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Donald Trump (Foto: Gage Skidmore / Flickr)

Extrema-direita, Atlas Network e América Latina: as hienas de Trump aguardam o apito

A vitória de Donald Trump nas eleições estadunidenses dá asas à extrema-direita na América Latina, e o Brasil se apresenta como um dos campos de batalha mais complexos para os EUA
Estratégia.la
Buenos Aires

Tradução:

Ana Corbisier

A internacional capitalista existe, é mobilizada pelo movimento libertário de extrema-direita e, obviamente, está muito bem financiada: funciona através de um imenso conglomerado de governos, fundações, institutos, ONG, centros e sociedades ligadas entre si por fios quase imperceptíveis, entre elas destaca-se a Atlas Economic Research Foundation, ou Atlas Network, e que agora receberá o apoio do próximo presidente dos EUA.

A nova direita radical abriu caminho graças à imensa desigualdade gerada pelo capitalismo. É surpreendente que no Ocidente os níveis de desigualdade sejam hoje os mesmos de há 100 anos, quando o fascismo iniciou a sua carreira e o seu rápido sucesso.

E com Trump, volta ao primeiro plano o ex-assessor da Casa Branca Steve Bannon, que em 2018 havia lançado o The Movement, uma plataforma para unificar a extrema-direita do Velho Continente ou, pelo menos, oferecer-lhe apoio e ajuda em análises, estudos e propaganda. A isto devemos acrescentar a rede que o Vox teceu na América Latina, sob o rótulo do Fórum de Madrid,

Os Estados Unidos estão numa situação favorável para fechar fronteiras, cancelar acordos comerciais e bloquear a expansão chinesa na sua área de influência. Para voltar a ser “grandes”, os Estados Unidos devem reconstruir o seu mercado interno, a sua produção e relançar-se com a sua imensa capacidade financeiro-tecnológica.

A Atlas Network

A “Atlas Network” também está por trás das políticas de Donald Trump: as suas políticas foram escritas para ele, num Mandato de Liderança de 900 páginas elaborado por um conjunto de grupos de reflexão liderados pela Heritage Foundation, que é membro da Atlas Network.

A rede, que ajudou a alterar o poder político em vários países, é uma extensão tácita da política externa dos EUA – os grupos de reflexão associados ao Atlas são financiados pelo Departamento de Estado, pela USAID (EUA) e pelo National Endowment for Democracy, um braço crucial do soft power estadunidense.

A Atlas tem 450 fundações, ONGs, grupos de reflexão e grupos de pressão, com um orçamento operacional de milhões de dólares, contribuídos pelas fundações “de caridade e sem fins lucrativos” associadas. Entre os seus contribuidores mais importantes estão os bilionários ultraconservadores Charles e David Koch e Sheldon Adelson. As maiores empresas multinacionais também fazem contribuições financeiras substanciais para a sua manutenção: Philip Morris, Exxon Mobil, o grupo de investimento Templeton, Pfizer, Procter & Gamble e Shell, por exemplo.

O ambiente de Donald Trump é marcado por teorias da conspiração. São grupos de extrema-direita responsáveis ​​por difundir versões que deixam os adversários políticos do líder republicano numa situação muito negativa. Mas quem são eles e o que dizem? QAnon, Pizzagate, Reptilianos, Tucker Carlson, Steve Bannon, John Bolton e outros alimentam acusações e teorias perturbadoras.

John Bolton e Steve Bannon

John Bolton, que foi conselheiro de Segurança Nacional de Donald Trump na Casa Branca (2018-2019) e estrategista na desestabilização venezuelana – e hoje um de seus grandes detratores –, acredita que o republicano pode buscar um encontro para negociar com o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, ou retirar-se da OTAN devido à influência de Vladimir Putin.

Extrema, radical, neofascista… uma nova direita, que pouco se assemelha aos direitos liberais-conservadores que conhecíamos, avança no mundo, com diferenças e alguns traços comuns: exaltação individualista, reação aos avanços progressistas em termos da igualdade de gênero e dos direitos das minorias, do projeto de reconstrução do patriarcado, de um anticomunismo renovado e da irradiação capilar do ódio como estratégia de construção política.

Steve Bannon é libertado da prisão dias antes das eleições, diz fonte - ABC News
Steve Bannon.

A volta de Donald Trump ao poder é um banho frio para o presidente Lula. A possível saída dos Estados Unidos do acordo climático de Paris pode murchar a COP30 da ONU na cidade de Belém, entre 10 e 25 de novembro de 2025. Lula optou fortemente por sediar a COP na Amazônia, para envolver o resto do mundo na sua conservação e no combate ao aquecimento global. O Brasil aspirava alcançar um novo compromisso global para reduzir as emissões de carbono.

Para isso, o ministro da Economia, Fernando Haddad, e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, trabalham juntos há meses no G20 que o Brasil presidiu este ano. Porém, dificilmente os Estados Unidos priorizarão a diretriz ambiental e o novo eixo da bioeconomia proposto pelo Brasil.

Trump, bolsonarismo, Venezuela, Milei…

Se agora o bolsonarismo brasileiro, encurralado pela justiça e perseguido por novos atores de direita radical, ligou o seu destino à tábua de salvação trumpista, a oposição venezuelana confia numa forte virada no comando dos Estados Unidos no país.

Participação de Kast em evento com Milei e Bolsonaro
Bolsonaro, Kast, Milei.

No Chile, José Antonio Kast, líder do Partido Republicano, descreveu o sucesso de Trump como “um novo triunfo da liberdade e do bom senso”. Kast, firme defensor da ditadura de Augusto Pinochet, já aproveita o cenário político americano para desgastar o presidente Gabriel Boric e se consolidar como alternativa nas eleições presidenciais do próximo ano.

O ex-presidente do Brasil Jair Bolsonaro vinculou seu destino ao retorno profético de Trump. A sua nova vitória, reconheceu, é um “passo muito importante” para o seu “sonho” de disputar as eleições de 2026 e voltar a presidir o Brasil. Bolsonaro, politicamente desqualificado até 2030, sugeriu que a vitória de Trump levará à sua anistia política.

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A reação de Bolsonaro resume o entusiasmo com que certa direita e extrema-direita latino-americanas receberam a vitória de Donald Trump. Do salvadorenho Nayib Bukele ao argentino Javier Milei, ao equatoriano Daniel Noboa, os governos conservadores da região elogiaram Trump.

“Agora, torne a América grande novamente. Você sabe que pode contar com a Argentina para cumprir sua tarefa. Sucesso e bênçãos. Atenciosamente”, escreveu Milei, a presidente libertária argentina (em inglês) na rede social X.

A vitória do republicano dá asas à extrema-direita latino-americana, e o Brasil, que também presidirá o Brics em 2025, é apresentado como um dos campos de batalha mais complexos para os EUA. O recente veto do Brasil à entrada da Venezuela nos Brics e o fato de até hoje Lula não ter reconhecido os resultados oficiais das eleições na Venezuela que dão a vitória a Nicolás Maduro podem suavizar o ânimo de Trump.

Elon Musk

Porém, um dos conflitos mais temidos em Brasília está relacionado ao magnata Elon Musk. Após a dura postura da justiça brasileira contra a desinformação da rede social, Musk, que já definiu o Brasil como uma ditadura em que a liberdade de expressão não é respeitada, o que pode levar Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), a ser impedido de entrar nos Estados Unidos, como exigem vários congressistas republicanos, claro, atacando a liberdade de expressão.

Além disso, os Estados Unidos podem causar interferência na tentativa do Brasil de legislar notícias falsas e impor limites às big techs, como aconteceu em abril, quando Musk explodiu o PL das Fake News, uma das leis mais avançadas do mundo sobre o assunto.

Musk e Trump.

A autoproclamada líder da oposição venezuelana, María Corina Machado, parabenizou Trump, afirmando-se como vencedora das eleições na Venezuela, embora nem sequer fosse candidata. “Presidente Trump, o governo democrático que nós, venezuelanos, elegemos em 28 de julho (…), será um aliado confiável para trabalhar com a sua administração”. Trump foi um dos promotores do caminho de confronto com o presidente fantoche Juan Guaidó para tentar derrubar Nicolás Maduro.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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