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Andrea Sato: "A presença do Brasil nos BRICS é interessante para o Chile pela importância geopolítica que o Brasil tem na América Latina" (Montagem: Diálogos do Sul Global*)

Ingresso no Brics ganha força no Chile com apoio do Partido Comunista e ex-chanceleres

Candidaturas da esquerda defendem aproximação com bloco liderado por Brasil, China e Índia, enquanto especialistas apontam vantagens estratégicas e riscos geopolíticos

Sergio Pintado
Sputnik Mundo
Montevidéu

Tradução:

Ana Corbisier

Um debate entre os pré-candidatos à presidência do oficialismo voltou a colocar na agenda a possibilidade de que o Chile se torne sócio do Brics, o bloco de economias emergentes fundado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, que se expandiu e, a partir de 2025, terá mais de 20 integrantes entre membros plenos e Estados associados.

Pré-candidatos divergem sobre pragmatismo e alianças estratégicas

A incorporação ao Brics surgiu como tema porque o Chile foi convidado pelo Brasil a participar da próxima cúpula do bloco, que será realizada em julho no Rio de Janeiro. Ali, por convite do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o Chile poderia dar passos importantes para se tornar sócio do bloco.

Durante o debate, a adesão ao Brics foi defendida pela pré-candidata do Partido Comunista, Jeannette Jara. “Me interessaria muito que entrássemos nos Brics porque creio que são mercados importantes que se abrem para o nosso país em aliança com países estratégicos no desenvolvimento mundial, como China e Índia”, afirmou.

Diante de alguns questionamentos da pré-candidata Carolina Tohá sobre aderir ao Brics enquanto o conflito entre Rússia e Ucrânia segue vigente, Jara respondeu: “Se fosse por não nos relacionarmos com nenhum país que alguma vez teve ou venha a ter um conflito, teríamos que sair das Nações Unidas ou da Organização Mundial da Saúde”.

As palavras de Jara foram apoiadas dias depois pelo ex-subsecretário de Relações Econômicas Internacionais da chancelaria chilena, José Miguel Ahumada, que, em entrevista à Rádio Uchile, defendeu que aproximar-se do Brics “é um sinal correto, dado o cenário atual”.

O acadêmico destacou que, enquanto “em 1995 os membros do Brics representavam cerca de 17% da produção global, hoje representam 35%”. Em contrapartida, Ahumada lembrou que, no mesmo período, “o G7 caiu de 45% para 30%”. “Ou seja, os Brics são um bloco que inclui economias que estão se expandindo consideravelmente e com as quais o Chile tem vínculos muito fortes.”

Possível associação ao Brics deve considerar pragmatismo histórico

Em diálogo com a Sputnik, o analista internacional chileno Juan Eduardo Mendoza ressaltou que a possível incorporação ao bloco deveria ao menos ser estudada pela chancelaria, já que “ninguém nega que temos uma relação importante da nossa economia com China, Índia e Brasil, e que são sócios estratégicos”.

De todo modo, enfatizou a importância de que o país sul-americano analise o tema fiel a seus princípios tradicionais de política exterior, com “pragmatismo e sem ideologização”.

“O Chile poderia ser membro associado, talvez não um membro pleno ainda deste agrupamento, mas com a porta aberta para fazer parte de outras agrupações”, sugeriu o acadêmico.

Para Mendoza, é importante que a eventual incorporação ao Brics contemple, além dos interesses econômicos do Chile, a “área geopolítica de interesse” do país, que atualmente está focada na Ásia-Pacífico, uma região que se transformou em um mercado prioritário para a economia chilena.

Brasil impulsiona papel regional dos Brics e atrai Chile ao bloco

Também consultada pela Sputnik, a pesquisadora da Fundação SOL Andrea Sato afirmou que um dos maiores atrativos por trás do convite ao Brics pode estar na possibilidade de “reforçar alianças regionais”, aproveitando a presença e a importância do Brasil no grupo.

“A presença do Brasil nos Brics é interessante para o Chile pela importância geopolítica que o Brasil tem na América Latina e especialmente na América do Sul. As discussões são sobre como fortalecer as relações regionais com os vizinhos em termos de acordos comerciais e como isso pode construir autonomias e independência comercial para os países da América Latina e do Caribe”, refletiu.

Para a pesquisadora, embora a China seja há mais de uma década o principal sócio comercial do Chile, não se pode ignorar o desafio que representa aproximar-se mais do gigante asiático em tempos de uma “guerra comercial” aberta com os Estados Unidos.

A esse respeito, apontou que o governo chileno deve também avaliar o possível caráter político do bloco “num mundo que aparece novamente como bipolar”. Diante disso, ressaltou a importância de que “a incorporação a novos blocos não implique uma obediência cega a novas hegemonias”.

De qualquer forma, a acadêmica considerou pouco provável que o Chile possa sofrer represálias dos Estados Unidos ou da União Europeia, dois mercados que, nas últimas duas décadas, perderam espaço no Chile em favor do crescimento da China como sócio comercial.

“Há duas décadas, os Estados Unidos têm uma participação secundária como sócio comercial do Chile, e a União Europeia perdeu centralidade e importância, não só para o mercado chileno, mas para o latino-americano em geral”, lembrou, apontando como improvável que o país receba novos “castigos”, como as tarifas anunciadas no começo de 2025.

Diante disso, Sato enfatizou que é “importante” definir “em que o Chile vai apostar num contexto de crise de hegemonia e transição no mundo ocidental” que parece mudar as relações de poder no cenário internacional. Para a pesquisadora, é fundamental que o Chile avalie “se formar um bloco comercial implica necessariamente criar um novo bloco político”.

* Imagens na capa:
– Bandeira do Chile: Engin Akyurt / Pexels
– Brics: Rafa Neddermeyer/Brics Brasil/PR (modificado)


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

Sergio Pintado Jornalista da Sputnik Mundo.

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