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ToggleUma denúncia sobre possíveis histerectomias em massa, sem o consentimento de mulheres detidas em um centro de detenção de imigrantes explodiu no início da semana passada, além de outros maus-tratos médicos, foi a gota de derramou uma multidão de denúncias, incluindo uma demanda de investigação de mais de 179 legisladores sobre as violações e abusos de direitos humanos e civis gerados pelas políticas anti-imigrantes do governo de Donald Trump.
As primeiras acusações de que mulheres imigrantes foram sujeitas a procedimentos ginecológicos sem consentimento foram apresentadas na segunda-feira (14) por uma enfermeira em um centro de detenção na Georgia, administrado por LaSalle Corrections, uma empresa privada sob contrato da agência de controle migratório ICE.
A enfermeira Dawn Wooten informou que várias mulheres lhe disseram que um médico, apelidado de “colecionador de úteros”, lhes haviam tirado o útero ou praticado outros procedimentos ginecológicos sem o seu consentimento.
Essa queixa foi reforçada por várias imigrantes entrevistadas, e agora representadas nesse mesmo caso por Project South com a Aliança Latina por Direitos Humanos da Georgia, a Rede de Apoio de Imigrantes do Sul da Georgia e Georgia Detention Watch.
Sabe-se da existência até agora de pelo menos 17 casos nesse centro de detenção. Uma mulher migrante que é testemunha qualificou a instalação como “um campo de concentração experimental”.
La Jornada
A enfermeira Dawn Wooten
Exigem imediatas investigações
Agora, 173 legisladores federais enviaram uma carta ao Inspetor Geral do Departamento de Segurança Interna exigindo uma investigação imediata das queixas com um primeiro informe em 25 de setembro.
“Estamos horrorizados ao ver reportes de histerectomias em massa realizadas a mulheres detidas nessa instalação sem seu consentimento pleno e informado”.
Acrescentam que esses informações “provocam grave preocupação pela violação da autonomia do corpo e dos direitos reprodutivos de pessoas detidas”, escrevem na carta.
Tentativa de deportação de vítimas
Na quarta-feira as autoridades de migração tentaram deportar uma das vítimas, Pauline Binam, originaria de Camarões, que tem vivido nos Estados Unidos desde os 2 anos e é mãe de um filho cidadão.
Ela já estava dentro do avião em Chicago quando foi resgatada após a intervenção das legisladores Sheila Jackson Lee e Pramila Jayapal, as quais desejam que ela declare perante o Congresso.
Comitê quer ouvir Secretário Interino
Porta-vozes do ICE questionaram as “alegações anônimas e não comprovadas” da enfermeira e outros denunciantes. Chad Wolf, o secretário interino de Segurança Interna, não se apresentou nesta quinta-feira perante um comitê da câmara onde se esperava que fosse interrogado sobre este assuntos, entre outros.
E ainda mais, estas versões de imediato geraram comparações com práticas parecidas das autoridades estadunidenses em diferentes períodos de sua história e até muito recentemente, sobretudo contra mulheres afro-estadunidenses, mexicano-estadunidenses, indígenas e mulheres encarceradas.
Retorno da eugenia
De fato, no início do século XX foram promulgadas leis de “eugenia” em 32 estados que levaram à esterilização de mais de 60 mil mulheres consideradas como “mentalmente deficientes” ou “débeis mentais” – algo que serviu de modelo para os nazistas na Alemanha. Mas há casos mais recentes, como as de 150 mulheres em prisões da Califórnia que foram esterilizadas entre 2006 e 2010.
As revelações desta semana provocaram denúncias de organizações de direitos humanos e de defensa de imigrantes. “Estamos horrorizados por informes de mulheres detida sujeitas a histerectomias e outros procedimentos invasivos forçados em uma prisão de ICE manejada de maneira privada”, declarou Anistia Internacional Estados Unidos.
“Estou chorando de frustração… O que mais teriam que fazer à nossa comunidade imigrante para que as pessoas reajam, para que vejam nossa humanidade? Enjaulando nossas crianças, separando nossas famílias, esterilizando mulheres migrantes, o que mais? Pergunta Erika Andiola, de RAICES, organização de defesa de direitos de imigrantes.
“Se estas alegações de esterilização por parte de ICE forem verdadeiras, então este país se tornou completamente eugenista outra vez. E com isso, recuperando as práticas mais monstruosas da direita supremacista branca”, comentou Jelani Cobb, comentarista afro-estadunidense de The New Yorker.
Outras denúncias
Estas alegações se somam às inúmeras denúncias do tratamento de imigrantes sob o governo do Trump, desde a separação à força de famílias, a colocação de crianças em jaulas, hotéis convertidos em tribunais para processar e expulsar rapidamente menores de idade e famílias sem regulações, a falta de proteção e condições que multiplicaram os casos de Covid-19, a anulação de fato do direito de asilo, redadas tipo paramilitares e queixas de fustigamento sexual por guardas, entre tantas mais.
Utilizando uma regra inventada em março, tendo como pretexto a Covid-19, mais de 8800 menores de idade não acompanhados e 7800 famílias são parte do total das 159 mil pessoas expulsas sem oportunidade para expor seus casos, reportou CBS News. Em 16 de setembro, como presente ao México, as autoridades expulsaram uma multidão de deportados pela ponte desde El Paso a Ciudad Juarez, informou Alfredo Corchado do Dallas Morning News.
“A desumanização sistemática e constante de imigrantes pelo presidente e seus homens têm criado o clima em que ocorrem sérios abusos de direitos humanos. É um sistema inteiro que percebe os imigrantes como menos que humanos”, afirmou Douglas Rivlin de America’s Voice em Washington.
David Brooks, correspondente de La Jornada em Nova York
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Tradução: Beatriz Cannabrava
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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