Em Gaza, as histórias não terminam nos limites do bombardeio, elas começam ali, naquele instante do adeus que não se assemelha a nenhum outro, naquele último olhar em que toda uma vida é resumida. Um jornalista sai de casa após um dia árduo, beija sua filha recém-nascida que viu pela primeira vez… e pela última. Ele não sabia que seu coração pararia antes de ouvir a primeira risada dela, nem que seu trajeto até o restaurante seria o caminho para o martírio.
No bairro Al-Tuffah, outro jornalista documentava com sua câmera um novo crime na Escola Al-Karama. Ele não carregava armas, mas sim a verdade nas mãos. Caiu mártir enquanto tentava contar ao mundo o que estava acontecendo, dizer que há pessoas sendo exterminadas a sangue-frio e que a lente ainda resiste, mesmo que se quebre.
E uma criança, voltando da escola, procura o pai e o encontra estendido entre os mártires. Chama por ele e não recebe resposta, amadurecendo mil anos em um único instante. Uma família inteira se despede da vida depois de um dia exaustivo, um dia sem segurança e uma noite sem paz, encerrada por aviões com um míssil que transformou a casa em um silêncio eterno.

Já o menino do café, que buscava seu sustento pelas calçadas, alegrando os rostos dos passantes com sua alegria, também partiu. Sua inocência não o protegeu da máquina de guerra, nem o café que distribuía com um sorriso que desafiava o cerco, a fome e o medo. Hoje, juntou-se à marcha dos mártires, deixando vazio seu lugar na esquina de uma rua que jamais será esquecida.
O que ocorre em Gaza não são apenas notícias urgentes ou manchetes sangrentas, mas um assassinato diário da vida, dos sonhos, da esperança. É uma guerra contra tudo o que é humano, ao ponto de a câmera virar um caixão, a caneta um obituário e a lágrima da criança uma mancha na consciência do mundo.
Mesmo assim, os jornalistas escrevem com sangue aquilo que as letras não conseguem expressar, e as crianças registram com suas almas o que as câmeras não conseguem capturar. Será isso suficiente para despertar consciências? Será que o mundo percebe que, em Gaza, toda despedida pode ser a última?
Em Gaza, não são apenas as pessoas que morrem… o mundo também silencia, escondendo com elas o fato de ter permanecido calado por tempo demais.
Edição de texto: Alexandre Rocha