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Foto: Keiko e Alberto Fujimori (Imagem: X de Alberto Fujimori)

Fujimori quer voltar ao poder: como fujimorismo pretende burlar lei e qual o risco ao Peru?

Em 2009, a justiça do Peru condenou Fujimori a 25 anos de prisão pelo assassinato de 25 pessoas; hoje, o ex-ditador enfrenta um novo processo por sequestro, tortura e assassinato
Carlos Noriega
Página 12
Buenos Aires

Tradução:

Ana Corbisier

Volta o passado autoritário. Alberto Fujimori, o ditador que governou entre 1990 e 2000, arrasando os direitos humanos e sociais, com muita corrupção, que foi condenado a 25 anos de prisão por múltiplos assassinatos, sequestro e roubo do Estado, pretende voltar à presidência do país. Apesar de, por ser um condenado pela Justiça, a lei o impeça de ser candidato, Fujimori, que em dezembro passado foi libertado com um indulto alegando falsas razões humanitárias e que em duas semanas faz 86 anos, quer voltar ao poder, postulando-se à presidência nas eleições de abril de 2026. O lançamento de sua candidatura ocorre em um contexto de restauração autoritária e domínio institucional pelo Congresso, manejado pelo fujimorismo e seus aliados, com o aval do governo de Dina Boluarte.

Foi sua filha Keiko, chefe do partido fujimorista Força Popular e que já enfrentou duramente seu pai, a encarregada de lançar a candidatura do octogenário autocrata. “Conversamos e decidimos juntos que ele será o candidato presidencial”, anunciou Keiko em sua conta na rede X, antes Twitter. Mas esta candidatura enfrenta problemas legais para concretizar-se. A Constituição proíbe que alguém com uma condenação judicial vigente seja candidato. O questionado indulto que o beneficiou libera Fujimori de cumprir o que resta da pena que lhe foi imposta, mas não elimina a condenação que recebeu, que continua vigente; não o reabilita, concordam os juristas, inclusive aqueles que mostraram proximidade com posições do fujimorismo. E há o agravante de que não pagou um sol dos 57 milhões de soles (15,4 milhões de dólares) da reparação civil que lhe foi imposta. O Jurado Nacional de Eleições (JNE) terá a decisão final neste assunto. No Congresso, o fujimorismo manobra para assumir o controle do sistema eleitoral e do sistema de justiça. Se isto acontecer, terão poder sobre o JNE para impor uma decisão a favor de seus interesses.

Leia também | Lei da impunidade: Congresso do Peru aprova lei que beneficia Fujimori e repressores acusados de crimes de lesa humanidade

Se, como deveria acontecer, esta candidatura não passar pelo filtro legal, o fujimorismo postularia Keiko e jogaria a carta da vitimização, da narrativa de uma falsa perseguição, com o que espera ganhar apoio. Lançando seu pai como candidato, Keiko busca apagar sua má imagem de política ambiciosa e sem escrúpulos, que em 2017 opôs-se à libertação de seu pai com um indulto que depois foi anulado, por temor a que estando livre disputasse com ela a chefia do fujimorismo; pretende dar uma mensagem de reconciliação com seu pai destinada ao fujimorismo que a apoia por ser filha de Alberto Fujimori. Especulou-se que este lançamento seria uma manobra para fortalecer a candidatura de Keiko, que foi três vezes derrotada e agora enfrenta um processo por lavagem de dinheiro que pode levá-la por 30 anos à prisão.

As condenações de Fujimori

O ex-ditador que pretende regressar ao poder foi condenado a 25 anos em 2009 pelo assassinato de 25 pessoas, entre elas um menino de oito anos, nas matanças de Barrios Altos e La Cantuta, cometidas em 1991 e 1992 pelo grupo Colina, esquadrão da morte integrado por membros do exército formado por seu governo. Também foi sentenciado pelo sequestro de um jornalista e de um empresário, e por várias acusações de corrupção.

Fujimori ganhou as eleições de 1990 e em abril de 1992 deu um autogolpe, fechando o Congresso e assumindo o controle do sistema de justiça e de todas as instituições, governando a partir daquele momento com os militares. Seu regime foi marcado pelo autoritarismo, violações dos direitos humanos, um férreo ajuste econômico, uma radical política neoliberal, a liquidação de direitos trabalhistas, privatizações e muita corrupção. Quando sua ditadura desmoronava, fugiu do país, em novembro de 2000.

Em dezembro passado ficou livre depois que o governo de Boluarte reativou um indulto de 2017 que tinha sido anulado pela Corte Suprema por ser ilegal. Justificou-se este perdão assegurando-se que o ex-ditador estava muito doente, perto da morte. Mas desde que saiu da prisão mostrou-se com boa saúde para sua idade. O lançamento de sua candidatura presidencial confirma que o indulto humanitário por razões de saúde foi uma farsa. O ex-ditador enfrenta um novo processo pelo sequestro, tortura e assassinato de seis camponeses.

Em diálogo com o Página|12, o sociólogo e analista político Alberto Adrianzén analisou o lançamento da candidatura presidencial do ex-ditador, que qualificou de inaceitável. “É certo que o lançamento da candidatura de Fujimori poderia ser uma treta para fortalecer Keiko, o fujimorismo joga com várias cartas, mas este não é o assunto principal. O principal é a rejeição radical que deve ocorrer com a possibilidade de Fujimori candidato à presidência, porque deu um golpe de Estado, matou gente, roubou dinheiro do Estado, foi condenado a 25 anos. Sua candidatura é simbolicamente dar razão ao golpe de Estado de 1992, é uma ameaça à democracia. Significaria que lutamos atoa 30 anos pela democracia e por uma sociedade com regras e não manejada por delinquentes. A simples possibilidade de Fujimori apresentar-se à presidência é um ato de humilhação para os peruanos e peruanas. Estamos diante de um fato inaceitável”, afirmou Adrianzén.

Ele acrescenta uma comparação contundente: “É como se na Argentina, depois da ditadura, Videla tivesse se apresentado como candidato presidencial”. Na opinião do analista, o ex-ditador Fujimori teria maiores chances que sua filha Keiko de ganhar as eleições. “Para o fujimorismo, Alberto Fujimori é melhor candidato que Keiko. Quem é fujimorista é sobretudo por Alberto, não por Keiko”.

Adrianzén referiu-se também às possibilidades eleitorais de Alberto Fujimori: “Tem possibilidades de ganhar. O país está retrocedendo no político, no econômico, há um caos, um incremento da delinquência e uma situação de medo, especialmente nos setores populares que são os que mais sofrem a delinquência. O medo e a necessidade de segurança alimentam as possibilidades de opções duras como a de Fujimori, que é visto como a mão dura. As pessoas podem sacrificar muitas coisas com a condição de que resolvam para elas o problema da insegurança”.

“Nos anos 1990, o fujimorismo construiu uma hegemonia, o governo fez estradas, escolas, dava ajuda social não onde houvesse setores mais pobres, e sim onde havia mais eleitores; essa hegemonia agora está prejudicada, com dificuldades, mas é persistente. Creio que Fujimori seria o candidato da direita, que está fragmentada assim como a esquerda, com mais possibilidades de ganhar. Buscaria ir para o segundo turno para encabeçar toda a direita. A candidatura de Fujimori poderia ocasionar o que agora parece muito difícil, que se una toda a esquerda, o progressismo, para enfrentá-lo. A idade pode jogar contra ele”.

Adrianzén considera que um regresso de Fujimori ao poder “seria o fim da democracia, das tentativas de fazer um país moderno e democrático. Significaria aproximarmo-nos das políticas de Milei e de Bukele. Viria uma noite escura”.

Página|12, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Carlos Noriega

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