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Trump ameaça usar força militar contra civis para conter manifestações nos EUA

Em declarações na Casa Branca, o comandante em chefe ordenou a governadores e prefeitos a “dominar as ruas” diante das revoltas ocorridas ao longo da última semana
David Brooks
Diálogos do Sul
Nova York

Tradução:

Donald Trump declarou hoje que empregará a força militar contra cidadãos deste país para suprimir as expressões massivas – e em grande parte pacíficas – de dissidência, ao proclamar-se “o presidente de lei e ordem”.

Em declarações na Casa Branca, o comandante em chefe ordenou a governadores e prefeitos a “dominar as ruas” diante das revoltas ocorridas ao longo da última semana. “Se uma cidade ou estado se recusa a tomar as ações necessárias para defender a vida e a propriedade de seus residentes, então eu enviarei os militares dos Estados Unidos e resolverei rapidamente o problema por eles”, advertiu.

Trump indicou que empregará sua autoridade sob a Lei de Insurreição de 1807, que estabelece que o presidente pode usar força militar para suprimir insurreições, desordem civil e rebelião. Mas, imediatamente, especialistas legais disseram que o lei estabelece que o Executivo só pode usar essa lei se os governadores solicitaram, e vários deles – incluindo os de Nova York, Maryland e Illinois- rechaçaram essa opção esta noite. 

Em declarações na Casa Branca, o comandante em chefe ordenou a governadores e prefeitos a “dominar as ruas” diante das revoltas ocorridas ao longo da última semana

Reprodução: flickr
Donald Trump declarou que empregará a força militar contra cidadãos estadunidenses

Enquanto o presidente falava, forças federais – Serviço Secreto, polícia militar e até forças montadas a cavalo – procederam logo a reprimir com gases lacrimogêneos e balas de borracha centenas de manifestantes que haviam se expressado de maneira pacífica durante horas nas proximidades da Casa Branca, tudo parte de um ato coreografado de Trump.  

Ao concluir seus comentários, saiu da Casa Branca à pé rodeado por seguranças e com helicópteros sobrevoando, para caminhar por uma quadra pelo Parque Lafayette -passando por onde minutos antes foram expulsos com força os manifestantes – para posar às câmeras na frente da histórica Igreja de São João com uma bíblia na mão. Depois de uma foto sozinho, convidou seu procurador geral Bill Barr e outros oficiais – todos brancos – a se colocarem ao seu lado para mais fotos. 

Poco depois, a bispa episcopal de Washington, Mariann Edgar Budde, que supervisiona essa igreja, declarou-se “indignada”, repudiou o ato como “um abuso de símbolos sagrados” e “antiético a tudo o que representamos”, condenou o uso de força para expulsar manifestantes dos arredores da igreja e denunciou que a Casa Branca não avisou da visita. 

Trump, em suas breves palavras no Jardim de Rosas responsabilizou “anarquistas profissionais” e “Antifa” dos protestos “violentos” que “golpearam selvagemente pessoas inocentes” e disse que porá fim “agora mesmo” a esses atos. 

A frase “presidente de lei e ordem” é a consigna usada por Richard Nixon para sua eleição em 1968.  

Horas antes, Trump investiu contra governadores em uma teleconferência onde – segundo uma gravação filtrada aos meios – lhes disse que “têm que prender pessoas… Têm que dominar. Se não dominam estão perdendo tempo – eles vão os atropelar, vão ser visto como um grupo de imbecis”. Em outro momento disse: “é um movimento. Se não o esmagam, será cada vez pior. O único momento em que têm êxito é quando vocês são débeis, a maioria de vocês é débil”. 

Enquanto isso, uma autópsia independente por solicitação da família de George Floyd concluiu -diferentemente à do forense oficial do condado – que o homem afro-estadunidense “morreu por asfixia que levou à falta de circulação de sangue o cérebro”, causado pelo joelho do policial branco sobre o seu pescoço em Minneapolis. A família da vítima solicitou pôr fim aos saques e outros atos de violência.

A ira nas ruas

No sétimo dia de protestos em massa contra a violência racista oficial e a brutalidade policial detonado pelo assassinato de Floyd na segunda-feira passada, mobilizações massiva geralmente pacíficas continuaram por todo o país, desde Oakland a Nova York, de Minneapolis a Nashville, de Portland a Birmingham e Filadélfia entre dezenas mais com ativistas afirmando que não se cansarão de protestar para que haja uma mudança real e justiça plena no caso de Floyd.

Após uma noite marcada por incidentes violentos, no domingo, entre alguns grupos de manifestantes e as autoridades, saques e mais, apesar de medidas de controle, incluindo toques de recolher, intensificou-se o debate tanto entre manifestantes como figuras políticas sobre as táticas e o uso de violência contra policiais e propriedades.  

Em Nova York, o governador Cuomo e o prefeito Bill De Blasio anunciaram pela primeira vez um toque de recolher – quase todas as outras principais cidades do país já o haviam feito no fim de semana – para a noite de segunda-feira depois de enfrentamentos e saques nas zonas do Soho y e no Brooklyn.  

A filha do prefeito esteve entre as detidas pouco depois que seu pai insistiu que grande parte dos mais tumultuosos não eram residentes da cidade. Cuomo declarou que se incrementaria o número de policiais na noite de 4 mil a 8 mil e que contemplaria ativar a Guarda Nacional se isso não fosse suficiente (disse isso antes das apalavras de Trump).

Em Washington, os protestos se tornaram cada vez mais conflitivos na noite e madrugada de segunda-feira, com vários incêndios em edifícios e estruturas ao redor do parque em frente a Casa Branca; o Serviço Secreto e a polícia municipal defendera o perímetros da sede presidencial e finalmente empregaram gases e explosões de luz e som para despejar a zona. Pela primeira vez na memória, a Casa Branca ficou na escuridão ao serem apagadas todas as luzes da parte que dá para as grades principais da Avenida Pennsylvania, e o presidente manteve silêncio diante do público.

Enquanto isso, circulam palavras de mais de meio século atrás que outra vez são contemporâneas, como as do reverendo Martín Luther King, que afirmou: “os distúrbios são a linguagem dos não escutados” e que em 1967 explicou que “o verões de distúrbios de nossa nação são causados pelos invernos de demora de nossa nação. E, enquanto a América posterga a justiça, estamos na posição de ter essas recorrências de violência e distúrbios uma e outra vez. A justiça social e o progresso são os garantes absolutos de prevenção de distúrbios”. 

Mais de 5.600 pessoas foram presas em todo o país desde que os protestos eclodiram, segundo uma contagem da AP – com Nova York e Los Angeles com os números mais altos. 

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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