Imagens apocalípticas dos incêndios em Los Angeles, a segunda maior cidade dos Estados Unidos, impressionaram a todos com o que agora é considerado o desastre natural mais custoso (24 mortes, R$ 1,5 trilhão em danos) e de maior escala na história do país – alguns dizem que é um evento sem precedentes nos Estados Unidos.
Como costuma acontecer com os desastres, os noticiários e as imagens nas redes sociais dão a impressão de que toda a cidade está em chamas – algo em parte reforçado pelo fato de que as vítimas incluem estrelas de Hollywood, o que só multiplica a atenção. No entanto, a maior parte dessa grande metrópole não está diretamente afetada. Ainda assim, são mais de 10 mil estruturas danificadas, dezenas de milhares de deslocados, e a área devastada equivale ao tamanho de Manhattan.
Embora o ocorrido tenha seus fatores muito locais, esse inferno tem implicações nacionais, já que não se pode desvinculá-lo do manejo político – ou melhor, da irresponsabilidade política – diante da crise climática e dos modelos de desenvolvimento urbano. Também tem implicações transnacionais: Los Angeles não é apenas a segunda maior cidade dos Estados Unidos, mas também a segunda maior cidade com população de mexicanos no mundo. Além disso, é o centro da Califórnia, o estado mais rico do país, que sozinho equivale à quinta maior economia mundial.
Este desastre, ocorrido no país e no estado mais rico do mundo, revela o nível de irresponsabilidade, ganância e arrogância das elites políticas e empresariais ao ignorarem os perigos relacionados às mudanças climáticas e as consequências de construir em zonas frágeis. Não é a primeira advertência nesses mesmos locais, embora os desastres anteriores não tenham tido essa magnitude. Acaba de ser confirmado que o mundo enfrentou o ano mais quente já registrado, com todas as implicações que isso traz para o futuro da humanidade – incluindo mais secas e incêndios.
Jogo político
O desastre também evidencia o nível medíocre e perigoso do jogo político nesta conjuntura. Desde que os incêndios começaram a sair do controle, o primeiro presidente eleito e condenado como criminoso, junto com seus aliados, usou a emergência como oportunidade política para acusar o governador da Califórnia e a prefeita de Los Angeles – ambos democratas – de serem responsáveis pelo desastre.
Com uma torrente de desinformação, culparam as regulamentações ambientais dos democratas e seus chefes de bombeiros e outros serviços de emergência, alegando que foram contratados para atender a exigências de diversidade racial e sexual. Tudo isso enquanto partes da cidade ardem.
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Enquanto isso, brigadas de bombeiros e equipes de resposta a desastres chegam do México, Canadá e África do Sul, entre outros países. Diaristas urbanos – alguns ligados à Rede Nacional de Organização de Diaristas – e outros imigrantes mexicanos, latino-americanos e asiáticos se somam às operações de resgate e apoio, oferecendo imagens de solidariedade que, em suas ações, respondem diretamente à odiosa frase de Trump: “Os imigrantes são todos bandidos, criminosos”.
Em sua obra-prima sobre a história dessa cidade, City of Quartz, publicada em 1990, Mike Davis escreveu que “o significado histórico mundial final… de Los Angeles é que ela assumiu o duplo papel de utopia e distopia para o capitalismo avançado”.
Em outro livro, Ecology of Fear, publicado em 1998, Davis escreveu que “Los Angeles se colocou em perigo de maneira deliberada. Por gerações, a urbanização impulsionada pelo mercado transgrediu o senso comum ambiental… Como resultado, o sul da Califórnia colheu tragédias de inundações, incêndios e terremotos…” E acrescentou: “vista do espaço, a cidade que em algum momento foi imaginada como uma com um futuro sem limites naturais ou sociais agora deslumbra os observadores com a inquietante beleza de um vulcão em erupção”.
Ou seja, ninguém pode dizer que o que está acontecendo em Los Angeles é uma surpresa. Agora, parte do futuro do país será definido pela resposta a essa emergência.
Randy Newman | I Love LA
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