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Macri e a entrega da soberania da Argentina

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

V Seminário Internacional pela Paz, Guantánamo – O atual governo neoliberal argentino no marco da militarização imperialista regional.

Carlos Aznárez*
Todo-un-Lujo-el-Mauri“Nunca entendi os temas de soberania em um país tão grande como o nosso. Nós não temos um problema de espaço como têm os israelenses e nesse sentido, as Ilhas Malvinas seriam um forte déficit adicional para a Argentina”.
Tais palavras saídas da boca do presidente argentino Mauricio Macri dão a pauta do nível com que a administração argentina define o que para a grande maioria dos argentinos e argentinas é uma das maiores reivindicações históricas. Na realidade o alto grau de irresponsabilidade e colaboração pró imperialista com que Macri fala das Malvinas é uma radiografia do comportamento do atual governo neoliberal sobre todos os temas que implicam em controvérsia entre defesa ou cessão de soberania, inclinando-se sempre para este último conceito. O que deveria ser uma exigência ao Reino Unidos pelo que significa esse território das Malvinas convertido em uma das mais poderosas bases militares da OTAN no Atlântico Sul, para Macri é só um tropeço em suas ânsias por mostrar-se condescendente com os usurpadores.
Para entender o que está a ocorrer com as Ilhas Malvinas, além da concepção entreguista do macrismo, é imprescindível entender o que ocorreu em 2 de abril de 1982. Dois dias antes dessa data, os militares da ditadura mais sangrenta jamais suportada pelo país, responderam com uma violenta repressão à elevação da luta de massas e de resistência operária, protagonizada em uma marcha multitudinária em 30 de março. O regime começava a ser golpeado e isso acelerava suas contradições internas. A situação do partido militar não era a de 1976 quando com o terror, assassinatos, desaparecimentos e ações ilegais tinham estruturado um poder letal e desestruturante.
Daí que era necessário provocar um giro coperniano colocando em marcha uma operação de ocupação das Ilhas que terminou em frustração. Logicamente esses fardados dirigidos pelo general Leopoldo Galtieri burlaram do sentimento patriótico do povo argentino  conduziram a milhares de jovens soldados a um sacrifício e uma derrota de tal magnitude. Se a tudo isso se soma dos vexames, os maus tratos permanentes e o abuso de autoridade contra os combatentes pelos oficiais que culminaram com render-se vergonhosamente aos ingleses, pode-se compreender porque se instalou, a partir dessa data, a figura traumática de uma nova tragédia nacional, pela quantidade de jovens que pagaram com a vida a loucura dos ditadores.
Há 35 anos daqueles acontecimentos é necessário visibilizar a que níveis de militarização chegou Londres nesse território argentino e qual é a concepção estratégica que está por trás de cada uma das decisões da Coroa.
Existe nas Malvinas, desde 1985, uma grande base militar denominada Mount Pleasant, situada a só 60 quilômetros do Puerto Argentino e a 700 Km da costa patagônica. Este enclave ocupa a região mais plana da ilha Soledad, próxima ao mar e apta para decolagem de aviões e helicópteros. Tal ocupação obedece a um plano estratégico de dominação de Estados Unidos sobre América Latina que adquiriu muito mais força depois da derrota militar sofrida em 1982. A OTAN, nesse sentido, e especialmente Inglaterra, são parte fundamental do reforço da política imperial estadunidense.
Uma amostra transparente desse manobra agressiva contra a soberania argentina é o denominado “Plano para o Oceano Livre”, documento aprovado em 1980 pelo Conselho de Segurança Nacional de Estados Unidos em que se explica a importância estratégica do Atlântico Sul e necessidade de uma ação combinada as frotas de EUA e seus aliados da OTAN, para o controle dos espaços marítimos, destacando a Inglaterra como o principal de seus aliados, justamente por estar ocupando os arquipélagos de Malvinas, Georgias e Sandwich do Sul. É por isso que o ex presidente Ronald Reagan (1981-1989) não teve dúvidas em apoiar a Inglaterra na guerra das Malvinas contra a Argentina, apesar de que em virtude do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca, o famigerado TIAR, deveria ter defendido a Argentina diante de uma agressão extracontinental.
Segundo um estudo divulgado pelo Movimento pela Paz e a Solidariedade dos Povos: “Devido sua considerável extensão, a base militar malvinense conta com uma rede de avenidas que interligam as diferentes instalações: quartéis, hangares, campos de operação, a base aérea e dois bairros, um para os militares britânicos e outro para os civis, um complexo com cinemas e bares, e o aeroporto das ilhas que também está dentro da base. No complexo tem uma estação naval de águas profundas –chamada Mare Harbour- que é frequentada pelo frota da Royal Navy, usada para patrulhar o Atlântico Sul, com equipamentos similares ao que os efetivos britânicos têm no Iraque e no Afeganistão, e silos e rampas para lançamento de armas nucleares”.
Nesse espaço, em que se movem habitualmente entre 1.500 e 2.000 militares, sobre um total da população de 3.000 pessoas, das quais em torno de 500 são civis britânicos, cada um dos contingentes são renovados trimestralmente e muitos dos fardados combateram no Oriente Médio e utilizam o território malvinense para treinamento próprio das tropas de elite.
Calcula-se que o gasto militar anual que o Reino Unido investe na base militar é de 150 milhões de dólares. Isso significa que cada um dos cidadãos ingleses contribuem anualmente com 31 mil dólares para manter uma base que está a mais de 13 mil quilômetros de distância, onde somente estão a Antártica e o Cone Sul. Outro dado a levar em conta é que 7% do orçamento da OTAN é destinado à Malvinas.
Por outro lado, a frota britânica nas Malvinas é composta por aviões de combate de quinta geração, os Eurofighter Typhoon, equipados com poderosos mísseis cruzeiros capazes de alcançar grande parte do Cone Sul. Dois helicópteros Sea King, 2 helicópteros Sikorsky C-61, aviões Hércules, aviões Locked, avião tanque, proteção antiaérea e mísseis Reipel, um barco patrulha, um navio de apoio, um navio de pesquisa, um submarino nuclear com capacidade de levar armas nucleares, um rompe-gelos, uma fragata tipo 23.
A base de Monte Agradable situada na Ilha Soledad, possui um importante centro de comando e controle e uma base de inteligência eletrônica que permite monitorar o tráfego naval e aérea da região. 800 homens da Real Força Aérea, mais de 500 efetivos do Exército britânico, 30 membros da Royal Navy; duas pistas aéreas transcontinentais de 2.900 e 1.535 metros, aptas para aterrissagem e decolagem de aviões de grande porte, que habitualmente transportam tropas e equipamentos militares utilizados nas manobras conjuntas ou para a conexão com a rede de bases militares de Estados Unidos e da OTAN que estão dispersas por quase todo o planeta. Junto com a IV Frota, Malvinas fecha o círculo da agressão a todos os povos que se defendem e resistem à agressão imperial.
Não obstante, como ocorre quase sempre com a presença de Estados Unidos e seus aliados belicistas em uma região, também está em jogo nas Malvinas um tema de muito dinheiro e que tem a ver com as riquezas pesqueiras proporcionadas pelos Kelpers entre 1983 e 2016, lucros que superam os 160 bilhões de dólares. Graças às concessões dadas pelo governo de Macri, o governo inglês nas ilhas não só controla a pesca que corresponde à Argentina, como tem luz verde para continuar procurando petróleo na zona.

Macri ajoelhado diante da coroa britânica

Desde que o imperialismo inglês se apoderou do arquipélago, em 1833, reclamar pela soberania das ilhas tem sido uma questão crucial de cada governo argentino. Nos últimos 12 anos, inclusive, aprofundou-se, demandando diante do primeiro ministro inglês a soberania sobre as ilhas.
A política consistente em torno da causa Malvinas tem sido sustentada pela Memória, Democracia e Soberania, que reafirma os direitos argentinos sobre as ilhas, conseguindo o apoio de toda comunidade internacional para promover o diálogo com o Reino Unido. Não só no MERCOSUL, na Unasul e na Celac mas em todo o mundo. Assim, todos os países africanos reconheceram numa reunião de cúpula em Guiné Equatorial a soberania argentina sobre Malvinas, como também fez o G77  mais China, Rússia entre outros.
Não obstante, todos esses argumentos contrastam com a doutrina Macri para Malvinas. O de Cambiemos é o primeiro presidente que em seu discurso de posse não mencionou em nenhum momento a reivindicação da soberania sobre as ilhas, desconhecendo o direito inalienável dos argentinos sobre esse território que tanto dói aos que continuam acreditando que a Pátria não se vende.
Demonstrando ter aprendido bem a lição ministrada pelo império, Macri prometeu um “novo tipo de relação” com o Reino Unido, de novo sem exigir o direito à soberania sobre as Ilhas Malvinas. Assim, deu um giro no tratamento da exigência, suavizando as discussões com os britânicos para abrir um “diálogo” fundado numa posição de submissão aos desígnios imperiais.
Parte dos novos acordos, segundo informaram ambos os países, é o compromisso de tratar temas bilaterais como o comércio e segurança e a exploração de hidrocarbonetos e a riqueza ictiológica da plataforma continental, medidas que marcam uma mudança enorme de rumo e que denotam que Macri não tem o mínimo interesse por reclamar soberania em detrimento dos interesses de seus amos. Além do mais, a anuência à crescente militarização da zona, põe em perigo toda a região, deixando-a à mercê dos desígnios bélicos dos impérios.
Outra marca da mudança e esfriamento da reclamação foi a decisão de tirar a hierarquia ministerial à Secretaria de Assuntos Relativos `às Ilhas Malvinas e Atlântico Sul. Nessa mesma linha a chanceler Susana Malcorra decidiu demitir todo o pessoal da hoje subsecretaria, no marco de mais de 100 demissões havidas na chancelaria. A recente colaboração militar entre as bases britânicas nas Malvinas e o exército da ditadura brasileira também passou inadvertida para a chanceler, que atua como uma “broker” dos interesses do império na América Latina.,
Nesse contexto, há poucos meses, o governo de Macri protagonizou uma vergonha internacional. Durante uma das tantas reuniões de Nações Unidas, o presidente afirmou ter falado com a primeira ministra da Grã Bretanha, Teresa May, sobre a possibilidade de discutir a soberania argentina sobre Malvinas.
A potência imperialista tem se negado por décadas a colocar esse tema em discussão. Mal poderia ter feito, de maneira informal, em uma conversa de minutos, como a que manteve com Macri. O desmentido chegou de vários lugares, deixando em ridículo o mandatário argentino. Quase que simultaneamente, Malcorra assinava um acordo com a ministra de relações exteriores britânica, em que tudo indicava que renunciava a reclamação de soberania. A resolução provocou críticas inclusive dentro do espaço político do próprio governo.
A frustrada aspirante à secretaria da ONU prometeu “um novo tipo de relação”, com o Reino Unido, de novo sem exigir o direito à soberania sobre as Ilhas Malvinas. Assim, deu-se uma reviravolta no tratamento da questão suavizando as discussões com os britânicos para abrir um “diálogo” fundado numa posição de submissão aos desígnios imperiais.
Não satisfeita com ter acompanhado o presidente no colocar o país de cócoras diante do Império, Malcorra idealizou uma nova estratégia contemporizadora com Inglaterra, oferecendo inclusive “serviços”  que nem sequer os ocupantes das Malvinas se animariam reclamar. Trata-se de um “plano de base humanitária” como a batizou a chanceler. Isto implica um amplo leque de propostas que estão em marcha: desde o restabelecimento de novos voos das Malvinas à Argentina até a assistência de saúde dos kelpers em hospitais argentinos em casos graves, o intercâmbio de produtos alimentícios, a cooperação em matéria educativa e, talvez mais adiante, a possibilidade de estabelecer negócios compartilhados na área marítima e petroleira, justamente em  momentos em que Inglaterra sobre o esgotamento do chamado ouro negro no Mar do Norte e necessita imprescindivelmente sair em busca de novas reservas.
Tudo o que a dupla Macri-Malcorra puseram em marcha nos últimos meses constituem gestos servis muito parecidos aos que o ex presidente Carlos Menem realizou, em outra oportunidade, colocando a soberania numa gaveta de sua escrivaninha e apostando pelo ridículo internacional.
Nesse sentido, Macri se parece muito com Menem, não só pelo tratamento sobre Malvinas mas em aspectos fundamentais da política econômica e social contra a maioria dos argentinos. Para Malcorra, por outro lado, “os tempos de belicosidade impostos pelo governo de Cristina Kirchner contra os malvinenses mudaram”, confundindo a defesa da soberania  realizada pelo governo anterior com o que ela denomina “políticas caprichosas e isolacionistas”. Em seu afã de satisfazer a Londres, a chanceler acrescenta que “estamos num momento em que impera um maior reconhecimento à participação da sociedade civil em diferentes aspectos”, referindo-se aos usurpadores kelpers.
Se algo faltava, em 13 de setembro de 2016, emitiram uma declaração conjunta entre a chancelaria argentina e o encarregado do Commonwealth, que sem dúvida alguma retrocede aos acordos firmados por Menem nos anos 1990.
Com base nessa nova claudicação, que reinstala a política de “relações carnais” com os invasores, formaliza-se que todas as políticas e acordos entre Argentina e o Reino Unido podem ser realizados sem mencionar sob nenhum aspecto a palavra “soberania”, “Isto não está em discussão”, dizem os ingleses, e o governo Macri baixa a cabeça, aceita a advertência e ainda se inclina à maneira dos eunucos.
Por outro lado é posta em marcha uma iniciativa para facilitar os habitantes ingleses de Malvinas a comunicação direta das ilhas com o resto do continente. Dessa maneira se possibilita de fato a ideia de que é um território totalmente separado da Argentina.
Com o fim de oferecer facilidades aceita-se colaborar com a exploração dos recursos das ilhas, melhorando as perspectivas dos investidores, já que a colaboração do continente é muito importante no caso de que haja gás e/ou petróleo pelo menos na etapa inicial.
Em seu tradicional impulso destrutivo com tudo o que foi posto em marcha na época kirchnerista, agora o macrismo decidiu eliminar os entraves legais de trânsito, econômicas e diplomáticas às empresas que operam diretamente com a Inglaterra ou com os kelpers. Por último, no cúmulo da involução, se enfatiza que Argentina e Reino Unido trabalharão em conjunto em pesquisas e projetos científicos e de todo tipo no território antárctico argentino, que claro, se Macri perdurar no governo, terminará entregando a troco de nada.

Macri e mais bases militares

Não conformado em aprofundar a entrega da soberania nas Ilhas Malvinas, o governo de Maurício Macri também abre as portas à possibilidade de instalação de novas bases militares estadunidenses na Argentina. A data chave em que este projeto começou a se concretizar é em torno de 10 de maio de 2016 quando uma delegação do Ministério de Defesa argentino viajou aos Estados Unidos e entrevistou-se com membros do Pentágono e do Departamento de Defesa estadunidenses para realizar uma série de encontros e acordar uma cooperação militar entre Argentina e Estados Unidos. Entre os diferentes pontos tratados surgiu o tema das bases mas também a realização de exercícios militares conjuntos como nas melhores épocas das relações Bush-Menem.
A desculpa é sempre a mesma: antes era o tema da “narco-guerrilha” imposta como matriz pelos assessores do Pentágono aos exército do continente; e agora, a ideia de que “o terrorismo”  (vinculado o Isis que os próprios estadunidenses criaram) e seus contatos com os narcotraficantes, estão  operando na América Latina. Por trás desta hipóteses apocalíptica, outra vez se foca no território da Tríplice Fronteira entre Argentina, Brasil e Paraguai, este último sendo palco atual de uma guerrilha. Com toda essa salada de dados, e a voracidade de Estados Unidos por controlar o Aquífero Guarani, o quarto mais importante reservatório de água subterrânea do mundo, compartilhado pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, também conhecido como Aquífero do MERCOSUL.
Informes elaborados por pesquisadores e especialistas com relação ao Isis  outras células terroristas internacionais  descartam que a Tríplice Fronteira estive transformada num santuário para esse tipo de organização. Apesar disso, em meados de 2016, um informe do Departamento de Estado de novo acende luz vermelha sobre o tema. Confirma de alguma maneira que a zona em questão abriga atividades perigosas como o tráfico de armas e de drogas, e adverte ser muito provável que nos três países fronteiriços “poder-se-ia financiar a organizações fundamentalistas”. Com esses dados e a confirmação pela Argentina, já em tempos de Macri, de que efetivamente foram detectados transações de dinheiro em favor de combatentes no Oriente Médio, fica armado o tabuleiro da necessidade de maior “proteção” a essa área. Assim como em plena invasão do Iraque, o presidente George W. Bush colocou a Tríplice Fronteira como “objetivo”, e inclusive ordenou a seus assessores militares a planejar um ataque iminente, agora, o comportamento servil de Macri volta a colaborar com a possibilidade de instalação de bases militares tanto em Missiones (para cobrir a citada Tríplice Fronteira) e também na Tierra del Fuego (para complementar ações da base da OTAN nas Malvinas) e uma terceiro em Jujuy, zona fronteiriça com Bolívia muito rica num mineral ambicionado pelas transnacionais: o lítio.
Uma vez conhecida a informação sobre tais instalações, organizações populares em Missiones desencadearam uma campanha de visibilização do perigo que a instalação de uma base militar pode acarretar para a população e resultou em importantes mobilizações. Vê-se que é necessário agitar fortemente a opinião pública, posto que há o antecedente do ocorrido na época do governo kirchnerista, quando na província do Chaco, o governador Jorge Capitanich autorizou uma base militar ianque no aeroporto local, e o povo na rua conseguiu forçar que o governo de Cristina Kirchner deste marcha-a-ré nesse projeto.
Não obstante, Missiones continua na mira do aparato militar estadunidense e, se ainda não concretizou a instalação, já se detectou movimentação de assessores de EUA  e do ministério de Defesa na zona, estudando possibilidades de lugares e de oportunidades de datas para realizar o projeto.
Com relação ao extremo sul argentino, Estados Unidos têm os olhos postos na localidade de Ushuaia, de onde se controla todo o Estreito de Magalhães, do Canal de Beagle, da Passagem de Drake e a conexão, a vinculação, entre os oceanos Atlântico e Pacífico. Ali se instalaria uma “base científica” que complementaria a projeção ao Oceano Índico desde a base das Malvinas. A pesquisadora e especialista em temas de defesa, Elsa Bruzzone, do Centro de Militares pela Democracia (Cemida) da Argentina, aponta num estudo elaborado sobre o problema que “quando desde Malvinas e também desde Ushuaia se tem controle sobre a plataforma continental argentina, porque irradiamos, sobre as riquezas hidrocarbônicas que estão na plataforma, sobre os nódulos polimetálicos encontrados no fundo do Atlântico Sul, que são concentrações de minerais altamente estratégicos para o desenvolvimento de qualquer indústria, inclusive a indústria aeroespacial e militar. O controle do que é a pesca, o Atlântico Sul é a zona de maior volume e de maior riqueza não só de peixes mas também de crustáceos e mariscos. Observa-se também o que é a projeção à Antártica tanto das Malvinas, as Geórgias e as Sandwich do Sul como desde Ushuaia, que é uma zona com riquezas em petróleo e minerais altamente estratégicos”.
Cada um desses projetos, que indubitavelmente contam com o aval governamental da Argentina, mas também com o visto bom do governo direitista e neocolonial do Paraguai, a ditadura de Temer e o silêncio cúmplice do Uruguai presidido por Tabaré Vázquez, e a prioridade para Estados Unidos. Constituem parte de sua estratégia de ocupação do extremo sul latino-americano, rico não só em petróleo e gás, mas também uma zona riquíssima em água, um elemento pelo qual os países com ambição expansionista não duvidam em ir à guerra por ele.

Macri está em guerra

Assim como nos anos da ditadura militar, o exército argentino utilizou a desculpa de possíveis cenários de conflito militar com países vizinhos, como Chile, para reequipar-se e utilizar parte desse armamento para continuar aplicando a denominada “Doutrina de Segurança Nacional” que serviu para o desaparecimento de praticamente toda uma geração de lutadores e lutadoras populares, agora o governo Macri volta  a dar às Forças
Armadas a possibilidade de atuar como repressores internos. De fato, grande parte dos bairros da capital e da Grande Buenos Aires já sofrem um processo de militarização e policialização massiva. Aparatos de controle e disciplinamento da população são evidentes e estão gerando incursões repressivas que quase sempre redundam em mortos, feridos e detidos entre a população mais humilde.

A esta necessidade de reprimir violentamente os protestos que surgem na Argentina contra as políticas econômicas aplicadas pelo governo, soma-se a provocação do “perigo terrorista internacional”. A mesa está servida para que se decida, como se fez ainda agora, a comprar toneladas de armamento para rearmar os fardados das três armas. Outra vez a irresponsabilidade de Macri coloca o país no marco de alimentar guerras internas e fomentar alinhamentos internacionais com o Império, que, a luz do que ocorre no mapa global, provocam enfrentamentos bélicos de alta periculosidade.
Foi assim que há poucos dias de iniciar 2017, houve a milionária compra de armamento nos Estados Unidos –a maior dos últimos 40 anos- em nome do “combate ao terrorismo”, Trata-se de uma extensa lista de equipamento militar pedido em meados de 2016 pelo ex embaixador argentino nos EUA, Martín Lousteau, ao parlamento estadunidense, e que inclui tanques, aviões e helicópteros utilizados em várias guerras.
Enquanto o ministro de Defesa, Julio Martínez, se mantém em silêncio, conheceu-se pormenores das armas adquiridas por mais de dois bilhões de dólares, cifra que supera amplamente as projeções do governo para os próximo anos. A lista inclui desde aviões de caça, tanques de guerra e mísseis de médio e longo alcance até helicópteros similares aos utilizados na guerra das Malvinas.
O Exército argentino solicitou, entre outras coisas, 12 helicópteros de ataque Cobra AH1, utilizados pelo exército estadunidense durante a guerra do Vietname, a do Golfo e a do Líbano; uns 10 helicópteros modelo Chinook, utilizados na guerra das Malvinas; outros 16 Black Hawk UH 60, outro tipo de aeronave de transporte tático, conhecido mundialmente pela atuação na guerra contra o Iraque. E por último, uns 26 helicópteros Bell 412.
Além dos helicópteros, solicitaram 182 tanques de guerra tipo Stryker, modelos M1128, M1130, M1132, M1134 e M1139, utilizados pelas forças armadas de EUA e Israel. Estas estão equipadas com metralhadoras calibre 50, lançadoras de granadas e canhões de 105 milímetros. A lista inclui 80 lança mísseis Javelin, um modelo portátil desenvolvimento pelo governo estadunidense para derrubar tanques e aviões.
A Força Aérea por sua vez encomendou  24 aviões de caça Texan T6, dos quais já se adquiriam uns 12, segundo anúncio oficial há alguns meses. Os Texan são aviões de treinamento avançado para pilotos, que foram utilizados na Segunda Guerra Mundial e durante as décadas posteriores. Acrescentaram outros 12 aviões de caça F-16 Fighting Falcon, desenvolvimento por EUA como material exclusivo de exportação e de caráter supersônico (viaja mais rápido que a velocidade do som), utilizados na Guerra do Líbano, do Afeganistão e na invasão de EUA ao Iraque, entre outros conflitos armados.
Por última, a Marinha solicitou, entre outras coisas, dois aviões Órion, utilizados habitualmente para patrulha marítima. Estes foram utilizados pelos estadunidenses na década de 1960, quando realizaram numerosas patrulhas de bloqueio nas proximidades de Cuba, além de terem participado nas guerras do Vietname e do Golfo. A lista de encerra com 24 veículos blindados Anfíbios modelo AAVR7A1, utilizados para transporte de tropas do corpo de fuzileiros navais estadunidenses.,
Completando essa carreira armamentista, a ministra de Segurança, Patricia Mullrich, adepta fervorosa dos que na Argentina fazem lobby para o sionismo, viajou, no início de janeiro a Israel para comprar mais insumos bélicos. Contudo, não é só isso. Devido seu público compromisso com a causa dos invasores do território palestino foi recebida como uma “dileta amiga” e pode participar de exercícios militares ofensivos realizados pelo exército israelense. Logo, em primeira instância, desembolsou das arcas do Estado argentino, 80 milhões de dólares (preço tremendamente superfaturado) pela compra de quatro lanchas de patrulha costeira artilhada para que naveguem pelo rio Paraná com o pretexto de “combater o narcotráfico”. De acordo com a teoria da ministra, por essa via fluvial “entram no país carregamentos de maconha”, a mesma que é fumada por muitos funcionários macristas e políticos dos vários partidos, mas essa é outra história. Bullrich também diz estar preocupada com o auge da circulação dos chefes do tráfico, quando se sabe que alguns desses personagens ou suas esposas estão comodamente instalados nas mansões do chamado Nordelta buenairense, graças aos bons ofícios de um ex policial e atual líder de um partido de direita amparado pela embaixada estadunidense.
Finalmente, Israel também fornecerá aviões espiões e helicópteros, além de equipamentos de radares e artefatos de alta tecnologia para realizar escutas e espionagem em zonas densamente povoadas. Quer dizer, grande parte de todas essas armas voltam a integrar, como em épocas que se acreditava superadas, os arsenais de combate contra protestos populares opositores ao regime.
Para concluir, no marco de uma gigantesca ofensiva regional mas também da grave situação internacional, Estados Unidos aproveita a mudança de rumo político produzido nos países sul-americanos a partir de golpes brandos ou manobras eleitorais e campanhas mediáticas para produzir um maior avanço político, econômico e militar. Neste aspecto, a venda de armamento, a futura instalação de bases sob diversos pretextos, entre eles as “intervenções para ajuda humanitária”, são as características do presente. Diante disso, urge aos povos do continente a necessidade de mobilizar-se por todos os meios para realizar o preceito tanto da Alba como da Unasul e do Celac, de que o continente “é um território de paz” e não um campo de cultura para as potências imperiais. Nesse caminho estamos, com a segurança, como afirmou o comandante Fidel Castro, de que estamos travando um combate em defesa da humanidade e das futuras gerações.. Trata-se de vencer ou vencer, se não queremos que a atual civilização desapareça.
*Jornalista, analista de política internacional, escritor e diretor da plataforma comunicacional Resumen Latinoamericano.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
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