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Sergey Lavrov (Foto: Artem Geodakyan / TASS)

Lavrov: “França e Reino Unido jogam lenha na fogueira” ao propor tropas europeias na Ucrânia

Ainda segundo o chanceler russo Sergey Lavrov, Otan insiste em criar na Ucrânia uma infraestrutura militar dirigida contra a Rússia
Juan Pablo Duch
La Jornada

Tradução:

Beatriz Cannabrava

Nesta quarta-feira (26), o chanceler russo Sergey Lavrov qualificou como “palavras vazias” as conversações sobre o eventual envio de tropas estrangeiras de interposição à Ucrânia, por parte de França, Grã-Bretanha e outros países europeus membros da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), na suposição de que Moscou e Kiev aceitem declarar um cessar-fogo.

“As conversações sobre o envio de certas tropas de paz (à Ucrânia) são palavras vazias”, afirmou o chefe da diplomacia russa em Doha, capital do Catar, e opinou que “os países europeus impulsionam com espírito beligerante uma política irremediavelmente antiquada e fracassada em relação à Ucrânia”.

Lavrov considera que as propostas mais recentes de França e Grã-Bretanha “têm como propósito continuar jogando lenha na fogueira do conflito e deter qualquer tentativa de apaziguá-lo”.

Em relação ao que foi dito recentemente pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, no sentido de que o Kremlin poderia aceitar tropas estrangeiras na Ucrânia, Lavrov sublinhou que “ninguém consultou a Rússia”, que se opõe enfaticamente a essa possibilidade.

O ministro das Relações Exteriores russo chamou de “trapaça” a iniciativa do presidente francês, Emmanuel Macron, de enviar tropas de paz à Ucrânia e só depois discutir a questão territorial. A Rússia, afirmou, não pode aceitar um acordo cuja “única finalidade é rearmar a Ucrânia”.

Para Lavrov, “é necessário eliminar as causas principais do conflito, que não se deve à ausência de tropas de paz, mas à intenção da Otan de atrair a Ucrânia para criar em seu território uma infraestrutura militar dirigida contra a Rússia e minar os direitos da população de origem russa”.

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Acordo entre Washington e Kiev

As notícias que chegam da capital ucraniana apontam que a Ucrânia e os Estados Unidos já elaboraram “uma versão final” de um acordo consensual para destinar os benefícios da exploração dos recursos naturais ucranianos a um fundo de investimento comum.

No entanto, o primeiro-ministro Denys Shmyhal advertiu também nesta quarta-feira que a Ucrânia não vai assinar nada enquanto não forem especificadas as “garantias de segurança” que Kiev solicita, enquanto o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assegurou que não pretende dar “nenhuma garantia de segurança” à Ucrânia, já que, em sua opinião, “isso será feito pelos europeus” e a simples presença dos Estados Unidos na Ucrânia “poderá dissuadir qualquer um de atentar contra os interesses estadunidenses”.

O mandatário estadunidense, que acredita que a Ucrânia “pode esquecer a ideia de ingressar na Otan”, recebeu nesta sexta-feira (28) em Washington seu homólogo ucraniano, Volodymyr Zelensky, para assinar um “grande acordo sobre os recursos minerais” ucranianos.

Segundo o jornal ucraniano Kyiv Independent, o documento se chama “Acordo bilateral para estabelecer normas e condições para o investimento em um fundo de reconstrução da Ucrânia”. O texto define, no ponto 3, o que se entende por “recursos naturais” do governo ucraniano (“minerais, petróleo, gás natural, outros hidrocarbonetos e materiais extraíveis”) e determina que a Ucrânia se comprometa a “contribuir para o Fundo com 50% da futura monetização de todos os seus ativos de recursos naturais”.

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Após anunciar que o governo ucraniano na quarta-feira aprovou a assinatura do acordo bilateral, o primeiro-ministro Shmyhal destacou que, na realidade, se trata de “um entendimento preliminar que determina as ações jurídicas para a futura criação de um fundo de investimento”.

Shmyhal comemorou que “o acordo consensual não faz mais nenhuma referência a uma dívida de 500 bilhões de dólares ou de outro tipo. Também não inclui o ponto abusivo de que, para cada dólar de nova ajuda, a Ucrânia deve devolver dois dólares, nem a não menos injusta definição de que o Fundo pertence exclusivamente aos Estados Unidos: está estipulado que a Ucrânia e os EUA terão os mesmos direitos e obrigações, tanto na tomada de decisões quanto no que se refere ao aporte de capitais”.

Putin oferta projetos de mineração

 Na última segunda-feira (24), o presidente Vladimir Putin ofereceu aos Estados Unidos e outros países a realização de “projetos conjuntos de exploração de metais e minerais raros na Rússia, incluindo nos novos territórios” (em referência às quatro regiões ucranianas anexadas).

Putin fez a oferta de cooperação com parceiros, incluindo os Estados Unidos, como uma possibilidade hipotética durante uma entrevista noturna para a televisão pública e reconheceu que a exploração de depósitos de terras raras “requer investimentos de alto capital”: “são projetos caros”.

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A Rússia, disse seu presidente, está disposta a oferecer a investidores americanos e de outros países a participação em projetos para extrair metais e terras raras também nas regiões anexadas, que “têm determinadas reservas”, razão pela qual “estamos abertos a trabalhar lá com nossos parceiros estrangeiros”.

Putin ressaltou: “Nós (Rússia) temos dez vezes mais recursos desse tipo do que a Ucrânia”.

O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, afirmou na terça-feira (25) em sua coletiva de imprensa diária que há “perspectivas muito amplas” para cooperar com os Estados Unidos em matéria de metais e minerais de terras raras, mas esclareceu que isso não seria possível antes de normalizar as relações de Moscou com Washington e de selar uma solução negociada para o conflito armado na Ucrânia. “Quando chegar o momento, estaremos prontos para isso”, acrescentou.

O Ministério de Recursos Naturais da Rússia emitiu também na última terça-feira um comunicado informando que o vasto país possui reservas de 29 metais raros equivalentes a 658 milhões de toneladas, incluindo 28,5 milhões de toneladas de metais de terras raras.

A Rússia, de acordo com o Ministério de Recursos Naturais, possui 14 metais raros: lítio, rubídio, césio e berílio, entre outros, além de 15 elementos de terras raras, que são extraídos dos depósitos de forma conjunta e depois separados.

Propostas iniciais de Trump

A oferta russa ocorreu pouco depois de Trump informar que esperava que o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, pudesse viajar a Washington para assinar o acordo do fundo de investimento, financiado com os recursos naturais ucranianos e que garante a participação dos Estados Unidos na reconstrução do país.

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Inicialmente, Trump exigiu 500 bilhões de dólares em metais e minerais de terras raras ucranianas, em troca da ajuda financeira e em armamentos fornecida à Kiev pela administração de Biden. Após Zelensky recusar a proposta, o envio de armas foi substancialmente reduzido, de acordo com vazamentos para a imprensa ucraniana.

Especialistas questionaram qual seria o sentido para os Estados Unidos participar desse tipo de projeto, já que para extrair meio trilhão (500 bilhões) de dólares em metais e minerais raros — supondo que essa fosse a quantidade acordada — seriam necessários investimentos de pelo menos 800 bilhões de dólares.

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O PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) divulgou na terça-feira (25) os resultados de uma avaliação conjunta com o Banco Mundial e a Comissão Europeia. A conclusão é de que, durante a próxima década, a reconstrução da Ucrânia exigirá 524 bilhões de dólares, ou seja, quase três vezes o Produto Interno Bruto (PIB) do país, afirmam os autores do prognóstico.

Entre os setores que exigem mais recursos, por terem maior grau de destruição, estão o sistema energético, a agricultura, outras infraestruturas básicas, o transporte e as moradias, duramente afetados pela guerra.

Votação na ONU

Sobre as votações de segunda-feira (24) na Organização das Nações Unidas, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, elogiou a postura dos Estados Unidos no Conselho de Segurança: “Vemos que Washington tem uma postura muito mais equilibrada (do que os países europeus), o que realmente ajuda nos esforços para buscar um acordo político em torno do conflito na Ucrânia”.

Ele acrescentou: “Certamente damos as boas-vindas a isso. Acreditamos que uma posição tão equilibrada indica um desejo genuíno de contribuir para um acordo”.

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Peskov, no entanto, não comentou as declarações posteriores de Trump sobre dois temas que o Kremlin considera inegociáveis: sua convicção de que Putin não se oporá a deixar alguns dos territórios ocupados na Ucrânia e de que aceitará a presença de tropas europeias no país eslavo vizinho.

Enquanto isso, de Kiev chegou a notícia de que o “ditador sem eleições”, como Trump chamou Zelensky há alguns dias, recebeu na terça-feira o apoio da Rada Suprema (Parlamento), que em uma resolução – aprovada com 268 votos a favor e 12 abstenções – eliminou as dúvidas sobre a legitimidade de Zelensky ao lembrar que “o presidente (embora seu mandato tenha terminado em maio passado) deve permanecer à frente do país porque a legislação ucraniana proíbe a realização de eleições enquanto a lei marcial estiver em vigor”.

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Os deputados reiteraram que as eleições presidenciais na Ucrânia serão realizadas quando a guerra terminar e for assinada “uma paz justa e duradoura”. A resolução foi adotada um dia depois de Zelensky dizer que está disposto a renunciar se isso “garantir a segurança da Ucrânia ou se for aceito imediatamente na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan)”.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul Global – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

Juan Pablo Duch Correspondente do La Jornada em Moscou.

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