Pesquisar
Pesquisar

Apoiadores de Trump pedem linchamento de promotora negra dos EUA

Ameaças contra juristas e autoridades que investigam o ex-presidente republicano têm se intensificado nos EUA
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

É onipresente e incessante o espetáculo político de Trump, e para muitos analistas de um amplo leque ideológico, ameaça nada menos que o próprio sistema democrático eleitoral dos Estados Unidos, mais uma vez. 

“Sua perseguição não é uma caça às bruxas. É a defesa da nossa democracia”, resumiu o reconhecido intelectual político, professor em Berkeley e ex-secretário do Trabalho, Robert Reich.

Nenhum outro ex-presidente foi formalmente acusado antes de cometer crimes, muito menos sujeito a quatro processos criminais – duas das quais têm a ver com tentativas de descarrilar o processo eleitoral e inclusive tentar um golpe de Estado – que contêm um total de 91 acusações criminais; nenhum mandatário havia sido sujeito ao impeachment duas vezes durante sua estadia na Casa Branca, e nenhum outro presidente foi declarado culpado de violação sexual, ações ilegais de contabilidade para encobrir pagamentos para silenciar uma atriz pornô, nem acusado por várias mulheres de importunação sexual.

Continua após o banner

E isso não inclui seu recorde de mentiras e falsidades documentadas, seu apoio implícito e explícito a organizações de ultradireita, incluindo agrupações nazistas, nem seu constante esforço para nutrir a violência racial e anti-imigrantes, sobretudo contra o México quando estava na Casa Branca até agora como parte central de sua mensagem de campanha eleitoral.     

Com isso, a próxima eleição já não é um concurso político, nem uma contenda entre dois partidos e seus candidatos, mas sim um espetáculo, e isso é justamente como deseja o acusado Donald Trump. Mas não se podem prognosticar as consequências dessa estratégia, e por ora Trump tem uma citação para entregar-se pessoalmente, uma vez mais, às autoridades no condado de Fulton, na Geórgia, antes de 25 de agosto.

Leia também: Ex-membro da Casa Branca adverte: Trump pode levar EUA a guerra civil em 2024

Sua equipe de advogados se manterá muito ocupada nos próximos dias. Enquanto isso, o processo judicial federal sobre sua tentativa de descarrilar o processo eleitoral prossegue com uma próxima audiência marcada para 28 de agosto. 

O jogo agora para o acusado é como utilizar os processos judiciais, que buscam que o ex-mandatário preste contas por uma série de delitos amplamente documentados para fins políticos, culminando em um retorno triunfal à Casa Branca, onde não descarta um auto indulto e com isso evitar o que para qualquer outro acusado dos mesmos delitos implicaria anos em prisão. 

Ameaças contra juristas e autoridades que investigam o ex-presidente republicano têm se intensificado nos EUA

Foto: John Pemble/Flickr
Trump continua dominando a disputa entre republicanos para a nomeação como candidato do partido

Quando se anunciou a quarta acusação criminal formal contra Trump, no último dia 14, em Atlanta, Geórgia, por tentativas de descarrilar a eleição presidencial nesse estado, o acusado decidiu responder com algo que historicamente tem funcionado neste país (embora se pensaria que no século 21 já tivesse passado de moda) ao alegar que os acusadores são anti-estadunidenses e proclamar-se o patriota que resgatará este país. 

“O comunismo finalmente chegou a nossas costas”, declarou em uma mensagem às suas bases agregando que “este lugar é uma ditadura marxista encabeçada por um tirano incompetente, mas corrupto”. Junto com isso, Trump reiterou que todos esses processos são parte do um complô esquerdista, e que os promotores, os juízes, o Departamento de Justiça e o governo de Joe Biden são os verdadeiros inimigos dos Estados Unidos. “A Justiça e o império de lei estão oficialmente mortos na América”, proclamou, afirmando que esta acusação é o quarto ato de “interferência eleitoral” dos democratas para “encarcerar seu maior opositor”.

Leia também: Trump engrossa discurso fascista e promete caça a imigrantes e “comunistas” se eleito

Concluiu que “eu não entregarei o nosso país a estes tiranos radicais que buscam destruí-lo” e advertiu que “o destino da nossa nação está em jogo na eleição de 2024. Não é só minha liberdade que está em risco, mas sim a de vocês – e eu não deixarei que eles tirem isso de ninguém”. 

Com isso, Trump mais uma vez busca mobilizar seus fanáticos e está funcionando. As notícias de quinta-feira (17) dizem que as autoridades investigam ameaças contra integrantes do grande júri que aprovou as acusações contra Trump e 17 de seus sócios no processo judicial na Geórgia, enquanto seus seguidores enviaram ameaças, incluindo apelos para que a promotora Fani Willis e os integrantes do grande júri sejam linchados (com toda a carga racista vista no Sul, dado que a promotora é afro-estadunidense). Neste mesmo mês, uma mulher foi detida no Texas por ameaças contra a juíza federal Tanya Chutkan, encarregada do julgamento contra Trump em Washington.

Continua após o banner

Alguns especialistas comentam que talvez o caso mais perigoso para Trump é o da Geórgia, onde já está acusado sob leis estaduais, e não federais. Mesmo que um presidente republicano ou o próprio Trump ganhe a eleição, não teria autoridade para anular uma condenação, como tampouco o governador do estado. 

Mas por ora, o espetáculo fora dos tribunais está funcionando, fazendo com que Trump cumpra exitosamente seu objetivo de manter-se no centro do círculo noticioso quase todos os dias. Segundo as pesquisas mais recentes, continua dominando a disputa entre republicanos para a nomeação como candidato do partido, com a média das principais pesquisas calculadas pela Real Clear Polítics colocando o ex-presidente com uma vantagem de 39,9 pontos sobre os outros 10 pré-candidatos anunciados. Na pesquisa mais recente da AP/NORC divulgada na quarta-feira (16), o ex-mandatário goza de um apoio de 63% entre os republicanos.

Leia também: Republicanos rejeitam evidências de golpe e engolem ideia de “caça às bruxas” a Trump

Talvez a próxima prova dessa estratégia seja no primeiro debate entre os pré-candidatos republicanos marcado para o próximo 23 de agosto, em Milwaukee. Embora não se saiba se Trump se apresentará ou não nesse evento, em pessoa ou não, será o centro da atenção. Vários dos outros candidatos não têm mais que esperar que em algum momento algo sucederá para provocar uma queda catastrófica de quem é, por ora, o rei republicano. 

No entanto, embora Trump domine seu partido, isso não se traduz no eleitorado em geral. Na mesma pesquisa da AP/NORC, a maioria dos estadunidenses (53%) afirma que definitivamente não apoiará Trump) outros 11% disseram que provavelmente não o fariam; 43% disse o mesmo de Biden. Não é nada, mas tampouco é muito.

David Brooks e Jim Cason | La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.
Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

Assista na TV Diálogos do Sul


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

LEIA tAMBÉM

Modelo falido polarização geopolítica e omissão de potências condenam G20 ao fracasso (2)
Modelo falido: polarização geopolítica e omissão de potências condenam G20 ao fracasso
Rússia Uso de minas antipessoais e mísseis Atacms é manobra dos EUA para prolongar conflito
Rússia: Uso de minas antipessoais e mísseis Atacms é manobra dos EUA para prolongar conflito
Após escalar conflito na Ucrânia com mísseis de longo alcance, EUA chamam Rússia de “irresponsável”
Após escalar conflito na Ucrânia com mísseis de longo alcance, EUA chamam Rússia de “irresponsável”
Misseis Atacms “Escalada desnecessária” na Ucrânia é uma armadilha do Governo Biden para Trump
Mísseis Atacms: “Escalada desnecessária” na Ucrânia é armadilha do Governo Biden para Trump