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Papa Francisco ordena abertura dos polêmicos arquivos secretos do papa Pio XII

O anúncio do Papa Francisco I da abertura dos arquivos abre novamente uma das chagas da história recente da Igreja Católica
Bernardo Barranco V
La Jornada

Tradução:

O Papa Francisco volta a ser notícia. Decidiu a abertura dos arquivos do pontificado de Pio XII. Esta abertura será efetivada em 2 de março de 2020. O Papa se dirigiu aos 75 funcionários do Arquivo Secreto do Vaticano, dizendo que a data escolhida é “exatamente um ano depois do 80º aniversário da eleição de Eugênio Pacelli ao trono de Pedro”. 

Os documentos abarcam desde 2 de março de 1939 até sua morte em 9 de outubro de 1958. Francisco defende Pio XII e destaca seu período histórico: “um dos momentos mais tristes e obscuros do século XX, agitado e em sua maior parte desgarrado pela Segunda Guerra Mundial… Sua figura já tem sido pesquisada e estudada em muitos aspectos, às vezes discutidos e inclusive criticados (se poderia dizer que com algum preconceito ou exagero) mas hoje em dia é reavaliada oportunamente e, ainda mais, é colocada sob a luz justa por suas qualidades multifacetadas: sobretudo pastorais, mas também teológicas, ascéticas e diplomáticas”.

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A Pio XII se questionam seus silêncios e excessiva prudência diante no nazismo e seu antissemitismo, e se reprova seu dissímulo diante dos horrores do Holocausto. 

O que são os arquivos secretos do Vaticano? Trata-se de um enorme acervo documental que constitui um dos centros de pesquisa mais importantes do mundo. Não se sabe bem quantos títulos existem, fala-se de mais de 160 mil documentos e mais de 650 fundos de arquivos diferentes, uma extensão de uns 85 quilômetros lineares de textos empilhados; para dar uma ideia física, seria o equivalente à distância entre o Zócalo da cidade do México ao centro de Cuernavaca.

O anúncio do Papa Francisco I da abertura dos arquivos abre novamente uma das chagas da história recente da Igreja Católica

Vaticano
Por que é polêmica a figura de Pio XII?

A história desses arquivos é complexa e acidentada: invasões, destruições, apropriações, repatriação de acervos. O texto mais antigo é do século VIII e a partir do século XII a documentação é regular, mas o leque histórico compreende quase 800 anos da história ocidental, principalmente da Europa. O acesso ao arquivo é difícil, só se permite a pesquisadores e historiadores de prestígio cujas instituições que os respaldem sejam reconhecidas. Exige-se um nível acadêmico de mestrado ou doutorado e só se acessa tematicamente, ou seja, ninguém pode andar explorando textos nem estantes. Seu uso é muito restrito e supervisionado zelosamente.

Por que é polêmica a figura de Pio XII? Eugenio Pacelli (1876- 1958), clérigo romano, com altos cargos no Vaticano. Foi secretário de Estado do Papa Pio XI (1857-1939) e núncio na Alemanha, entre outros cargos. A comunidade judaica tem mantido uma atitude crítica diante de sua aparente passividade em relação à Alemanha nazista antissemita. Sua gestão como núncio e como condutor da Igreja Católica durante a Segunda Guerra Mundial, continua sendo motivo de polêmica, principalmente no que diz respeito à reação morna diante dos crimes do regime nazista na Europa contra judeus e comunistas. 

O anúncio do atual Papa abre novamente uma das chagas da história recente da Igreja. Francisco reivindicou o papel de Pio XII e afirmou não temer o julgamento da história. No entanto, torna a surgir o discernimento crítico sobre a atuação titubeante de Eugenio Pacelli desde a ascensão dos nazistas até a conflagração mundial. O reproche central é que ele não se comprometeu explicitamente contra o genocídio judeu e guardou polêmico silencio, chamado de silencio de Pio XII. 

A polêmica atravessou os três últimos pontificados. Recordemos que no marco do Grande Jubileu 2000 do papa João Paulo II, ele formulou um conjunto de perdões, como no caso de Galileu, das Cruzadas, da Conquista e da marginalização das mulheres. Também pediu perdão ao povo judeu no documento Recordemos: uma reflexão sobre a Shoah (holocausto), que foi divulgada em 16 de março de 1998. O texto reconhece que muitos católicos rechaçaram o holocausto, também admite que “a oposição espiritual e as ações concretas de outros cristãos não foi a que se houvesse esperado dos crentes em Cristo”. Houve muitas reações e se desataram expressões fortes tanto de judeus como dos próprios católicos.

O segundo momento polemico foi o processo de beatificação de Pio XII impulsionado por Bento XVI em 2008. A oposição à beatificação foi contundente. No entanto, vieram dos próprios meios eclesiásticos católicos, especialmente dos setores progressistas, os mesmos que condenam o conservadorismo de Pio XII, que chegava aos extremos do rançoso e raivoso anticomunismo católico que fomentou posteriormente na chamada guerra fria. Ou seja, a tese consiste em que ante o temor pelo avanço comunista, visualizou a Alemanha nazista, toda poderosa no final de década de 1930, como a força emergente mais potente, capaz de deter e enfrentar o comunismo bolchevique, o inimigo antagônico da Igreja. Francisco se arrisca hoje reivindicando o papa Pio XII. Estarão lá todos os arquivos?

*Publicado originalmente em La Jornada – México


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Bernardo Barranco V

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