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Eleição com caráter plebiscitário mostra força da direita e derrota da ultradireita

À esquerda, não há que esperar o poder para iniciar a inclusão dos marginalizados. Ao contrário, há que primeiro conscientizar e organizar essa gente
Paulo Cannabrava Filho
Diálogos do Sul
São Paulo (SP)

Tradução:

O Brasil tem 5.570 municípios, 70% com menos de 20 mil habitantes, só 50 cidades com mais de 500 mil pessoas em que se concentram 30% da população e 17 cidades com mais de um milhão.

As mais populosas são São Paulo, com 12,3 milhões; Rio de Janeiro, com 6,75 mi; Brasília, 3,05 mi; Salvador, 2,88 mi; Fortaleza, 2,6 mi; Belo Horizonte, 2,5 mi e Manaus, 2,1 mi.

Em resumo, 22% da população se concentra nos grandes centros urbanos. A maioria da população, uns 70%, portanto, vive em cidades de porte pequeno, o que reforça nossa tese da importância das eleições municipais. Trabalhar o microcosmo e projetá-lo no macrocosmo, como dissemos em artigo anterior.

À esquerda, não há que esperar o poder para iniciar a inclusão dos marginalizados. Ao contrário, há que primeiro conscientizar e organizar essa gente

Reprodução: Facebook
Guilherme Boulos (PSOL) derotou o canditado de Bolsonaro em SP, Celso Russumano (Republicanos)

Direita X esquerda

Eleição com caráter plebiscitário, mesmo sem ter sido anunciado esse propósito. É assim que as pessoas estão encarando. Os resultados mostram um eleitorado conservador, inclinado à direita, mas não à ultradireita, que foi a grande derrotada no pleito.

Bom prenúncio. Sinal de que está evoluindo a compreensão de que esse corpo estranho que ocupa o Planalto precisa ser extinguido.

Direita Neoliberal, Centrão e Bolsonarismo formam a maioria e se fortaleceram aprofundando a brecha tanto para a esquerda como para a centro-esquerda. Houve queda também para os neoliberais.

Vemos um PT ainda forte e um PSOL em ascensão. Alguém comentou que a mediocridade de novo conseguiu se impor. Mas nem tanto. Houve certos avanços. As bancadas femininas, por exemplo, se fortaleceram em São Paulo, Rio e mais 16 capitais.

Grosso modo houve um avanço da direita sobre a esquerda e isso é que deve ser elemento de reflexão e autocrítica para todo o campo democrático. Todo campo democrático porque a defesa da democracia e da soberania nacional interessa a todos.

Bolsonaro perdedor?

Bolsonaro declarou apoio a 14 candidatos a prefeitos e só dois foram para o segundo turno: Crivella, no Rio, e capitão Wagner, no Ceará. Russomano perdeu feio em São Paulo. Dos 59 candidatos a vereador com apoio explícito do capitão, só nove se elegeram.

Achar que o Bolsonaro foi o grande derrotado não significa nada e não ajuda a entender a realidade.

O poder foi conquistado pelos militares, não por Bolsonaro ou pelo PSL, e entregaram de bandeja para o neoliberalismo. É estranho, mas é real. Abdicaram da soberania para ser tropa pretoriana do império e só largarão o osso com a quebra da institucionalidade, o que só poderá ser alcançado com a nação sublevada pela libertação nacional.

São Paulo

A situação em São Paulo moveu cúpulas partidárias. O PSB e o MSB, através de seu secretário geral, Acilino Ribeiro, emitiu nota oficial pedindo engajamento da militância na campanha de Boulos/Erundina para o segundo turno.

O PT, por meio de sua executiva municipal, também emitiu nota oficial de apoio à chapa do PSOL. E há manifestos assinado por artistas e políticos do Brasil inteiro a favor de Boulos, a renovação.

Acabo de ler um pronunciamento do Frei Beto, inconforme com o abandono de sua cidade, recomendando o voto em Boulos pra virar a situação.

Boulos, no primeiro turno, teve só 15 segundos de tempo de TV e assim mesmo conseguiu esse formidável desempenho.

Assisti ontem o debate entre Boulos e Covas, na CNN. Agora em igualdade de condições, ambos com o mesmo tempo. Covas, com sua fala monocorde, defendia o indefensável, o processo de privatização e de abandono da cidade de São Paulo. Isso em contraste com a energia e a criatividade de Boulos, com resposta certas para todas as questões.

Teremos debate entre esses dois candidatos praticamente todos os dias até o final da campanha. Assista a um deles e me dará razão.

19/11 (qui) – Band, 22h30

21/11 (sab) – SBT, 17h45

22/11 (dom) – Record, 22h

24/11 (ter) – RedeTV, 22h30

25/11 (qua) – Estadão, horário não divulgado

26/11 (qui) – Folha/UOL, 10h

27/11 (sex) – Globo, 22h30

Para quem ainda tem alguma dúvida sobre em quem votar, eu peço encarecidamente que dê uma volta pelo centro da cidade. Proteja-se bem, com máscara e álcool gel.

Você ficará horrorizado com a quantidade de prédios pichados, ruas com sujeira acumulada, e uma multidão de gente sem eira nem beira perambulando sem rumo, seguramente em busca de um trabalho.

Moradores de rua por toda parte, como nunca. Nem um lugar histórico como o pátio do Colégio escapa e outros monumentos.

Nada escapa da sanha privatista do PSDB de Covas e Doria e de Fernando Henrique Cardoso. Parque Ibirapuera? privatizado. Parque Trianon? privatizado.

Gente, até o Anhangabaú, o mais célebre cartão postal da cidade foi privatizado. E o pior, foi totalmente despersonalizado por uma reforma desnecessária que custou R$ 93,8 milhões, entregue (vendido na bacia das almas) para uma empresa por R$ 6,5 milhões por dez anos. O que fará essa empresa? Vai cobrar entrada para o vale? Por absurdo como esse a gente tem obrigação de derrotar essa gente nas urnas.

Temos chance de ganhar essa eleição. A abstenção no primeiro turno foi de 30%; nulos e brancos, 15%. É o futuro da sua cidade e o futuro político de seu país que está em jogo. Tem que tirar a bunda da cadeira, botar uma máscara e votar para desenfeudar a cidade.

Se metade dos que se abstiveram comparecerem isso significará em torno de 700, 800 mil votos necessários para garantir a vitória pra o PSOL. Sol da juventude, sol da alegria contra a mesmice carrancuda vendida ao capital financeiro.

Rio de Janeiro

No Rio de Janeiro não tem jeito. Quem é o menos pior entre o Bispo Crivella e Eduardo Paes?

Difícil.

Martha Rocha já disse que não apoia nenhum deles. Deve estar magoada, pois poderia ter ido para o segundo turno se a esquerda tivesse fechado com ela.

Agora, a vantagem está para Paes e tem muita gente que não aguenta mais o Crivella. Vai valer o menos pior.

Mais do que em qualquer outra capital, o Rio de Janeiro é emblemático, com mais da metade do território ocupado e controlado pela bandidagem. É muito trabalho a ser feito para recuperar os espaços perdidos.

O caminho é o de Marielle Franco, que vive em cada jovem.

Outro recorde carioca: 2/3 dos vereadores se reelegeram.

Belo Horizonte

Em Belo Horizonte, Alexandre Kalil, do PSD, confirmando as pesquisas, deu de lavada no primeiro turno, reelegendo-se com 63% dos votos.

O partido Novo não elegeu ninguém. PT, PSDB e MDB perderam prefeituras. Democratas e PSD cresceram.

O destaque em Belo Horizonte foi que as mulheres dobraram a presença na Câmara Municipal, com 26,83 das cadeiras, e disputam três das quatro prefeituras que foram para o segundo turno.

Números

Breno Altman, parceiro nosso do Opera Mundi, fez uma análise substanciosa dos resultados computados para os diferentes blocos políticos do cenário nacional, comparando 2016 e 2020.

Para a Esquerda — PT, PSOL, PCdoB — o número de eleitores caiu de 10.676 milhões para 10.385 milhões uma queda de -2,72. Em número de prefeitos eleitos, caiu de 337 para 223, ou seja -33,83. E, em número de vereadores eleitos, de 3.881 para 3.337, uma queda de 14,02%.

Para o Centro Esquerda — PDT, PSB, Rede — o número de eleitores caiu de 15.807 para 10.944, ou -30,77%. Já o número de prefeitos de 747 para 565, -24,36%; e o número de vereadores de 7.586 para 6.569 ou -13,14.

Direita Neoliberal — PSDB, MDB, DEM— o número de eleitores caiu de 37.596.981 para 29.927.800, ou -20,40%; o número de prefeituras de 2.111 para 1.745 ou 17,34%; número de vereadores de 15.832 para 16.052, um incremento de 11,39%.

O Centrão — PSD, PP, PL, PTB, SD, Pros, Avante — o número de eleitores evoluiu de 24.376.585 para 30.527.958, um incremento de 25,23%; prefeituras também aumentou de 1.710 para 2.095, incremento de 22,51%; e número de vereadores, de 18.386 para 21.124, incremento de 14,89%.

Bolsonarismo — Repu, PSL, PSC, Patri, PRTB — de 6.580.532 eleitores para 12.918.704, um incremento de 96,33%; o número de prefeitos foi de 244 para 467, incremento de 11,31% e número de vereadores de 4.942 para 6,254, incremento de 26,55%

Como ler esses dados?

Em primeiro lugar, a urgente necessidade de os partidos ditos de esquerda retomarem a linha de massa.

O trabalho na base que é aquele trabalho de formiguinha, casa por casa, fábrica por fábrica, bairro por bairro, conscientizando e organizando o povo.

Retomar a prática de ação cultural em cada comunidade. 70% da população está mergulhada no analfabetismo funcional e metade da população está desempregada ou em regime precário.

Não há que esperar o poder para iniciar a inclusão dos marginalizados. Ao contrário, há que primeiro conscientizar e organizar essa gente, dar a essas pessoas a noção plena de cidadania, abrir-lhes os olhos para que veja crítica e criativamente a realidade e exija seus direitos.

Só uma revolução cultural conseguirá mudar o rumo ao despenhadeiro. E essa começa em casa, com cada um se livrando da servidão intelectual e organizando a resistência.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1967. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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