Em 1º de outubro, completou-se um ano desde o início oficial do sexênio da primeira mulher presidenta do México, Claudia Sheinbaum Pardo. Embora as pesquisas revelem 80% de aprovação entre a população, os benefícios para as mulheres têm sido escassos no governo que afirmou “chegamos todas” — ou seja, que a vitória de Sheinbaum foi uma vitória de todas as mulheres.
Ainda que a mandatária tenha se dedicado a celebrar essa aprovação, suas políticas públicas para o avanço dos direitos das mulheres são consideradas insuficientes.
Vale lembrar que a eleição de Sheinbaum foi histórica. Ela chegou à presidência com mais de 36 milhões de votos, tornando-se a primeira mulher a ocupar o cargo em 215 anos desde a Independência do México, após o país ser governado por 66 mandatários homens e 72 anos depois de as mexicanas conquistarem o direito ao voto, em 1953.
Um ano após sua posse, o Comitê Executivo Nacional (CEN) do partido Morena apontou como principais conquistas do governo a ampliação dos programas sociais, a redução da pobreza, o aumento do investimento estrangeiro, o fortalecimento do sistema de saúde, projetos para garantir moradia digna, 19 reformas constitucionais e o impulso a 40 novas leis — além das negociações em política externa com Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, bem como estratégias de segurança para o combate à violência.
A principal conquista destacada pelo governo de Sheinbaum é a ampliação dos programas sociais. Somente em 2025, foram destinados 850 bilhões de pesos aos Programas para o Bem-Estar, o equivalente a 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Essa política foi apontada como responsável pela redução da pobreza, que passou de 41,9% em 2018 para 29,5% em 2024.
Esses números foram celebrados como o índice mais baixo em quase quatro décadas, consolidando um novo modelo econômico para combater a pobreza no país — apresentado como um reconhecimento do Estado à população que enfrentou a desigualdade econômica do neoliberalismo na década de 1980. Agora, o discurso oficial sustenta que o México é o segundo país do continente com menor desigualdade, atrás apenas do Canadá.
A Diálogos do Sul Global está em todo lugar! Conheça nossas redes.Não obstante, segundo documentado pela Cimacnoticias, a estratégia do governo, gestada ainda na administração de Andrés Manuel López Obrador (2018–2024), poderia levar a uma situação insustentável. Isso porque, ao atribuir um orçamento maior aos programas sociais e seguir ampliando sua cobertura, o governo deixa de atender pessoas que realmente necessitam do recurso, mas que não pertencem a determinados grupos ou faixa etária específicos. Além disso, compromete-se verbas destinadas a outras áreas, a fim de manter esses programas sociais.
Um exemplo disso são as mulheres em situação de pobreza extrema. Em agosto de 2025, o Instituto Nacional de Estatística e Geografia (INEGI) divulgou os resultados da pesquisa de pobreza multidimensional, revelando que 20,1 milhões de mulheres estão em situação de pobreza, de um total de 67 milhões de mexicanas. Embora não tenha sido detalhado quantas estão em pobreza extrema, sabe-se que, em 2024, o extinto Conselho Nacional de Avaliação da Política de Desenvolvimento Social (Coneval) indicava 4,8 milhões de mexicanas nessa condição.
Para 2026, foram destinados 10,1 trilhões de pesos do orçamento aos programas sociais, um aumento de 14,1%, segundo cálculos do Instituto Mexicano para a Competitividade A.C. (IMCO). Estudo recente da entidade aponta que pelo menos 16 programas sociais absorverão 10% do Orçamento de Egressos da Federação. Os principais são a Pensão Mulheres Bem-Estar, com 57 milhões de pesos; o Saúde Casa por Casa, com 4 milhões; e a Bolsa Rita Cetina, com 129,4 milhões de pesos.
Apesar da ajuda destinada às mulheres, a economista Violeta Rodríguez del Villar, pesquisadora do Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade Nacional Autônoma de México (UNAM), alerta que programas sociais e pensões não devem substituir o ingresso salarial. Pelo contrário, é necessário fechar a brecha salarial entre mulheres e homens, já que, segundo a Pesquisa Nacional de Renda e Despesas dos Lares (ENIGH) 2024, a renda média mensal das mulheres foi de 7.904 pesos, frente a 12.015 pesos dos homens.
Compromissos com as mulheres
Há um ano, as ruas do Centro Histórico da Cidade do México se encheram de mexicanas e mexicanos que celebravam a continuidade do Morena no poder e a chegada da primeira mulher à presidência. Reunidos na Praça do Zócalo, os cidadãos assistiram à leitura dos 100 compromissos da nova presidenta — dos quais apenas sete foram destinados às mulheres, adolescentes e meninas do país.
Essas promessas incluem: elevar a igualdade substantiva a nível constitucional; criar a Pensão Mulheres Bem-Estar para mulheres de 60 a 64 anos; estabelecer o Programa SOS Mulheres; implementar iniciativas para garantir refúgios e fazer com que os agressores sejam os que saiam de casa; promover procuradorias especializadas em feminicídios e investigar toda morte violenta de mulher como feminicídio; garantir o acesso das mulheres à saúde, especialmente à saúde reprodutiva e sexual; e assegurar direitos agrários para mais de 150 mil mulheres.
O resultado de suas promessas foi apresentado durante seu Primeiro Informe de Governo, celebrado no último 1º de setembro. A Cimacnoticias acompanhou a cobertura sobre o cumprimento desses sete compromissos; ao longo do ano, foi registrado que, em primeiro lugar, as reformas em matéria de igualdade substantiva, de direitos das mulheres, para uma vida livre de violência e para eliminação da brecha salarial não abordam de forma profunda o problema estrutural, já que ainda persistem problemas para garantir a paridade de gênero nos cargos políticos, conforme apontou à Cimacnoticias a feminista e defensora dos direitos humanos Angélica de la Peña.
Por outro lado, foi cumprida a promessa de criar o Programa SOS Mulheres, ou “Linha das Mulheres”, que inclui uma linha nacional para atendimento a mulheres vítimas de violência, após denunciarem seu caso ao número 079*1. Em relação a essa proposta, foi apresentada uma série de reformas constitucionais denominadas Políticas de Bem-Estar para as Mulheres.
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Uma dessas iniciativas foi a criação dos Centros LIVRES para as Mulheres. Até agora, foram construídos 628 dos 2 mil previstos para todos os municípios do país, conforme destacou Sheinbaum em seu Informe. Esses centros fundem elementos de outras políticas públicas para formar um programa subsidiado pelas Secretarias das Mulheres (Semujeres) de cada estado da República Mexicana.
Embora diferentes organizações civis, feministas e defensoras de direitos humanos tenham denunciado a falta de transparência na criação desses centros e questionem sua efetividade, foram destinados 754.538.872 pesos do orçamento do governo do México e dos governos estaduais para a iniciativa.
A isso se soma que, em seu Primeiro Informe de Governo, Sheinbaum mencionou a criação de mil Centros de Educação e Cuidado Infantil (CECI), em colaboração com o Instituto Mexicano de Seguro Social (IMSS) e o Sistema Nacional para o Desenvolvimento Integral da Família (DIF), como parte da formação de um Sistema Nacional de Cuidados, voltado ao atendimento da primeira infância, dos 40 até os mil dias de vida.

No entanto, a promessa do Sistema Nacional de Cuidados perdeu força quando, no “Encontro Nacional: Futuro dos Cuidados no México”, realizado em novembro de 2024, Citlalli Hernández, titular da Semujeres, declarou que esse sistema não será concluído durante a administração de Sheinbaum.
O único avanço concreto em 2025 foi a criação de um novo anexo transversal no Orçamento de Egresso da Federação, que servirá como diagnóstico para identificar quanto dinheiro foi destinado ao Sistema Nacional de Cuidados. No entanto, esse mecanismo não implicará aumento orçamentário nem representa um benefício direto ao direito de todas as pessoas de cuidar e serem cuidadas.
Por fim, uma das ações mais contundentes foi a mudanças realizadas no Orçamento de Egresso da Federação, onde os refúgios para mulheres — que fazem um importante trabalho de prevenção em temas de violência contra as mulheres — desapareceram explicitamente do Anexo 13 – “Despesas para a Igualdade entre Mulheres e Homens”.
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Cabe recordar que esses espaços surgiram no México como uma iniciativa da sociedade civil e dos movimentos de mulheres, visibilizando o grave problema da violência machista e o colocando na agenda pública como uma questão de segurança, saúde pública, direitos humanos e acesso à justiça.
Anteriormente, Wendy Figueroa, diretora da RNR (Rede Nacional de Refúgios), explicou que, dentro do Programa para a Prevenção e Detecção das Violências Feminicidas e a Atenção às Suas Causas, no qual os refúgios foram integrados, foi destinado um montante de 856,782 milhões de pesos. No entanto, ela enfatizou que não há detalhamento que garanta quanto desse valor será realmente alocado para os Refúgios e Centros de Atenção Externa. Apesar das insistências da RNR para estabelecer diálogo com Sheinbaum, ainda não obtiveram resposta.





