de uma “Constituinte”. Na teoria parece que é assim, mas, quem haverá de convocar uma Constituinte?  Quais serão as normas que regerão esse processo? Quem decidirá? E há mais: que partidos poderão inscrever candidatos para essa Constituinte? Só os atualmente inscritos, ou seja o Keikismo, a APRA e o arquipélago que acompanha esse registro? Quando será definido isso, e por conta de quem correrá tal definição?

Não nos enganemos. A solução aos problemas do Peru só poderá brotar da vontade do povo. Poderão ser tomados “atalhos”, percorrer caminhos obstruídos, buscar vias inéditas e até dar a mão que nos estendam em um ou outro canto. Mas de qualquer forma, será o povo – e sua vanguarda natural, os trabalhadores – que nos indicarão as tarefas a ser cumpridas.

*Colaborador de Diálogos do Sul, de Lima, Peru.

 


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
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