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Risco de contágio e agressões: o cotidiano dos servidores da Caixa durante a pandemia

Com multidões e falta de informação, renda emergencial impõe desafios e servidores da Caixa Econômica querem atendimento descentralizado
Nara Lacerda
Brasil de Fato
São Paulo (SP)

Tradução:

Trabalhando em ambientes com alto de risco de exposição ao coronavírus e encarando também aglomerações, causadas pela falta de informação sobre a renda emergencial, os funcionários da Caixa Econômica Federal (CEF) apelam para que o poder público tome medidas.

Eles cobram uma campanha de divulgação massiva sobre o benefício e os caminhos para acessá-lo. Além disso, propõem a descentralização do pagamento e um esquema de trabalho que envolva mais estruturas do governo.

Em entrevista ao programa Bem Viver, da Rádio Brasil de Fato, o presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae), Sérgio Takemoto afirma que os bancários têm trabalhado sob profundo estresse. (ouça a entrevista na íntegra clicando no áudio no início da matéria)

Já há relatos de infectados entre os servidores – inclusive com fechamento de agências – e até mesmo de agressões e ameaças por parte de cidadãos que não conseguiram acessar o benefício.

Com essa multidão indo à agência para receber um benefício que é um direito, nós temos relatos terríveis. Assim como temos relatos de clientes agradecendo enormemente, em contrapartida nós temos relatos até de ameaças e empregados que sofreram agressão física. Além disso, infelizmente nós já temos casos de óbitos e isso acaba mexendo com o trabalhador. O grau de estresse é muito grande, todo dia você receber relato de pessoas que foram lá e não conseguiram o benefício e você não pode fazer nada. Ver o desespero das pessoas, porque esses R$ 600 significam um prato de comida na mesa

Com multidões e falta de informação, renda emergencial impõe desafios e servidores da Caixa Econômica querem atendimento descentralizado

Prefeitura de Caruaru/ Fotos Públicas
Multidão se concentra em frente a uma agência da Caixa em Caruaru (PE)

Takemoto considera que a falta de informações por parte do governo federal em relação ao benefício é o principal motivo de aglomerações nas agências bancárias da Caixa e avalia que, com mais de 20 milhões de pessoas esperando para receber o pagamento, “vai ser uma avalanche” de pessoas nas filas.

“Desde o início nós percebemos que muita gente vai à Caixa pedir informações e até tentar entender porque não recebeu o benefício. Só agora, no começo do mês, é que a Dataprev fez um sistema que vai dar a resposta sobre porque o benefício não foi aprovado. Demorou muito tempo. Desde o início, temos pedido que o governo e a Caixa fizessem uma ampla divulgação. Nós vivemos em um país muito desigual. Não dá para pensar que todo mundo tem acesso à internet, tem acesso ao celular. Milhões de pessoas não têm acesso e com certeza essas pessoas são elegíveis para receber o benefício”, aponta.

O presidente da Fenae vai além e aponta que o governo “no lugar de ajudar, atrapalha” com desencontros e desinformação sobre os pagamentos. Ele cita como exemplo o pagamento da segunda parcela anunciada para o final de abril pelo ministro da Cidadania Onyx Lorenzoni, e suspenso em seguida pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que “agora já não sabe nem mesmo quando vai ser liberada”.

É mais desencontro, mais desinformação, mais pessoas correndo atrás para receber o benefício. É um governo que parece que tem interesse que as pessoas não recebam esse benefício. Parece também ter interesse em tentar passar uma imagem de ineficiência por parte da Caixa. Os bancos públicos serão fundamentais para saída dessa crise. Nós vamos precisar pensar em um programa permanente de renda mínima. Não vai voltar tudo ao normal depois de três ou quatro meses. Vai ser necessário repensar o papel do estado. 

O presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, admitiu que boa parte das aglomerações e filas é formada porque quem quer tirar dúvidas. Em audiência pública da Comissão Mista do Congresso Nacional que acompanha as ações de combate ao novo coronavírus, ele disse que 60% das filas eram composta por cidadãos que não tinham certeza poderiam receber o benefício.

Frente à pressão, o Ministério da Cidadania chegou a anunciar que os Correios deverão ajudar no cadastro do auxílio emergencial, mas o pagamento continua responsabilidade exclusiva da Caixa.

Para Takemoto, o governo ainda precisa explicar como será colocada em prática a participação dos Correios. Ele defende que outras instituições bancárias façam parte da força tarefa para os pagamentos.

Nesta semana, a Fenae e a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf/CUT) formalizaram pedido de apoio ao Consórcio Nordeste, que reúne os governos da região, para a solução do problema das filas e aglomerações em agências da Caixa.

“Nós estamos negociando com a Caixa desde o início de março e já era previsto esse volume todo de pessoas que seriam elegíveis a receber esse benefício. O próprio Dieese [Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos] já havia calculado mais de 40 milhões. A caixa estava trabalhando com 35 milhões. Estamos vendo que superou todas as expectativas. Infelizmente, a caixa e o governo não se prepararam para isso. Mesmo depois de toda essa multidão correndo para as agências, não houve ação por parte do governo”, explica.

Segundo Takemoto, o apelo ao Consórcio Nordeste ocorre diante da falta de ação coordenada do governo federal para garantir a saúde da população que tem direito ao benefício e dos trabalhadores da Caixa.

Nós negociamos desde o início toda a proteção individual. Mas uma coisa é o acesso à proteção individual outra coisa é ter que atender uma multidão, sob uma tensão enorme, trabalhando de dez a doze horas por dia, correndo risco de pegar uma doença infecciosa 

Em nota, entidades ligadas aos trabalhadores da Caixa pedem que os entes federados e as autoridades competentes prestem assistência no controle das filas e garantam a manutenção da ordem nas ruas. O texto ressalta que a instituição foi a única do país se disponibilizar para atuar nos pagamentos.

“Desde que foi incumbida de efetuar o pagamento do auxílio emergencial para dezenas de milhões de brasileiros, a Caixa, banco 100% público, tem se empenhado para cumprir sua missão, consciente de sua importância para a população e para o país. Esse tem sido um esforço solitário da empresa, única instituição financeira do país que se dispôs a realizar essa importante tarefa.”

O manifesto em defesa dos trabalhadores, assinado por cinco associações, ressalta que os empregados da Caixa têm contato diário com milhares de pessoas e vêm cumprindo longas jornadas (Leia aqui o texto na íntegra)

Informações sobre o benefício

O esclarecimento de dúvidas sobre a renda básica emergencial pode ser feito por telefone, pelo número 111 da própria Caixa. O site caixa.gov.br também disponibiliza informações. Quem já fez o cadastro, pode consultar o andamento do pedido no endereço consultaauxilio.dataprev.gov.br.

O que é coronavírus?

É uma extensa família de vírus que podem causar doenças tanto em animais como em humanos. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), em humanos, os vários tipos de vírus podem causar infecções respiratórias que vão de resfriados comuns, como a síndrome respiratório do Oriente Médio (MERS) a crises mais graves, como a síndrome respiratória aguda severa (SRAS). O coronavírus descoberto mais recentemente causa a doença covid-19. 

Como ajudar a quem precisa?

A campanha “Vamos precisar de todo mundo” é uma ação de solidariedade articulada pela Frente Brasil Popular e pela Frente Povo Sem Medo. A plataforma foi criada para ajudar pessoas impactadas pela pandemia da covid-19. De acordo com os organizadores, o objetivo é dar visibilidade e fortalecer as iniciativas populares de cooperação. 

Nara Lacerda, para a Brasil de Fato

Edição: Leandro Melito


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Nara Lacerda

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