Enquanto Israel continua ampliando sua ofensiva militar contra a Faixa de Gaza, impõe uma política de terra arrasada e força centenas de milhares de civis ao deslocamento forçado rumo ao sul, num crime evidente que visa esvaziar o território de sua população e de seus elementos de resistência. Os massacres diários cometidos pelas forças de ocupação não são apenas instrumentos de extermínio, mas parte de um plano cuidadosamente arquitetado para impor uma nova realidade demográfica e política em Gaza.
No auge da ofensiva, a agência Reuters revela discussões entre Washington e Tel Aviv para formar um governo provisório em Gaza, chefiado por um responsável estadunidense, que permaneceria até que o território fosse “desarmado e a resistência demonizada”, com a exclusão tanto do Hamas quanto da Autoridade Palestina, e com o recrutamento de tecnocratas palestinos, além da participação de países árabes na execução desse plano.
O que se propõe não é reconstrução, mas recolonização. Falar em nomear um “governador americano” para Gaza não difere dos conceitos de mandato colonial impostos aos povos da região há um século, quando as potências coloniais repartiam entre si zonas de influência sob o pretexto de “administração temporária”. Agora, esse modelo retorna pelas mesmas portas: destruição seguida de tutela.
O objetivo desse cenário é claro: esvaziar Gaza de sua resistência e de seu povo, demonizar a luta e as armas da resistência, e remodelá-la como uma reserva sob supervisão estrangeira — em consonância com o grande plano israelense de separar Gaza da Cisjordânia, destruir os fundamentos de um Estado palestino independente e reconfigurar a demografia e o sistema político palestino conforme os moldes da ocupação.
Esse projeto, apesar de sua pompa, esbarra na realidade. Gaza não foi vencida, e seu povo não se rendeu, apesar dos massacres e das tragédias. O povo palestino, que rejeitou todas as formas de ocupação e tutela, não aceitará soluções impostas de cima para baixo que desrespeitem sua luta e seus sacrifícios. Ele não abandonará a bandeira da autodeterminação.
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O que ocorre hoje não é apenas uma batalha pela sobrevivência de Gaza, mas uma luta existencial de todo o povo palestino. O momento exige uma posição palestina unificada, que restaure a legitimidade nacional e a resistência por meio do lançamento de um diálogo nacional abrangente, em nível máximo, como caminho para alcançar consensos políticos que preservem nossa causa, nossa terra e nosso povo. É essa a via para enfrentar qualquer tentativa de tutela ou fragmentação — incluindo a formação de um governo de unidade nacional que assuma a gestão tanto da Faixa de Gaza quanto da Cisjordânia, após a retirada israelense do território.
Os países árabes devem se recusar a participar de qualquer forma de administração que apenas reproduza a ocupação. E à comunidade internacional cabe ir além do silêncio e defender o direito internacional — não utilizá-lo como cobertura seletiva.
Gaza está hoje sobre a falha sísmica da história. A escolha não é entre um governo provisório ou o vácuo, mas entre um projeto de libertação e um projeto de tutela. E quem está com Gaza, está com a Palestina, com a justiça – e com a história, no momento em que ela nos põe à prova.
Edição de Texto: Alexandre Rocha