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Na imagem*: Luis Arce, Evo Morales e Laura Richardson

Guerra híbrida na Bolívia entra em nova fase e EUA querem “mudança de regime” até 2025

Comando Sul dos EUA, chefiado por Laura Richardson, já aplica ações de desestabilização de olho no lítio e na possível entrada da Bolívia no Brics
Carlos Fazio
La Jornada
Cidade do México

Tradução:

Ana Corbisier

Graças à chefe do Comando Sul do Pentágono, general Laura Richardson, principal protagonista e executora da diplomacia de guerra da Casa Branca e do Estado profundo (deep state) na América do Sul, e centrada na ação desestabilizadora interna da experimentada encarregada de Negócios dos Estados Unidos em La Paz, Debra Hevia, começou uma nova fase da guerra híbrida que busca consumar a política de “mudança de regime” na Bolívia no quadro das eleições presidenciais de 2025.

Os motivos do renovado esforço para desencadear uma “revolução colorida” no país sul-americano foram explicitados publicamente em várias ocasiões pela própria Richardson desde 2022: a Bolívia tem as maiores reservas mundiais de lítio, considerado uma das prioridades estratégicas do Departamento de Defesa dos Estados Unidos (a serviço dos interesses dos principais fundos de investimento globais: BlackRock, Vanguard e outros, assim como das corporações do complexo digital financeiro) em sua guerra geopolítica e geoeconômica por recursos naturais e mercados contra a China; e, além disso, o presidente boliviano Luis Arce impulsiona um processo soberanista de industrialização deste metal alcalino, razão pela qual, da ótica imperial e na linguagem orwelliana da general de quatro estrelas do Comando Sul, deve ser tratado propagandisticamente na mídia hegemônica como um “governo corrupto” à frente de um “narcoestado”; cartada principal desde o fim da guerra fria (quando o inimigo era o “comunismo de Moscou”) para acender um novo ciclo de violência fratricida –como o Plano Colômbia de Andrés Pastrana e Bill Clinton e a Iniciativa Mérida no México de Felipe Calderón–, propiciadora de um golpe brando ou de uma intervenção militar direta, em interação com o coringa da luta contra o terrorismo.

Um elemento adicional é o provável ingresso neste ano da Bolívia nos BRICS, aliança econômica que aglutina Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã; o bloco conta com 40% das reservas confirmadas de petróleo, 53,1% das reservas de gás natural e 40,4% das de carvão. Também, encabeçadas por China e Rússia, as nações BRICS+ são atores fundamentais na cadeia de fornecimento das chamadas tecnologias limpas; e um dos minerais chave para a transição energética e a indústria das baterias elétricas é o lítio. O que torna a Bolívia (que também conta com terras raras e água doce) um objetivo principal da “diplomacia militar” do Comando Sul, já que, segundo o Serviço Geológico dos Estados Unidos, tem reservas calculadas em 21 milhões de toneladas nos salares de Potosí. A ação ingerencista da general Richardson se incrementou nos últimos meses, devido à assinatura de convênios entre o governo boliviano e os consórcios chineses CATL Brunp & Cmoc e Citic Guoan e a empresa russa Uranium One Group, da corporação Rosatom, para a construção de usinas piloto com o objetivo de produzir lítio no salar de Uyuni.

Luta interna

Por sua vez, enquanto a inadmissível luta intestina no interior do oficialista Movimento ao Socialismo começa a erodir a relativa estabilidade política e quando a relação entre o ex presidente Evo Morales e Luis Arce parece chegar a um ponto sem volta, sob uma fachada de funcionária tecnocrata, a chefe da missão diplomática dos Estados Unidos em La Paz, Debra Hevia, que domina os códigos da guerra não convencional assimétrica e as operações psicológicas clandestinas, desenvolve uma estratégia de desestabilização entre cujos propósitos principais está o desaparecimento do MAS e, com isso, apagar qualquer vestígio do processo de mudança que começou em 2005 no país. Desde sua chegada à Bolívia em setembro de 2023, Hevia intensificou o que em dezembro o presidente Arce denunciou como uma guerra híbrida, definida como uma combinação em um campo de batalha de forças regulares e atores não estatais (milícias irregulares de corte paramilitar e desordem criminosa), apoiados em uma narrativa midiática com eixo na desinformação e na propaganda marrom, no acionar diplomático (incluindo tarefas de espionagem), ciberataques, sabotagens e outras ferramentas desestabilizadoras.

Para isso, Hevia, que também passou pelo Centro de Operações do Departamento de Estado – grupo de trabalho dedicado às tarefas de inteligência e às operações especiais–, reforçou os programas semiclandestinos da missão com impacto político, econômico e de imersão social em zonas marginalizadas da Bolívia destinados a gerar divisão interna (o clássico divide e vencerás), entre eles, formação de lideranças e ações de rua, com financiamento da Fundação Nacional para a Democracia, velha fachada da Agência Central de Inteligência (CIA), do Instituto Republicano Internacional e do Instituto Democrático Nacional – tradicionais fachadas para a subversão e os golpes brandos dos partidos Republicano e Democrata – e operadores externos e internos como a conservadora Fundação Liberdade e Democracia, fundada em 2023 e integrada, entre outros, por ex-primeiros-ministros e ex presidentes como Mariano Rajoy, José María Aznar, Vicente Fox, Felipe Calderón, Andrés Pastrana, Iván Duque e os bolivianos Jeanine Áñez (presa) e Jorge Quiroga; a Aliança Informativa Latino-americana, formada por uma rede de cadeias públicas e privadas de televisão dos Estados Unidos e da América espanhola (CBS, Caracol da Colômbia, Unitel da Bolívia e TV Asteca do México, entre outras); ONGs bolivianas como Rios de Pé e a Fundação Construir, assim como o ativismo do Projeto Centurião da organização Grupo de Apoio da Igreja Militar (vinculado à Igreja Batista e a Fort Bragg, hoje Fort Liberty) em zonas rurais, sob o guarda-chuva de projetos comunitários.

E ainda, visando reconstruir o braço armado da Juventude Cruzenha para gerar episódios violentos de rua, Hevia financiou as atividades de Svonko Matkovik, com antecedentes de terrorista e atual presidente da Assembleia Legislativa de Santa Cruz pelo partido Cremos, enquanto busca emplacar um candidato único da oposição para as eleições de 2025, entre os quais dois, oriundos desta entidade: o governador interino Mario Aguilera e o prefeito Johnny Fernández, e Manfred Reyes Villa, prefeito de Cochabamba.

* Créditos das imagens:
– Manifestantes bolivianos: Martín Santarelli
– Luis Arce: OECD/ Julien Daniel
– Evo Morales: Alain Bachellier
– Laura Richarson: Comando Sul dos EUA


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Carlos Fazio

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