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ToggleO Mercado Comum do Sul (Mercosul), que completa 34 anos nesta quarta-feira, 26 de março, atravessa um momento crucial em sua história. Há mais de 30 anos de sua criação, o bloco enfrenta desafios tanto internos como externos que poderiam definir seu futuro: avançará para uma integração mais forte ou estancará em velhas contradições? Para uma integração real ou um estancamento eterno?
Desde sua fundação, em 1991, o Mercosul foi uma aposta na cooperação econômica e política no Cone Sul. No entanto, as divergências entre seus membros tem sido uma constante. Enquanto alguns governos promovem uma maior abertura comercial e flexibilidade na negociação de acordos, outros insistem em preservar a unidade do bloco. Estas tensões ficaram evidentes nos últimos anos, com debates sobre a modernização do Mercosul, a assinatura de tratados com atores globais e o papel que deve desempenhar na nova ordem mundial.
Em um contexto internacional marcado por tensões comerciais, reconfigurações geopolíticas e a ascenção de novas potências, o Mercosul enfrenta a necessidade de redefinir seu papel e relevância: será capaz de se adaptar a estes desafios sem perder sua identidade, ou ficará relegado frente à influência de atores como a China e a União Europeia (UE)?
As tensões internas e o debate sobre o futuro
Há anos, os países do Mercosul mantêm diferenças sobre a direção que o bloco deve adotar. O Uruguai implementa acordos bilaterais, como sua negociação com a China, enquanto Brasil e Argentina preferem optar por uma estratégia de negociação conjunta. Paraguai, por sua vez, oscilou entre ambos os enfoques, sem um consenso claro sobre qual caminho seguir.
O presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou (2020-2025), foi muito crítico ao Mercosul em seu formato atual, qualificando-o de um “lastro” que impede os países de assinarem tratados de livre comércio de forma individual. Sua aproximação com a China, especialmente, gerou tensões com a Argentina e o Brasil, que temem que uma flexibilização das normas ponha em risco a unidade do bloco e enfraqueça sua posição negociadora frente a outras potências.
Quanto ao acordo com a UE, o Mercosul está há mais de 20 anos negociando, mas os avanços foram mínimos. Ainda que em 2019 tenha se chegado a um princípio de acordo, a assinatura definitiva ainda se vê opacada por diversos obstáculos. A França, por exemplo, rejeita a concorrência dos produtos agrícolas sul-americanos e exige maiores compromissos ambientais por parte do Brasil. Enquanto isso, Argentina e Brasil temem que a abertura de seus mercados a produtos manufaturados europeus prejudique suas indústrias nacionais, o que gera fricções dentro do bloco.
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Esta falta de avanços levou vários líderes a questionarem se o acordo com a UE continua sendo viável ou se o bloco deveria reorientar seus esforços e focar em outros sócios comerciais, buscando alternativas que favoreçam o crescimento econômico e a competitividade regional.
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O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, enfatizou a urgência de finalizar o acordo com a UE antes de considerar negociações com a China. Em janeiro de 2023, Lula declarou: “É urgente e sumamente necessário que o Mercosul faça um acordo com a UE”.
Por outro lado, Argentina e Paraguai reafirmaram sua intenção de concretizar o tratado com o bloco europeu. Uruguai, ainda que apoie o acordo com a UE, mostrou impaciência com a falta de avanços e buscou alternativas para diversificar suas relações comerciais.
China: o novo grande sócio do Mercosul?
O Uruguai foi o principal impulsionador de um acordo comercial com a China. Em 2022, anunciou negociações para um Tratado de Livre Comércio (TLC) com o gigante asiático, o que gerou tensões dentro do Mercosul devido a que as normas exigem negociações conjuntas com terceiros países.
A China se tornou um ator-chave na economia sul-americana. Seu interesse em um TLC com o Mercosul (ou com países individuais) abriu um debate dentro do bloco. Para Brasil e Argentina, o comércio com a China já é essencial, mas temem que um acordo de livre comércio possa aprofundar a dependência da região na exportação de matérias primas sem gerar um desenvolvimento industrial sustentável. Uruguai e Paraguai veem na China uma oportunidade para expandir seus mercados sem as restrições impostas pelo Mercosul.

Posições divergentes no bloco
O Brasil reconhece a importância da China como sócio comercial, mas considera que um acordo bilateral entre Uruguai e China poderia debilitar o Mercosul. Argentina e Paraguai não mostraram um interesse explícito em negociar um acordo com a China e mantiveram uma posição mais conservadora, enfatizando a unidade do Mercosul.
Para onde vai o Mercosul? Seu futuro dependerá de como seus membros resolvam estas tensões. Serão flexibilizadas as normas para permitir acordos bilaterais sem romper o bloco? Será obtida finalmente a assinatura do tratado com a UE? A China se tornará o sócio comercial prioritário?
Concluindo: o Mercosul se encontra diante de uma disjuntiva fundamental: deve conservar a unidade do bloco para manter uma posição conjunta no diálogo com outros atores globais, ou é mais conveniente que cada membro busque acordos bilaterais separadamente, adaptando-se a suas próprias prioridades econômicas e geopolíticas?
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Enquanto alguns países defendem a necessidade de fortalecer o bloco como um instrumento para negociar de uma posição de força, outros consideram que a flexibilidade e a autonomia nas negociações individuais poderiam gerar maiores benefícios a curto prazo. Este debate interno será fundamental para definir o futuro do Mercosul e sua relevância em um contexto global em constante mudança.
* Fotos na capa:
– Yamandú Orsi: Reprodução / X
– Lula: Ricardo Stuckert / Presidência do Brasil
– Javier Milei: Gabriel Lado / FMI
– Santiago Peña: Reprodução / X