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Coronavírus, queda no preço do petróleo e ocupação estrangeira: os desafios do Iraque

O recém instalado governo iraquiano enfrenta questões angustiantes dentro de um sistema político criado por invasores e agora à beira do colapso
Armando Reyes Calderín
Prensa Latina
Líbano

Tradução:

O recém instalado governo do Iraque enfrenta desafios angustiantes, alguns imediatos e outros nem tanto, dentro de um sistema político criado por invasores e ocupantes, e agora à beira do colapso.

Para o recém empossado primeiro ministro Mustafá al-Kazemi, a faina parece um corrida costa acima pelas dificuldades de manobrar entre demasiados equilíbrios sectários e étnicos, sem uma base real de poder.

Qualquer decisão do ex chefe da Inteligência iraquiana tem que ser pesada e ser de uma precisão absoluta para não favorecer ou prejudicar nenhum dos três grupos mais relevantes no Parlamento, muçulmanos sunitas, muçulmanos xiitas e curdos.

Pela falta de um apoio próprio, al-Kazemi deve navegar entre essas três forças políticas em um exercício similar a caminhar sobre uma corda bamba.

Ao longo dos últimos 17 anos, foi ineficiente a suposta distribuição equitativa de cargos e postos entre grupos sectários e étnicos; isso, ao contrário, propiciou corrupção, clientelismo político, venalidade na cúpula governante e mais pobreza.

O país árabe quase desapareceu com Daesh (acrônimo em árabe para Estado Islâmico), que arrasou a pouca infraestrutura que sobreviveu a invasores e ocupantes de uma coalizão internacional liderada pelos Estados Unidos.

Acumularam-se numerosos problemas desde essa intervenção estrangeira que derrubou o presidente Saddam Hussein.

Os desafios mais importantes são a pandemia da Covid-19, a permanência ou não de forças estrangeiras no país, a queda estrepitosa do preço do petróleo e a corrupção.

O recém instalado governo iraquiano enfrenta questões angustiantes dentro de um sistema político criado por invasores e agora à beira do colapso

Prensa Latina
O recém empossado primeiro ministro Mustafá al-Kazemi

Pandemia e negociações com os EUA

A pandemia exige uma solução urgente, porque ameaça o valor mais importante, a vida. Assim como a comunidade internacional, o Iraque foi surpreendido pela mortal doença com pouca preparação.

Pior ainda, porque anos de guerra, de manifestações, de enfrentamentos étnicos e de Daesh, causaram uma deterioração de instalações, escassez de equipamentos e de pessoal médico que tem um desempenho fraco frente à doença.

O Diálogo Estratégico Estados Unidos-Iraque, que Bagdá prefere descrever como negociações sobre o acordo acerca do estatuto das forças estadunidenses (SOFA, em inglês), é outra questão fundamental.

A data para retomar as negociações sobre este pacto, feito em 2011, foi fixada para 10 de junho, e Washington encarregou de sua condução o subsecretário de Estado para Assuntos Políticos, David Hale.

Do lado iraquiano, ainda não há um ministro de Relações Exteriores para o diálogo.

No alinhamento governamental de al-Kazemi, ao qual o Parlamento deu seu voto de confiança, não foram ocupados sete cargos, dos 22 do Executivo, entre eles os de Petróleo e Relações Exteriores.

Essas negociações podem vir a ser muito complicadas devido às prerrogativas que os Estados Unidos, como potência quase ocupante, conseguiram dos Governos que colocaram no poder desde 2003.

Soberania e relações com o Irã

Bagdá aspira a uma maior soberania, em especial depois das tantas violações que o Pentágono cometeu e comete em território iraquiano.

Essa tendência a livrar-se das tropas estrangeiras, sobretudo das estadunidenses, acentuou-se depois do assassinato do general iraniano Qassem Soleimani, perpetrado pela força aérea do país do norte.

Depois desse ato deliberado de violência e arrogância, o Parlamento adotou uma resolução não vinculante para expulsar por completo os militares estrangeiros.

Al-Kazemi propõe-se a ressaltar a soberania iraquiana, conforme prometeu em seu discurso de posse como primeiro ministro.

O SOFA é um assunto chave de Washington, que insiste em tornar o Iraque um posto avançado para lançar ataques e operações contra o Irã, o que a nação árabe não está disposta a aceitar.

Petróleo e corrupção

Outro desafio para o novo governo iraquiano inclui a debacle do mercado do petróleo.

O petróleo representa 90% dos ingressos iraquianos provenientes das exportações.

Se os preços do barril continuarem em um nível como o atual, as dificuldades econômicas do país árabe continuarão aumentando e as manifestações iniciadas em 1º de outubro último recobrarão intensidade, apesar do perigo de contágio pela Covid-19.

Alguns dizem que preferem morrer pela pandemia do que de fome.

Por último, a corrupção, um mal endêmico na maioria dos Estados no Oriente Médio, no Iraque converteu-se em um fenômeno social que perturba o público em geral.

Ouvem-se queixas por todos os lados, mas pouco se faz para encontrar uma solução.

Talvez tivessem que voltar às proibições emitidas há quase quatro mil anos, com castigos severos sugeridos pelo Código do rei da Babilônia e depois, da Mesopotâmia, Hammurabi.

A este monarca se deve um grande passo na humanidade, separação de Estado e religião, que agora voltam a unir-se com as distribuições estabelecidas em uma Constituição reescrita pelos invasores de 2003.

Um exemplo de até que ponto está arraigado esse flagelo, foi dado no século XVI pelo poeta Fuzuli, que se queixou em uma de suas obras dizendo: “Eu os saudei. Mas não aceitaram minha saudação, alegando que não era um suborno”.

Al-Kazemi e seu Governo talvez não consigam desarraigar esta sórdida prática, mas certamente vão tentar.

Armando Reyes, Correspondente de Prensa Latina no Líbano.

Prensa Latina, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

Tradução: Ana Corbusier


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Armando Reyes Calderín

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