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Solução de conflito na Líbia permitiria ao país aumentar produção petroleira

Declaração final de 55 pontos aponta entre outras coisas, da criação de um comitê militar, do qual fariam parte cinco delegados de cada parte em conflito
Antonio Rondón
Prensa Latina
Moscou

Tradução:

O conflito na Líbia passou pela plataforma de negociações em Berlim para dar à solução desta crise uma dimensão internacional, tanto pelas partes envolvidas como pelos temas relacionados com a nação norte-africana.

A Líbia se transformou em um verdadeiro polígono de confronto de interesses geopolíticos e econômicos que envolvem não apenas a dezena de nações participantes na recente conferência internacional de Berlim, como também outros jogadores que desta vez preferiram ficar à margem.

O encontro na capital alemã reuniu ali o presidente russo, Vladimir Putin, e seu equivalente turco, Recep Tayyip Erdogan, autores de uma iniciativa tomada em Istambul para apelar às partes em confronto na Líbia para que ponham fim aos enfrentamentos armados.

Como já afirmou o próprio Putin, a convocação de Istambul deu origem a uma reunião em Moscou, sob os auspícios dos ministros de Assuntos Exteriores e de Defesa da Turquia e da Rússia, para mediar negociações sobre uma trégua entre as partes beligerantes no país norte-africano.

Isso criou condições favoráveis para a realização do fórum de Berlim, para o qual, por insistência da Rússia, foram convidados o primeiro ministro do Governo de Conciliação Nacional, Faraz Al Sarraj, e o chefe do chamado Exército Nacional Líbio, general Falij Haftar.

Embora Haftar tenha deixado Moscou sem assinar um acordo de cessar fogo, pediu tempo para consultar as tribos que o apoiam no confronto.

Em Berlim, embora na maior parte do tempo Haftar e Al Sarraj estivessem ausentes, foram aprovados vários acordos, inclusive o reforço e o cumprimento do embargo de armas imposto à Líbia; também foi aprovado um plano para a solução do conflito naquela nação.

Declaração final de 55 pontos aponta entre outras coisas, da criação de um comitê militar, do qual fariam parte cinco delegados de cada parte em conflito

Prensa Latina
A Líbia se transformou em um verdadeiro polígono de confronto de interesses geopolíticos e econômicos

Comitê de monitoramento

Foi criado ainda um comitê para o monitoramento da implantação do que foi pactuado na capital alemã e as partes em confronto foram chamadas a desarmar-se ou, do contrário, proposta sua integração paulatina aos órgãos de segurança do estado líbio, embora muitos duvidem de sua existência.

Da mesma forma, foi criado um mecanismo para a recuperação econômica da Líbia, algo em que poderiam estar interessados países como a própria Alemanha e a China, não tendo tido esta uma delegação de alto nível no fórum, mas que, segundo afirmam especialistas, está envolvida em projetos econômicos.

A isso se acrescenta uma declaração final de 55 pontos adotada ao final da conferência, onde se fala, entre outras coisas, da criação de um comitê militar, do qual fariam parte cinco delegados de cada parte em conflito.

Este comitê militar se encarregaria de cooperar com a ONU para garantir uma trégua estável na Líbia e para permitir um intercâmbio de opiniões entre os beligerantes que leve ao fim do derramamento de sangue, à recuperação da vida pacífica e à criação de um estado de direito.

A reunião de Putin e Erdogan no quadro do fórum, segundo especialistas, foi um dos episódios da conferência mais diretamente relacionados com o tema do confronto, o que não parece casual, pois a Líbia aparece como um polígono político, para onde confluem muitos interesses.

O jornal Vzglyad (Olhar) calcula que a conferência de Berlim deu um pequeno passo para resolver o problema líbio, mas um passo gigante em seu aspecto internacional para mostrar um crescimento do mundo multipolar e uma época pós-estadunidense.

Os ataques da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) contra a Líbia, em 2011, foram feitos com a total liderança de Washington e depois de uma manipulação de resoluções do Conselho de Segurança da ONU. O assassinato de Muamar Kadafi também foi promovido pela Casa Branca.

No entanto, agora a solução de um conflito que é consequência direta da situação de instabilidade criada no país norte-africano pelos ataques da OTAN, resolve-se de forma coletiva, em um esquema em que os Estados Unidos parece ser apenas mais um participante.

Por outro lado, por trás de cada parte em conflito existem fatores além daqueles que participam dos combates diretamente. Assim, de acordo com o jornal Nezavisimaya Gazeta, as forças de Haftar tomaram o porto Zutin, por onde saem as exportações de petróleo.

A Nezavisimaya Gazeta afirma, ainda, que o general líbio mandou congelar o abastecimento dos terminais petrolíferos de leste, o que reduziu a produção diária em 800 mil barris, para deixar a produção total em 1,3 milhões, o que provocaria perdas de 55 milhões de dólares diários.

Segundo especialistas, embora o ENL domine muitos campos petrolíferos, o dinheiro das vendas vai para a National Oil Corporation (NOC), com sede em Trípoli, de onde o interesse de Haftar por controlar a principal cidade líbia.

Tais processos põem em condições difíceis todos os esforços destinados a obter o fim total das ações bélicas.

Meios de imprensa russos destacam que o Governo de Conciliação Nacional tem o apoio direto da Turquia, Arábia Saudita, Egito e Emirados Árabes Unidos, enquanto recebe ajuda militar estadunidense, passando por cima de proibições contidas no mencionado embargo.

A Nezavisimaya Gazeta afirma que chegaram a Trípoli sistemas antiaéreos estadunidenses MINI-23 Hawk e AN/MPQ-64 Sentinel, velhos, mas funcionando, capazes de destruir aviões de combate e drones do ENL.

Ao mesmo tempo, Catar parece apoiar as forças de Haftar, enquanto nas imediações, Ancara situa Moscou como a parte capaz de convencer as forças do general a sentarem-se para negociar, embora a Rússia insista em que mantém o diálogo com todas as partes.

O vetor energético

Publicações russas comentam que a solução do conflito na Líbia, em toda sua extensão, permitiria uma acomodação da economia deste país que poderia aumentar sua presença no mercado petrolífero e recuperar sua produção de 1,8 milhões de barris diários, como antes de 2011.

De fato, a Líbia, com reservas de petróleo de 41.500 milhões de barris, as maiores da África, e de um trilhão e 505 bilhões de metros cúbicos (posto 22 no mundo) poderia ser ponto de partida de dutos, através do Mediterrâneo, para a Europa, avaliam especialistas.

Certamente, no mercado energético europeu, para o qual a Rússia envia cerca de 100 bilhões de metros cúbicos anuais e para o, qual se abrem novas vias, como a Torrente Turca e a inacabada Torrente norte 2, além da via ucraniana, passam a competir outros atores.

A Turquia já pôs em funcionamento o gasoduto transcaucásico Tanad, que por enquanto vem do Azerbaijão, enquanto Israel prepara uma jazida de gás que levará esse combustível até o Egito, com pretensões de alcançar a Europa.

O próprio Egito dispõe agora de uma jazida no Mediterrâneo que também pode ser considerada na concorrência pelo mercado europeu.

Estas circunstâncias parecem pesar sobre as decisões que se buscam para pôr fim ao conflito líbio.

Mas também existem outras, mencionadas pelo presidente russo, como a explosão do tráfico de pessoas para a Europa, que gerou o caos surgido, depois do assassinato do líder líbio e a atomização do conflito, e o aparecimento ali de preocupantes focos de grupos terroristas.

Além do extremista Estado Islâmico, outras forças ativas na Síria parecem transferir-se agora para a nação norte-africana, como denunciou recentemente o ministro interino russo de Assuntos Exteriores, Serguei Lavrov.

Assim, a Líbia aparece como um polígono para onde confluem interesses internos das partes beligerantes, regionais e geopolíticos que dão uma dimensão internacional à solução desse conflito armado.

*Antonio Rondón, Correspondente chefe do Escritório em Moscou de Prensa Latina.

**Prensa Latina, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

***Tradução: Beatriz Cannabrava

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Antonio Rondón

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