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Jornalista se demite após censura a reportagem sobre ataque químico na Síria

Tareq Haddad, da Newsweek, anunciou no Twitter que, para não aceitar a proibição imposta, estava se afastando de seu emprego na revista de Nova York
Alan Macleod
Opera Revista Independente
São Paulo (SP)

Tradução:

Um importante jornalista se demitiu após seus editores censurarem uma reportagem sua sobre as revelações bombásticas de que a Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPAQ) teria suprimido provas que sugeririam que o ataque de armas químicas de Douma em 2018 foi encenado.

Tareq Haddad, da Newsweek, anunciou no Twitter que, para não aceitar a censura imposta de cima para baixo sobre um assunto tão importante, estava publicamente se afastando de seu emprego na revista de Nova York.

“Eu coletei provas de como eles alteraram a matéria, além de evidências de outro caso em que informações inconvenientes para o governo dos EUA foram ocultadas, apesar de factualmente corretas”, disse Haddad, acrescentando que, em breve, publicará todos os detalhes sobre o episódio. “Fui ameaçado com uma ação legal por meus empregadores”, que haviam inserido uma cláusula de confidencialidade em seu contrato para ocasiões como essa.

Ele também afirmou que está buscando aconselhamento jurídico de especialistas em denúncias: “Publicarei as provas que tenho sem divulgar informações confidenciais”.

Tareq Haddad, da Newsweek, anunciou no Twitter que, para não aceitar a proibição imposta, estava  se afastando de seu emprego na revista de Nova York

MintPress News
É raro que o mundo consiga ver um caso tão explícito como esse de fracasso do mito de imprensa livre e independente.

Ele também afirmou que está buscando aconselhamento jurídico de especialistas em denúncias: “Publicarei as provas que tenho sem divulgar informações confidenciais”.

Silêncio na Síria

A notícia chocante de que a OPAQ alterou seu relatório para culpar o governo sírio por um ataque com armas químicas que, de acordo com seus próprios especialistas investigadores, provavelmente nem sequer aconteceu, foi amplamente ignorada pela mídia corporativa, mas não pela MintPress News, que cobriu as denúncias em profundidade.

Os integrantes da equipe da OPAQ se manifestaram, expressando sua “maior preocupação” com a “representação seletiva dos fatos” e seu “viés intencional”, “minando a credibilidade do relatório”. Até o ex-diretor geral da OPAQ, Dr. José Bustani, declarou que os testemunhos dos denunciantes “confirmaram as dúvidas e suspeitas” que ele já tinha sobre a organização e a Síria.

O suposto ataque com armas químicas foi imediatamente usado como justificativa para uma intervenção estrangeira no conflito. Em questão de dias, os EUA, a França e o Reino Unido lançaram campanhas de bombardeios no país, arriscando um potencial conflito nuclear com a Rússia com grande aprovação da mídia corporativa. Nenhum dos 100 principais jornais americanos em circulação se opôs a essas ações extremamente precipitadas.

Tareq Haddad: Não é um jornalista comum

Haddad é um repórter raro no cenário de mídia corporativa atual; alguém que insiste em cobrir assuntos importantes, como o relatório da OPAQ, assassinatos de cidadãos pela polícia e o tratamento recebido por Julian Assange. Ele também foi literalmente o único jornalista em todo o espectro da grande mídia a cobrir a surpreendente notícia de que um executivo-sênior do Twitter foi desmascarado como oficial de operações psicológicas do Exército britânico, trabalhando em um batalhão de propaganda e guerra online, algo que a MintPress News cobriu, mas o New York Times, CNN, Fox News, CNBC ou qualquer outro veículo nacional não.

Entrevistei Haddad em outubro a respeito do escândalo no Twitter para a Fairness and Accuracy in Reporting e The Canary, perguntando a ele por que essa história não era manchete de primeira página, devido à preocupação com a interferência estrangeira on-line que domina o ciclo de notícias corporativas há anos. Ele minimizou a possibilidade de malícia, sugerindo, talvez ingenuamente, que toda a imprensa dos EUA tenha ignorado o caso porque ele havia sido revelado por uma pequena mídia britânica.

Haddad se portou como alguém que não era abertamente político, mas era simplesmente um raro crédulo nos mitos clichês do jornalismo sobre “falar a verdade” e “investigar os poderosos com ela”, alegando que os editores sempre apoiariam os jornalistas que se opunham ao governo, desde que agissem com retidão. Uma declaração irônica, dada a notícia recente.

Ele revelou que a cobertura da saga das armas de destruição em massa, na qual a mídia se recusou a ser cética em relação às alegações do governo Bush, foi a centelha que o fez querer se tornar um repórter. Desde então, ele mantém um admirável ceticismo em relação aos poderosos.

Se Haddad sabia exatamente dos riscos que estava assumindo ou se estava pulando alegremente todos os “terceiros trilhos” intocáveis do jornalismo moderno (como Assange, o caso do Twitter ou o relatório da OPAQ), inconsciente do perigo em que estava, é algo discutível. Todavia, é raro que o mundo consiga ver um caso tão explícito como esse de fracasso do mito de imprensa livre e independente.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Alan Macleod

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