O que foi experimentado pelos membros do Senado nos Estados Unidos foi uma mostra breve e ilustrativa do que é provocado por essa poderosa nação a outras ao redor do mundo. Convencidos de possuir uma democracia à prova de balas – literalmente – e de constituir um exemplo de institucionalidade incorruptível diante do resto da comunidade internacional, aos governantes desse país – sem exceção – não lhe tremeram as mãos para desestabilizar democracias em outras latitudes sob o pretexto de eliminar os riscos de uma possível independência de outros estados, em termos econômicos e políticos.
Dura lição para aqueles que invadiram outros territórios com uma bandeira que hoje está manchada pelo extremismo doméstico. O que os parlamentares aprenderam nestes dias é o valor da estabilidade, do diálogo e da correta aplicação das leis, tanto para seu país como para o resto do planeta. Só falta que o apliquem. As expressões de incredulidade diante da violenta batida das hostes de Trump dentro do “sagrado” recinto do Capitólio haverão de ter mais de uma leitura. Para começar, as instâncias políticas desse país foram confrontadas com a fragilidade de um sistema considerado indestrutível e, depois, com a fato de constatar a força de um setor da sociedade que não acredita na democracia.
Wikimedia Commons
Os partidários do presidente Trump, um maníaco inchado de poder, não são só apenas essas centenas de manifestantes que invadiram o Capitólio para ameaçar os senadores e destruir tudo à sua passagem. Não. Também estão os milhares de eleitores que favoreceram a um dos presidentes mais questionados, não só por sua tendência fascista, mas sim por sua personalidade megalomaníaca e abertamente racista. Ou seja, quase a metade dos eleitores apoia as políticas de um indivíduo cuja instabilidade psicológica levou a uma profunda divisão no nível nacional.
O lamentável espetáculo transmitido direto de Washington deveria servir com pedra angular de um mudança substancial na política exterior estadunidense. Aquilo considerado como uma mostra inaudita de atentado contra a integridade institucional, equivale às inumeráveis táticas de rompimento da ordem constitucional perpetradas pelo Departamento de Estado e suas agências de inteligência em países do terceiro e quarto mundos, as quais têm marcado a histórias de suas relações internacionais destruindo gravemente as oportunidades de desenvolvimento dessas nações.
O sucedido em Washington com o vandalismo dos grupos afins a Trump se choca de frente com essa espécie de ingenuidade coletiva que considera os valores democráticos como verdades gravadas na pedra. A verdade é que não há democracia capaz de resistir ao embate da violência extremista, menos ainda quando esta é propiciada desde o centro do poder. A democracia é um processo, um caminho que se abre e se consolida com ações positivas, não um ideário abstrato. A democracia se funda no respeito pelos demais e na estrita aplicação das leis, sem exceções.
Talvez a partir de agora se produza na classe governante estadunidense uma necessária e profunda mudança de perspectiva sobre suas políticas e ações em outros países. As nações em desenvolvimento necessitam espaço para respirar e crescer, política e economicamente; disso depende a consolidação de democracias débeis e vulneráveis, as quais até agora vivem na dependência e na submissão, sumidas na pobreza, na corrupção e nos caos institucional.
O sucedido em Washington deixa uma valiosa lição de humildade.
*Colaboradora de Diálogos do Sul da Cidade da Guatemala
Tradução: Beatriz Cannabrava
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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