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Filósofos criticam qualidade acadêmica do ministro da Educação de Bolsonaro

Intelectuais lançaram desagravo público à memória do Padre Vaz, figura atacada em artigo de Ricardo Vélez Rodríguez e que tem sido divulgado recentemente
Redação Diálogos do Sul

Tradução:

Professores de filosofia de diversas universidades públicas e privadas de todo o país, como Marilena Chauí, João C. K. Quartim de Moraes e Fernando Frota Dillenburg, estão recolhendo apoio a um texto em defesa da memória do professor e filósofo Henrique Cláudio de Lima Vaz, o Padre Vaz, figura que vem sendo atacado pelo novo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez.

De acordo com a convocatoria, Rodríguez retomou um artigo “desonroso” contra Padre Vaz, com “um texto repleto de invenções grosseiras”. Os filósofos desmentem uma suposta negociação entre o religioso e a ditadura militar e questionam a qualidade das produções de Rodríguez: “possui em sua produção teórica artigos claramente ideológicos e tendenciosos, bastante afastados de temas propriamente acadêmicos e filosóficos”.

Confira a íntegra da convocatória. Para aderir à manifestação, basta enviar um e-mail para: desagravopadrevaz@gmail.com

Desagravo público à memória do filósofo Henrique Cláudio de Lima Vaz, o Padre Vaz

O padre jesuíta, professor e filósofo Henrique Cláudio de Lima Vaz (1921 – 2002) é conhecido em toda a comunidade filosófica e teológica brasileira, e mesmo internacional, por sua longa e brilhante trajetória em todos as áreas em que atuou. Entretanto, Vaz foi lembrado recentemente pelo Sr. Ricardo Vélez Rodríguez (Ministro da Educação do governo de Jair Bolsonaro), por meio de um texto repleto de invenções grosseiras.

Foi retomado um artigo desonroso contra o Padre Vaz, “Quem tem medo da Filosofia Brasileira?”, do Sr. Vélez Rodríguez, artigo original de 2009, depois republicado em 2011, e, como relatou o Prof. Paulo Margutti (Prof. Dr. que durante muito tempo teve atuação significativa na Direção do Grupo de Estudos de Filosofia no Brasil, junto à UFMG, e depois junto à Faculdade Jesuítica de Teologia), tal artigo tem sido divulgado com frequência no último período. 

Entre as insídias contra o Padre Vaz, o Sr. Vélez Rodríguez alega que o mesmo teria, na época da Ditadura Militar, negociado com o ministro da Educação – à época um general –, para que a organização Ação Popular (AP) abandonasse a luta armada. Em troca, o Padre Vaz passaria a controlar em grande parte o Ministério da Educação, sobretudo os organismos de financiamento CAPES e CNPq. Ora, como argumenta o professor Margutti, a Ação Popular jamais teve envolvimento com a luta armada! E cabe também questionar, conjuntamente com o professor Margutti: como um general faria tal negociação com um filósofo, professor e Padre de orientação popular, e entregaria ao mesmo o controle ideológico de organismos tão importantes do Ministério da Educação? A versão é completamente absurda! A verdade clara é que, apesar de certo controle ideológico ocorrido durante o período militar, na CAPES e no CNPq prevaleceram grosso modo critérios acadêmicos, analisando e selecionando solicitações de forma rigorosa, com assessores que, de maneira geral, observavam o mérito acadêmico de cada projeto. 

Mas, o mais grave de tudo isso é a qualidade absolutamente desproporcional dos debatedores. O primeiro, padre jesuíta, filósofo, teólogo, professor renomado, falecido em 2002. Consulte-se sua bibliografia e sua trajetória brilhante. De fato, estamos diante de um filósofo e teólogo que tinha um grande conhecimento da filosofia nacional e internacional, sobretudo, destaque-se, seu conhecimento da filosofia alemã, e particularmente de Hegel e a dialética. Entre as obras que nos deixou existem vários escritos sobre Hegel, tendo realizado para a célebre coleção Os Pensadores, da Abril Cultural, tradução direta do alemão de trechos da Fenomenologia do Espírito, texto até então inacessível em português. Além disso, Padre Vaz possui múltiplas publicações relevantes sobre diversos filósofos clássicos, tais como Platão e Tomás de Aquino. Como tudo isso é de conhecimento da comunidade filosófica brasileira, é desnecessário seguir enumerando obras do Padre Vaz. Àqueles que não conhecem sua bibliografia completa, recomendamos consulta em <https://padrevaz.com.br/index.php/bilbiografia-completa>.

O outro personagem do debate, o ministro da Educação, Sr. Vélez Rodríguez, possui em sua produção teórica artigos claramente ideológicos e tendenciosos, bastante afastados de temas propriamente acadêmicos e filosóficos. Mesmo os anunciados como filosóficos têm recorte tendencioso (“Menos Platão, mais Aristóteles”). A despeito de algumas publicações sobre Tocqueville e Leibniz, a grande parte de sua imensa bibliografia constitui-se de artigos de jornal ou de publicações em revistas sem valor acadêmico, artigos que tratam de temas muito distantes de debates filosóficos (como, por exemplo, sobre tráfico de drogas e assuntos similares). 

Diante de tudo acima relatado, consideramos que a comunidade filosófica brasileira e universitária como um todo tem o dever e a obrigação de defender publicamente a memória de HENRIQUE CLÁUDIO DE LIMA VAZ, o Padre Vaz. Convidamos instituições universitárias, departamentos de Filosofia e demais áreas de Ciências Humanas, bem como demais intelectuais que puderem colaborar, a apoiar este texto. 

Para assinar, enviar e-mail para: desagravopadrevaz@gmail.com

Assinam:

Alcides Hector Rodriguez Benoit (Prof. Livre-Docente Colaborador do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Unicamp);

Fábio Maia Sobral (Doutor em Filosofia e Prof. do Departamento de Economia da UFC);

Fernando Frota Dillenburg (Pós-Doutor em Filosofia e Professor do Departamento de Economia da UFRGS);

Gerson Pereira Filho (Prof. Dr. Departamento de Filosofia da PUC-Minas – Campus Poços de Caldas);

Dr. Idibal Pivetta (Advogado)

Jadir Antunes (Prof. Dr. de Filosofia da Unioeste-PR);

Jair Antunes (Prof. Dr. nos Departamentos de História e Filosofia da Unicentro-PR);

João C. K. Quartim de Moraes (Prof. Titular aposentado do Departamento de Filosofia da Unicamp, ex-diretor do IFCH/Unicamp);

Luiz Fernando Barrére Martin (Professor Dr. Dpto. de Filosofia da UFABC);

Marcelo Perine (Professor Associado de Filosofia da PUC-SP);

Marilena Chauí (Professora Emérita do Depto. De Filosofia da USP);

Maura Iglésias (Professora Emérita do Depto. De Filosofia da PUC-RJ);

Raul Landim (Professor Titular aposentado da UFRJ, Professor do PPGLM/UFRJ);

Roberto Horácio de Sá Pereira (Professor Titular do Departamento de Filosofia da UFRJ);

Sérgio Cardoso (Professor Livre-Docente do Departamento de Filosofia da USP);

Waldomiro José da Silva Filho (Professor Titular de Filosofia da Universidade Federal da Bahia);


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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