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ToggleA incursão e um grupo armado na região russa de Belgorod, fronteiriça com a Ucrânia, na segunda-feira (22) pela manhã terminou na noite desta terça-feira, quando seu governador, Viacheslav Gladkov, levantou o regime especial de operação antiterrorista, depois que o Ministério da Defesa da Rússia reportou que “o exército matou todos os terroristas ucranianos”.
O porta-voz da presidência russa, Dmitry Peskov, expressou a preocupação do Kremlin pelos fatos em Belgorod: “Sem dúvida, o que sucedeu ontem (segunda-feira) é motivo de grande preocupação. Isto confirma uma vez mais que os terroristas ucranianos continuam sua atividade contra nosso país, o que requer maiores esforços de nossa parte para que no futuro não se produza esse tipo de incursão”.
Ao mesmo tempo, Peskov comentou que o presidente Vladimir Putin não vai convocar uma sessão extraordinária do Conselho de Segurança, que se leva a cabo todas as sextas-feiras.
Em sua entrevista coletiva diária, o general Igor Konashenkov, o porta-voz oficial da dependência castrense, asseverou que “os grupos armados nacionalistas foram rodeados e eliminados. Foram liquidados mais de 70 terroristas ucranianos” e o resto (não especificou quantos) tiveram que fugir ao território do país vizinho onde a aviação e a artilharia russa continuaram bombardeando-os “até eliminar todos”.
Como prova das afirmações de Konashenkov, o serviço de imprensa do ministério da Defesa difundiu à noite um breve vídeo que mostra quatro veículos blindados e várias caminhonetes (o general apontou que eram cinco no total), virados e com impactos de projéteis, mas todos estavam vazios e tampouco havia cadáveres nos arredores.
Konashenkov não proporcionou detalhes sobre quantos integrantes puderam cruzar a fronteira. Moscou classificou o grupo de “unidade de sabotadores ucranianos” – e Kiev sustenta que são “patriotas” russos inconformados com a política do Kremlin que formam parte dos grupos Legião Liberdade para Rússia e Corpo de Voluntários Russos.
E o que mais indigna o setor favorável à “operação Militar especial” é a facilidade com que os “sabotadores” ingressam à Rússia através de Graivoron, onde a fronteira supostamente devia estar fechada, sobretudo em tempos de guerra, vigiado por reservistas sem experiência.
A crítica mais dura à cúpula castrense – nas redes sociais que se converteram no meio mais eficaz, em condições de censura militar, para transmitir opiniões diversas da versão oficial –, proveio de Yevgueni Prigozhin, dono do grupo Wagner, o qual sintetizou com sua peculiar forma de falar: “o que está se passando é a falta de direção e o saque dos recursos públicos. No lugar de dedicar-se a fortalecer a segurança dos Estados, uns roubam o dinheiro e outros se fazem de idiotas. Não há direção, não há desejo nem tampouco indivíduos que queiram defender seu país”.
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Detalhes do grupo armado
Sobre o grupo armado que cruzou nesta segunda-feira a fronteira da Ucrânia na região russa de Belgorod e se identificou como parte das chamadas Legião Liberdade para Rússia e Corpo de Voluntários Russos, dizem ser formado por cidadãos russos inconformados com a política do Kremlin, de acordo com os vídeos que seu porta-vozes subiram às redes sociais para pedir o apoio da população e explicar que “chegou a hora de lutar com as armas na mão contra o regime de (o presidente Vladimir) Putin”.
Uma dessas organizações, a Legião Liberdade para Rússia, pediu à população que não saia de suas casas e não tenha medo: “Não somos inimigos seus. Diferentemente dos zombies de Putin, nós não prejudicamos os civis e não os utilizamos para nossos fins”, sustentam em um comunicado através de seu canal no Telegram, que tem cerca de 160 mil inscritos.
As autoridades russas atribuíram a incursão a uma “unidade de sabotadores do exército ucraniano”. O governador da região, Viacheslav Gladkov, decretou “o regime de operação antiterrorista” que inclui “restrições provisórias com o fim de garantir a segurança dos cidadãos”, que vão de medidas mais estritas de revisão de documentos de identificação das pessoas e dá veículos, ao fechamento das fábricas que requerem usar explosivos e substâncias perigosas de tipo radioativo, químico e biológico.
Leia mais: Rússia: Ameaça da Ucrânia de “matar russos em qualquer parte do mundo” terá resposta
O funcionário apontou que não há “pânico” entre os habitantes e que “não está prevista sua evacuação”, embora reconheceu que alguns decidiram ir embora por conta própria”, enquanto nesta segunda-feira circularam numerosos vídeos de caravanas de ônibus abandonando as localidades que se encontram – a 60 quilômetros da cidade de Belgorod – na zona potencial de perigo, principalmente Graivoron, onde está o quartel da guarda de fronteiras, Glotovo, Kozinka e Gora-Podol.
“No distrito de Graivoron, entrou um grupo de sabotadores do exército ucraniano. As forças armadas da Rússia junto com a guarda de fronteiras e o FSB (sigla do Serviço Federal de Segurança) estão adotando as medidas necessárias para liquidar o inimigo”, escreveu pela noite o governador no Telegram.
A agência noticiosa oficial TASS identificou a Aleksei Levkin como um dos membros da “unidade ucraniana de sabotadores”. Nas redes sociais são mencionados outros dois: Kiril Kanajin e Aleksei Dolgov. Os três são russos.
Gladkov fez um balanço preliminar de 8 feridos entre a população e assegurou que não houve nenhum morto.
Dmitry Peskov afirmou: “entendemos perfeitamente o objetivo deste tipo de sabotagem: distrair a atenção do que aconteceu em Bakhmut, minimizar o efeito político da perda por parte da Ucrânia de Artemovsk (nome anterior de Bakhmut)”.
Kremlin
Dmitry Peskov: "Terroristas ucranianos continuam sua atividade contra nosso país"
Rechaçou a acusação, em representação do governo ucraniano, Mikhaylo Podolyak, que indicou nas redes sociais que “observamos com muito interesse o que está passando na região de Belgorod na Rússia e estudamos a situação, mas nada temos a ver”.
Por sua vez, o porta-voz do serviço de inteligência militar da Ucrânia, Andriy Yusov, explicou que a partir de território ucraniano entraram em Belgorod “cidadãos russo que pretendem criar uma certa faixa de segurança para proteger a população civil ucraniana”.
Houve informação contraditória sobre eventuais combates. Assim, para dar um exemplo do caos informativo que impera nesta guerra, o enviado do canal Rossiya-1 da televisão pública russa, Aleksandr Sladkov, reportou que “dizem que entraram tanques do exército ucraniano em Belgorod, um disparate”, em alusão à premissa do canal de notícias Grey Zona, ligado ao império midiático de Yevgueni Prigozhin, dono do grupo de mercenários Wagner, que “após analisar os vídeos do inimigo” assevera que “se viu entrar um tanque T-72, carros blindados e um caminhão com infantaria (não especificou se do exército ucraniano ou dos comandos russos contrários ao Kremlin”.
E o canal Rybar, vinculado ao ministério da Defesa, deu sua própria versão: “Junto com imagens reais de combates em Graivoron (os ucranianos) difundiram vídeos falsos (de seu exército) que mostram um tanque com o propósito de semear o pânico entre a população civil da zona fronteiriça”.
O Ocidente não quer negociar
Os Estados Unidos e seus aliados, ao armarem e financiarem a Ucrânia, só buscam como “objetivo final destruir a Rússia como país”, declarou nesta terça-feira o secretário adjunto do Conselho de Segurança, Dmitri Medvedev, ao canal de televisão RT.
Em sua opinião, “não há com quem falar no Ocidente” porque seus líderes “não estão preparados para o diálogo”. Para o também ex-presidente da Rússia, as tentativas de negociar resultaram em “perda de tempo e esforços em vão” porque “não querem paz, querem guerra”.
Agregou que “não querem cooperação, querem confrontação. Tentam por todos os meios conter nosso país”, mas enfatizou que não o conseguirão.
Medvedev advertiu que o fornecimento da Ucrânia de armas cada vez mais sofisticadas aumenta o risco de um conflito nuclear: “Em algum momento os acontecimentos podem se tornar completamente imprevisíveis, e se for assim a responsabilidade recairá por inteiro na aliança norte-atlântica”.
Ameaça para a Rússia e outros países
O programa biológico dos Estados Unidos com fins militares é uma ameaça para a segurança da Rússia e de outros países, na opinião do vice-chanceler russo, Serguei Riabkov.
“Vemos esses experimentos, em particular os que se levam a cabo no espaço pós-soviético, como uma ameaça direta à segurança nacional da Rússia e de outros países, sobretudo aqueles onde se instalam os laboratórios”, indicou o diplomata em um comunicado difundido pela Chancelaria.
Washington usa a “assistência epidemiológica” como fachada para espalhar seus laboratórios por todo o mundo, nos quais desenvolve um “perigoso” programa biológico com fins militares sem nenhum escrutínio, segundo Riabkov.
Seguem sem resposta as inquietações da Rússia acerca desse programa, denunciou o vice-chanceler russo, e exortou a Comunidade internacional a fortalecer a Convenção para a proibição de desenvolvimento, produção e armazenamento de armas bacteriológicas e tóxicas e sobre sua destruição, conhecida por seu acrônimo CABT.
O que se passa em Bakhmut
Enquanto os russos celebram a conquista de Bakhmut como uma “grande vitória” depois de quase dez meses de reduzir a ruínas esta cidade que tinha 70 mil habitantes, chegando ao extremo de equipará-la em alguns programas da TV pública com a tomada de Berlim em 1945, os ucranianos continuaram negando nesta segunda-feira, pela boca da vice-ministra de Defesa, Hanna Malyar, a qual assegurou que “a batalha (por esta cidade) não terminou”.
Tudo depende, na opinião de especialistas militares, de como se queira ver essa batalha.
Por um lado, o grupo Wagner, depois de meses de infrutuosos assaltos, pôde içar a bandeira russa após cair o último edifício multifamiliar que o exército ucraniano defendia, da mesma forma que já havia feito muito antes ao chegar à sede da prefeitura. E por outro, agora o exército russo terá que manter o núcleo urbano de Bakhmut sem controlar os flancos dos arredores, o que implica o risco de acabarem rodeados pelas tropas ucranianas, que já têm em suas mãos o norte e o sul, a partir de onde poderão bombardear a cidade, invertendo os papéis dos meses recentes.
Chama a atenção que no que deveria ser seu momento de maior glória, Prigozhin, o magnata que financia os Wagner, mercenários que os distintos porta-vozes oficiais da Rússia chamam de “unidades de assalto”, tenha anunciado que do 25 de maio ao 1º de junho, “uma vez cumprida a missão de liberar Artemovsk (como os russos chamam Bakhmut usando sua denominação da época soviética)”, deixarão a localidade às tropas regulares.
Irônico, advertiu em sua conta de Telegram: “Se o ministério de Defesa não conta com suficientes efetivos (para defender Bakhmut), com os milhares de generais que há se pode formar um regimento de puro general, dar um fuzil a cada um e problema resolvido”.
Preocupação pela central atômica de Zaporíjia
Pela sétima vez desde que começou a guerra em fevereiro de 2022, a central atômica de Zaporíjia, sob controle da Rússia, ficou nesta segunda-feira durante mais de cinco horas sem transmissão de eletricidade de alta tensão a partir do território ucraniano até que puderam ser usados geradores a diesel para resfriar os reatores.
“A desconexão desta manhã (de segunda-feira) de todas as fontes externas de fornecimento elétrico mostra a grande vulnerabilidade da segurança nuclear na central atômica de Zaporíjia. Como disse em outras ocasiões, esta situação não pode voltar a se repetir, estamos brincando com fogo. Temos que agir sem demora para evitar uma mais que real ameaça de acidente nuclear na Europa com tudo o que implica para a população e o meio ambiente”, declarou Rafael Grossi, chefe do Organismo Internacional de Energía Atómica (OIEA).
O funcionário, citado pelas agências noticiosas, exortou a restabelecer o quanto antes o funcionamento das linhas de reserva de fornecimento elétrico – em 1º de março ficou danificada a última linha desse tipo localizada na margem direita do rio Dnieper– e exigiu de novo que se permita aos inspetores da OIEA aceder à subestação fronteiriça, que antes gerava eletricidade para a central atômica, solicitação declinada até a presente data apesar das numerosas promessas do Rosatom, o consórcio russo a cargo da central de Zaporíjia.
Juan Pablo Duch | La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.
Tradução: Beatriz Cannabrava.
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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