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Participação dos EUA na fracassada tentativa de invasão da Venezuela é inquestionável

Novo cenário resultante da operação mal sucedida pode ser usado como pretexto para uma ação militar direta dos EUA contra a Venezuela, alertam analistas
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

O governo de Donald Trump rechaça ter participado de maneira “direta” na falida intervenção armada contra a Venezuela, mas não há dúvida de que a mão de Washington deixou seus rastros por todo o cenário do crime.

Desde que surgiram os detalhes de uma operação anunciada pelo ex-sargento de forças especiais estadunidenses, Jordan Goudreau – veterano das guerras no Afeganistão e no Iraque e diretor de uma empresa de segurança privada na Flórida, chamada Silvercorp USA -, no domingo, 3 de maio, destinada ao fracasso antes de ser lançada, o governo de Donald Trump negou sua participação. 

Na terça-feira, 5 de maio, Trump afirmou que o operativo “não tem nada que ver com o nosso governo”. Um dia depois, o secretário de Estado, Mike Pompeo, afirmou que “não houve nisso nenhum envolvimento direto do governo dos Estados Unidos”. 

Mas o vínculo de Goudreau com alguns personagens ligados diretamente, e pessoais com Trump e a revelação de que a operação foi elaborada por figuras em Miami com extensos contatos com o governo estadunidense, e que foi aprovada inicialmente pelo homem de Washington em Caracas, Juan Guaidó, deixam especialistas sem dúvidas de que embora agências governamentais não estavam encarregadas, é quase impossível que não soubessem de sua existência há meses.  

Novo cenário resultante da operação mal sucedida pode ser usado como pretexto para uma ação militar direta dos EUA contra a Venezuela, alertam analistas

Brasil247
Pompeo, Maduro e Guaidó

Jogo de palavras

Fulton Armstrong, acadêmico do Centro para Estudos Latino-americanos e Latinos da American University e ex-Oficial de Inteligência Nacional para a América Latina (analista de mais alto nível da comunidade de inteligência) entre 2000 e 2004 e no Conselho de Segurança da Casa Branca, e também analista sobre América Latina do Comitê de Relações Exteriores do Senado, comentou que  “quando Pompeo teve que dizer que os Estados Unidos não estavam ‘diretamente envolvidos’, deixou claro que estávamos indiretamente envolvidos”.  

Em entrevista a La Jornada, Armstrong disse que Washington havia dado todas as indicações de que aprovaria uma tentativa de golpe e, portanto, “não se pode dizer que não fomos responsáveis – nós estabelecemos o marco para o que ocorreu”. 

Armstrong indica que quando o governo de Trump apoia explicitamente a mudança de um regime, empapa a oposição com dinheiro, qualifica de “narcoterroristas” altos funcionários do governo venezuelano e até anuncia uma recompensa de 15 milhões de dólares pela cabeça de Nicolás Maduro e outra de 10 milhões por outros líderes desse governo, está convidando para operações como a que foi realizada na semana passada.

“Os Estados Unidos deram os incentivos para esse tipo de operação”, sublinhou, e “embora tudo indique que essa operação não foi dirigida por Washington, tudo também indica que foi aprovada ali”. 

Novo cenário é ainda mais explosivo

Assinala que agora, essa conjuntura, posterior à aventura fracassada, talvez seja a mais perigosa. “Agora há um pretexto para a ação militar direta pelos Estados Unidos, ao qualificar aos militares estadunidenses detidos como ”reféns” – com os seis executivos da Citgo com dupla nacionalidade em prisão domiciliar na Venezuela”.  

Pompeo afirmou há uma semana que “usaremos todas as ferramentas que temos disponíveis para tentar” resgatar os estadunidenses.  

Armstrong recorda que já estão posicionadas forças navais estadunidenses no Caribe para a suposta operação “antinarcóticos” anunciada por Trump em 1º de abril, depois de apresentar acusações por “narcoterrorismo” contra o governo de Maduro.

Outros observadores coincidem em que parte do governo de Trump – sobretudo as agências de inteligência, a DEA e outros – terão que haver sido inteirados do complô. Um veterano observador comentou a La Jornada que se for verdade, então “deveriam ser despedidos” por não fazer seu trabalho, sobretudo porque a operação foi revelada ao público dois dias antes de ser lançada em uma reportagem da agência AP. 

Consenso em Washington

Ao mesmo tempo, ninguém em Washington oculta o objetivo republicanos e democratas de provocar uma mudança de regime na Venezuela. O governo de Trump declarou “ilegítimo” o governo de Maduro, selecionou Guaidó como representante desse país, o qual tem sido elogiado repetidamente pelas lideranças de ambos partidos em Washington, e deixou sobre a mesa a “opção militar” desde 2017. “Maduro tem que ir embora”, reiterou Pompeo depois de negar a mão de seu governo nesse operativo para sequestrar o presidente. 

Mas por ora, não se sabe quem e quando sabia de tudo. O deputado federal democrata Eliot Engel, que preside o Comitê de Assuntos Exteriores da câmara baixa, solicitou essa informação do Departamento de Estado há mais de uma semana e ainda não recebeu resposta. “O Congresso necessita respostas… Necessitamos saber que leis estadunidenses foram violadas por cidadãos e empresas estadunidenses e se algum elemento do governo estadunidense sabia o que estava acontecendo”, escreveu Engel como presidente do comité.  

Acrescentando que também se requer informação sobre se foram exportadas armas estadunidenses, e “sobre as reuniões nos Estados Unidos de cada um dos empreiteiros de segurança privada relacionados a um assalto potencial na Venezuela, e… se o governo de Trump sabia dessas interações”. 

Novo fracasso de Guaidó

Talvez tenha sido em parte por estas investigações, com o dano político a Guaidó ao ser vinculado ao fracasso espetacular deste operativo, que na segunda-feira tenham renunciado os assessores do venezuelano em Miami, JJ Rendón e o legislador exilado Sergio Vergara.

Rendón foi quem negociou com Goudreau e aprovou com Guaidó, por telefone da Venezuela, um contrato oferecendo mais de 200 milhões de dólares se conseguisse derrocar Maduro, mas ele contou há alguns dias, que pouco depois, em novembro de 2019, rompeu a relação com o estadunidense. 

Rendón é amplamente conhecido por seus laços latino-americanos, renunciou ao cargo de chefe de estratégia da campanha de reeleição do presidente colombiano Juan Manuel Santos quando foi acusado de receber propinas de traficantes de drogas e já havia sido apontado como parte de uma operação cibernética no México em favor da campanha do PRI. em 2012 – Rendón disse que trabalha há anos para candidatos do PRI

Rendón es ampliamente conocido por sus nexos latinoamericanos, renunció como jefe de estrategia de la campaña de reelección del presidente colombiano Juan Manuel Santos al ser acusado de recibir sobornos de narcotraficantes, y antes señalado como parte de un operativo cibernético a favor de la campaña del PRI en 2012 -Rendón ha dicho que ha trabajado a favor de candidatos priístas durante años 

David Brooks, correspondente de La Jornada em Nova York, 13 de maio.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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