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Toggle“Nosso problema… não é a desobediência civil. Nosso problema é a obediência civil. Nosso problema são os números de pessoas ao redor do mundo que obedeceram aos ditados dos líderes de seus governos e foram à guerra, e milhões morreram por essa obediência… Nosso problema é que as pessoas são obedientes diante da pobreza e da fome e da estupidez, e da guerra e da crueldade… Reconhecemos isso na Alemanha Nazista. Sabemos que o problema ali foi a obediência.”
O historiador Howard Zinn, depois de participar de um ato de desobediência civil em Boston contra a guerra no Vietnã, em 1970.
Diante da tentativa de imposição da “lei e da ordem” da direita nos Estados Unidos, surgem novas expressões de desobediência e dissidência todos os dias por todo o país.
No último sábado (19), houve uma segunda onda nacional de centenas de manifestações e marchas nos EUA contra a agenda de Trump, depois de que, em 5 de abril, ocorreram protestos nos 50 estados, somando mais de 1.200 ações. No sábado, as faixas, cartazes e palavras de ordem iam desde demandas para frear o ataque contra imigrantes até a proteção da democracia estadunidense diante da ameaça autoritária liderada por Trump, muitos declarando: “reis, não”.
Em Boston, relembrando a mensagem usada para alertar os independentistas sobre a repressão esperada das forças britânicas, há exatos 250 anos — a famosa igreja Old North indicaria com uma lanterna se viessem por terra, e com duas se viessem por mar — agora foi projetada sobre a mesma igreja a mensagem: “Uma se por mar, duas se por DC” (referindo-se ao Distrito de Columbia, Washington).
Ao mesmo tempo, prossegue o Combatendo a Oligarquia, ação organizada por Bernie Sanders e seus aliados, cuja resposta segue surpreendendo a todos — inclusive a ele mesmo, que disse que alguns atos foram os maiores de sua carreira política —, particularmente em vilarejos e cidades consideradas bastiões do Partido Republicano. Cerca de 12 mil pessoas em uma cidadezinha de Idaho participaram de uma mobilização que foi considerada, por alguns, o maior comício político da história daquele estado tradicionalmente conservador. Cerca de 30 mil em Folsom, Califórnia — um condado com população total de 85 mil.

Múltiplos atos de resistência
Enquanto isso, houve a resposta firme do secretário de Educação de Los Angeles, Alberto Carvalho, declarando que defenderá os estudantes indocumentados “até o fim”. E lembrou que ele próprio chegou como indocumentado à cidade, após a tentativa de agentes da imigração de entrar em uma escola primária pública para “entrevistar” crianças.
Em Boston, continuam alimentando a resistência contra as medidas que visam semear o terror nas comunidades imigrantes. A prefeita Michelle Wu repete sua mensagem de que “se vierem por um bostoniano, todos nós responderemos”, declarando que a cidade é o lar de todos, independentemente de sua condição migratória — mensagem que repete em espanhol e em vários outros idiomas.
Seguem as ameaças a universidades
No ataque às universidades, o governo Trump tem mirado, propositalmente, as mais famosas e poderosas, ameaçando cortar centenas de milhões de dólares em fundos federais, caso não aceitem certas condições, como a anulação de determinados programas acadêmicos.
Embora várias tenham cedido ou estejam em negociações — incluindo Columbia, Yale e Brown —, Harvard surpreendeu ao rejeitar exigências que incluíam a nomeação de um supervisor federal encarregado de vigiar o conteúdo ensinado na prestigiada universidade privada, declarando que “não abrirá mão de sua independência nem cederá seus direitos constitucionais”. O famoso técnico do time profissional de basquete Warriors vestiu uma camiseta de Harvard em sua entrevista coletiva para demonstrar solidariedade, declarar-se defensor da liberdade acadêmica e celebrar o enfrentamento da universidade com esse “valentão”.
Essa resistência contra a direita e seus líderes também se expressa por meio de imigrantes, sindicalistas, defensores dos direitos civis, comediantes e artistas, de forma constante, em ações grandes e microscópicas. Todos esses atos de desobediência são raios de luz na talvez mais sombria tempestade política da história moderna dos Estados Unidos.
Tracy Chapman – Talkin’ About a Revolution
La Jornada, especial para Diálogos do Sul Global – Direitos reservados.