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Privatização e capitalização de empresas, fracassos que a Bolívia não esquece

"Foram 20 anos que venderam um discurso no qual íamos deixar a pobreza, alcançar o desenvolvimento e o progresso"
Nara María Romero
Prensa Latina
La Paz

Tradução:

Mostrar aos jovens o prejuízo econômico causado à Bolívia pela privatização e capitalização de empresas, é a principal missão encomendada pela Assembleia Legislativa Plurinacional (ALP) ao senador Ruben Medinaceli para evitar que essa política regresse.

Em entrevista a Prensa Latina, Medinaceli, presidente da Comissão Mista de Investigação do Processo de Privatização e Capitalização de empresas estatais, recordou a apresentação do informe final à ALP em janeiro passado e a decisão de socializar seu conteúdo em todos os níveis. 

Assegurou que essa foi a tarefa mais importante, além de preparar as proposições acusatórias, baseadas na análise jurídica dos casos estudados, e apresentá-los novamente à Assembleia para definir os procedimentos.

“Identificamos os envolvidos nessa rede de poder que alienou as empresas bolivianas e recursos naturais, provocando um prejuízo econômico de mais de 21 bilhões e 500 milhões de dólares, e os relatórios serão remetidos também à Controladoria Geral do Estado, à Procuradoria, à Promotoria e ao Ministério da Justiça”, comentou.

Precisou que, comparativamente, o Produto Interno Bruto (PIB) boliviano em 2018 foi de 40 bilhões de dólares, e o prejuízo ocasionado pela privatização e capitalização de 157 das 212 empresas existentes de 1985 a 2005 é um pouco mais da metade deste valor.

Sobre as declarações do ex-vice-presidente Víctor Hugo Cárdenas (1993-1997), de sentir-se orgulhoso pela capitalização que permitiu que Bolívia continuasse vivendo do gás até hoje, Medinaceli mostrou-se surpreso.

“Eu creio que ele é o único orgulhoso desse processo porque inclusive seu chefe  Gonzalo Sánchez de Lozada, reconheceu explicitamente o fracasso econômico da capitalização quando anunciou o decreto do “impostaço”, porque o país não tinha dinheiro, pois o processo, tanto de privatização como de capitalização, havia fracassado”, afirmou.

Salientou que em 19 de outubro de 1995 Cárdenas assinou, em sua condição de presidente interino, o Decreto Supremo 24146 para viabilizar a capitalização do Lloyd Aéreo Boliviano SAM (LAB) à empresa brasileira VAP.

O prejuízo econômico dessa ação foi de mais de 54 milhões de dólares, de acordo com o informe da comissão da ALP.

O senador pelo Movimento Ao Socialismo (MAS) explicou que durante a gestão de Sánchez de Lozada foram capitalizadas cinco empresas estratégicas do Estado e privatizadas mais de 30.

É absurdo que Cárdenas, atual candidato presidencial da Unidade Cívica Solidária (UCS) para as eleições gerais do próximo outubro, sinta orgulho.

“Seu projeto como membro da direita boliviana é retomar a política da qual agora se sente orgulhoso, e se tomarmos essa opção sabemos o que nos espera: privatização de nossas empresas, crescimento sem medida da pobreza no país. Vemos que isso é o que ele pode oferecer “, destacou.

Por outra parte, o Ministério da Defesa condecorou em 13 de março com a Ordem Marechal Andrés de Santa Cruz nos graus de Comendador e Cavaleiro de Honra, pelo aporte à história da Bolívia, deputados e senadores membros da Comissão Mista de Investigação do Processo de Privatização e Capitalização de empresas estatais. 

O titular dessa carteira de Estado, Javier Zavaleta, qualificou a investigação como o encargo mais importante do órgão legislativo desde sua criação, não só pelo tempo, mas pelo que as perdas ocasionadas teriam aportado ao desenvolvimento da Bolívia.
Zavaleta comentou que as pesquisas abarcaram um período de 20 anos da etapa neoliberal do país, e foram analisados decretos, leis, resoluções e atas com que alienaram as empresas. 

“São 20 anos que venderam um discurso no qual íamos deixar a pobreza, alcançar o desenvolvimento e o progresso, mas de 1985 a 2005 foram vendidas as empresas estratégicas e a Bolívia terminou por ser o país mais pobre da América do Sul e o segundo do continente americano”, afirmou.

"Foram 20 anos que venderam um discurso no qual íamos deixar a pobreza, alcançar o desenvolvimento e o progresso"

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O senador boliviano Ruben Medinaceli

Um debate histórico para a Bolívia

O Plenário da Assembleia Legislativa Plurinacional da Bolívia debateu nos dias 15 e 16 de janeiro o informe de conclusão da Comissão Mista de Investigação do processo de privatização e capitalização das Empresas Públicas dos Estados. 

Medinaceli,  à frente da comissão, informou que o documento com duas mil e 700 páginas dividido em três tomos confirmou a alienação realizada por governos neoliberais para favorecer empresas transnacionais. 

Precisou que de 362 empresas nacionais e departamentais alienadas, 205 foram capitalizadas, 102 privatizadas e 55 tiveram dificuldades para continuar operando ou foram transferidas. 

“É uma investigação de um período que teve seu efeito e tem ainda seu efeito na vida nacional”, assegurou. 

Entre as entidades estratégicas que passaram a ser privadas estão Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB), as empresas nacionais de Eletricidade, Ferrovias, Telecomunicações, Metalúrgica Vinto e Lloyd Aéreo Boliviano (LAB).

A investigação abarcou as gestões de Víctor Paz (1985-1989), Jaime Paz (1989-1993), Gonzalo Sánchez de Lozada (1993-1997), Hugo Banzer (1997-2001), Jorge Quiroga (2001-2002), segundo mandato de Sánchez de Lozada (2002-2003) e Carlos Mesa (2003-2005).

A então presidenta da Câmara de Deputados, Gabriela Montaño, recordou as jornadas passadas de constantes mobilizações do contra a privatização e a capitalização. 

“Esse foi um período neoliberal; para alguns jovens é necessário explicitar o que significa isso: nessa época. o Estado tinha um montão de empresas públicas que hoje já não temos porque existiram 20 anos de governos que decidiram das de presente nossas empresas estatais com as quais apoiávamos o produtor”, salientou. 

A divulgação do dano ocasionada à Bolívia pela privatização e capitalização de empresas estatais é a missão fundamental da comissão investigadora do processo, sobretudo para que as atuais e futuras gerações escolham que país querem. 

*Correspondente de Prensa Latina na Bolívia.

Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Nara María Romero

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