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ToggleEm 14 de maio de 1948, o nascimento de uma entidade chamada Israel marca o ponto de partida, não apenas de um ano trágico, mas também de uma etapa histórica — um caminho de perversão que já ultrapassa sete décadas desde aquele fatídico 1948.
Um holocausto do povo palestino que não cessa, que continua representando os crimes mais execráveis e perversos de uma ideologia como o sionismo. Dotado de características racistas, supremacistas e de uma conduta baseada em autodenominar-se como povo eleito, cujo território de conquista, afirmam, lhes foi concedido por uma divindade com vocação de promotor imobiliário, capaz de entregar terras onde um povo milenar está assentado com sua rica cultura, como é o caso do povo palestino.
Falo do regime nacional-sionista israelense, a esta altura considerado o mais criminoso surgido nos últimos 80 anos, desde o fim da Segunda Guerra Mundial (SGM), e que no mesmo dia de sua aparição na arena internacional deu início ao que, em árabe, se denomina Al Nakba — a catástrofe — que implicou no assassinato em massa, na expulsão de 800 mil palestinos de suas terras ancestrais, na destruição de aldeias e povoados, e na ocupação das grandes cidades, situando a entidade israelense como um análogo ao Terceiro Reich alemão.
Mesmo a Organização das Nações Unidas (ONU), tão relutante em adotar políticas que ultrapassem a mera denúncia e avancem para ações que impliquem, por exemplo, na aplicação da carta fundacional desta instituição, que, em seu capítulo VII, obrigaria a punir o ente criminoso israelense por ser uma ameaça à paz e por promover agressões e violações do direito internacional, especialmente mediante o artigo 42 deste capítulo (1). Essa ONU, por meio de seu Comitê Especial de Descolonização sobre as práticas israelenses nos territórios ocupados, declarou, no último dia 9 de maio, que “o que estamos presenciando contra o povo palestino poderia muito bem ser outra Nakba” (2).
O organismo, palavra por palavra, considerou que “Israel continua infligindo um sofrimento inimaginável às pessoas que vivem sob sua ocupação, ao mesmo tempo em que amplia rapidamente a apropriação de terras como parte de suas aspirações coloniais mais amplas e continua perpetrando assassinatos em massa e indiscriminados de civis, desaparecimentos forçados, limpeza étnica e a total submissão daqueles que vivem sob seu sistema de ocupação e apartheid… O que estamos presenciando poderia muito bem ser outra Nakba.”
Segundo o referido Comitê, os testemunhos recolhidos em campo, nestes meses de genocídio contra a população de Gaza, evidenciam que o uso de tortura e de outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes — incluindo violência sexual — constitui uma prática sistemática do Exército sionista e de suas forças de segurança, tanto o Shin Bet (Shabak) quanto o Mossad. Uma prática de torturas e abusos sexuais generalizada nas prisões e campos de detenção militares do nacional-sionismo.

Auschwitz e Gaza: uma mesma realidade
O Comitê afirma: “Os métodos utilizados pelo regime israelense se leem como um manual sobre como humilhar, rebaixar e infundir medo nos corações das pessoas; primeiro vem o assédio sexual, os toques indevidos nas partes íntimas, depois os abusos sexuais, em seguida as ameaças de estupro e, por fim, o estupro propriamente dito, inclusive o estupro em grupo — uma prática que se espalhou por todo o país.”
O Comitê indicou ainda que a visita ocorreu enquanto o governo de Israel continua aplicando um bloqueio total à ajuda destinada a Gaza, “transformando o direito à alimentação em uma arma. É difícil imaginar um mundo em que um governo aplique políticas tão depravadas para matar de fome uma população, enquanto caminhões com alimentos estão a apenas alguns quilômetros de distância. No entanto, essa é a doentia realidade dos habitantes de Gaza”: uma política de fome, com os alimentos sendo utilizados como arma de guerra.
A Palestina vive um genocídio, um calvário nas mãos daqueles que um dia se consideraram vítimas e usufruíram do que se denominou Shoá (3) e que hoje são carniceiros, algozes, cruéis, bestas pardas. Um holocausto com uma característica inegável: não terminou, está mais presente do que nunca. E, mais ainda, elevou seus níveis de perversão, ao ponto de adotar políticas de solução final, ao estilo daquelas planejadas na Conferência de Wannsee pelos hierarcas nazistas em 20 de janeiro de 1942 (4).
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Neste início do sexto lustro do século 21, assistimos, no plano internacional, à consolidação da impunidade como norma de conduta, no que diz respeito à recusa em cumprir o direito internacional. E isso, de maneira contumaz, por uma das entidades mais terroristas que a história da humanidade já conheceu: o regime nacional-sionista israelense.
Efetivamente, a 77 anos da Al Nakba, a 58 anos da Guerra de junho de 1967 e a 32 anos do que foi a fraude dos Acordos de Oslo, devemos acrescentar 19 anos de um bloqueio brutal contra a Faixa de Gaza, aos quais se soma a política intensificada de genocídio, principalmente contra este enclave, desde 7 de outubro de 2023, que significou o assassinato de 55 mil palestinos, 70% deles mulheres e crianças. Foram 150 mil feridos e a destruição de 80% da infraestrutura de Gaza: hospitais, escolas, universidades, mesquitas, igrejas cristãs, fábricas, casas, ruas, estradas e infraestrutura viária.
Uma Faixa de Gaza cujo solo recebeu, em 19 meses desde a “Tormenta de Al Aqsa”, o equivalente em bombardeios ao lançamento de 5 bombas nucleares sobre Hiroshima (100 mil toneladas de explosivos). Nem mesmo na Guerra do Vietnã se viu tamanha barbárie realizada contra um enclave territorial de 360 quilômetros quadrados, onde viviam 2,3 milhões de habitantes. Como dado comparativo, os aliados, na Segunda Guerra Mundial, lançaram 4 mil toneladas de bombas sobre a cidade alemã de Dresde, que foi destruída até seus alicerces.
Segundo dados fornecidos pela Revista Médica Britânica The Lancet, as vítimas palestinas, desde 7 de outubro até a elaboração do documento (em julho de 2024), quando a agressão já havia assassinado 35 mil pessoas, estimava, aplicando um cálculo conservador de quatro mortes indiretas para cada morte direta, que não era inverossímil considerar que o número de mortos chegava a 186 mil — dois terços deles mulheres e crianças (5).

Com essa política de crimes de guerra e contra a humanidade, o ente infanticida israelense demonstrou ser uma máquina criminosa. Um regime predador que não deixará de ocupar o território palestino, a não ser pela força da razão e da ação da Palestina e de seu povo. Bem como pelo trabalho daqueles que acreditamos na justiça, ainda que ela se exerça com todas as formas de luta contra o terrorismo institucionalizado desde a criação da entidade sionista.
Terror desde as origens
O regime nacional-sionista judeu-israelense surge de recomendações e determinações arbitrárias, no contexto do peso na consciência de uma comunidade internacional que quis, por meio da proposta de partição da Palestina — documento utilizado de forma interessada pelo sionismo como base legal, a Resolução nº 181, de novembro de 1947 (6) — ceder o que não lhe pertencia, tentando assim apaziguar sua responsabilidade frente aos crimes do nacional-socialismo alemão.
Essa conduta significou fazer o povo palestino pagar pelas consequências de uma guerra europeia, levada a cabo por interesses hegemônicos de potências ocidentais. Um povo palestino submetido a um Holocausto desde 1948, sem ter qualquer relação com os crimes cometidos pelo Terceiro Reich alemão. E, nesse processo, com um sionismo que, instrumentalizando a religião judaica, passou de vítima a sociedade algoz. E falo de sociedade, pois 99% da população israelense é partidária desse genocídio, sendo parte integrante do racismo e supremacismo vigentes.
A 77 anos da Al Nakba, fica claro que ela continua. Israel não deixará de ocupar os territórios usurpados da Palestina, tanto na Cisjordânia — onde existem 800 mil colonos paramilitares em assentamentos ilegais — quanto na Faixa de Gaza, onde promove deslocamento forçado, expulsão e extermínio da população palestina. Tudo isso cercado por um muro de 720 quilômetros de extensão.

Um ente criminoso como o sionismo continuará violando todas e cada uma das resoluções emanadas de organismos diversos como as Nações Unidas, seu Conselho de Segurança, a Assembleia Geral, a Unesco ou qualquer outra entidade que costume exigir — sem qualquer resultado — o fim de sua política criminosa contra o povo palestino. Um Israel que seguirá aferrado à sua política colonialista, racista e criminosa e que nos permite, com justa razão, defini-lo como um regime nacional-sionista.
Como não definir a entidade sionista como um regime terrorista, uma sinistra imitação do regime nazista, se cada uma de suas ações assim o demonstra desde o início do seu processo de assentamento na Palestina, no final do século 19? Provas não faltam: protegeu seu processo de colonização anterior a 1948 com a atuação de gangues armadas como a Haganá. Esse movimento realizava ações armadas contra a população palestina e, posteriormente, com apoio britânico, formou uma força de ataque composta por 50 mil milicianos que concretizou o nascimento da entidade patibular em maio de 1948. Um movimento paramilitar que participou de crimes de guerra, expulsando centenas de milhares de palestinos de suas terras ancestrais.
Genocídio palestino: entre a cruel impotência humana e o colapso do sistema internacional
Uma cisão da Haganá, o chamado grupo Irgún, fundado pelo sionista ucraniano Zeev Jabotinsky, tornou-se uma das organizações mais violentas em terras palestinas, assassinando tanto a população local quanto funcionários e soldados britânicos. Do Irgún surgiu outro movimento terrorista, o grupo Stern, também conhecido como Lehi, fundado pelo sionista polonês Abraham Stern, que morreu crivado de balas enquanto se escondia de seus captores em um armário. Stern foi substituído por aquele que viria a ser primeiro-ministro israelense, o bielorrusso Yitzhak Shamir. Todas essas organizações, sem qualquer escrúpulo moral, utilizaram o terrorismo como prática cotidiana. Foram a base, o DNA terrorista do atual exército de ocupação israelense.
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A união desses grupos, junto ao apoio britânico em assessoria, homens e armas, permitiria que, em 14 de maio de 1948, em uma ação coordenada entre o sionismo dirigido pelo líder de origem polonesa David Ben Gurion (cujo nome verdadeiro era David Grün) e as autoridades britânicas – que encerravam seu Mandato nesse mesmo dia – fosse proclamado o nascimento de uma associação de caráter delituoso que surge na contramão dos direitos da população palestina e com seu claro repúdio. Os países árabes vizinhos, como era de se esperar, entraram em guerra contra as forças israelenses e contra essa entidade que nasceu artificialmente no concerto internacional.
Notas
- Carta das Nações Unidas, Capítulo VII: Ação em caso de ameaças à paz, ruptura da paz ou atos de agressão. Se o Conselho de Segurança considerar que as medidas previstas no Artigo 41 possam ser inadequadas ou tenham se revelado ineficazes, poderá empreender, por meio de forças aéreas, navais ou terrestres, a ação necessária para manter ou restabelecer a paz e a segurança internacionais. Tal ação poderá incluir demonstrações, bloqueios e outras operações realizadas por forças aéreas, navais ou terrestres de Membros das Nações Unidas (artigo 42) https://www.un.org/es/about-us/un-charter/chapter-7
- https://news.un.org/es/story/2025/05/1538651
- Shoá. Literalmente “Catástrofe” em hebraico, termo utilizado para se referir ao que comunicacionalmente se denominou como holocausto, e que serviu para aquilo que o analista estadunidense de origem judaica Norman Finkelstein denominou de “a Indústria do Holocausto”.
- Conferência realizada em 20 de janeiro de 1942, em Wannsee, nos arredores de Berlim, entre políticos, burocratas e militares nazistas, onde se planejaram questões operacionais do que viria a ser chamado de “solução final judaica”. A Conferência de Wannsee gerou enorme debate dentro da sociedade israelense sobre o alcance desse encontro e se realmente nele foi discutido o tema do extermínio dos judeus europeus, o que culminaria no chamado genocídio executado pelo nacional-socialismo. Para nosso objetivo de associar essa conferência ao Plano Dalet, resulta evidente que esse plano sionista, elaborado antes da criação da entidade sionista em 14 de maio de 1948, também falava, assim como em Wannsee, de “diminuição natural da população palestina”, “tratamento adequado para sionizar a Palestina”, e “diferentes formas de solução”, expressas na destruição de aldeias e povoados palestinos, deportação de sua população, substituição de nomes árabes por hebraicos, demolição das casas pedra por pedra, reescrita da história milenar do povo originário e na fantasia de mitos fundacionais baseados em dois contos que pertencem mais ao universo da Marvel do que a provas históricas sérias: um povo eleito ao qual foi prometida uma terra. https://rebelion.org/la-conferencia-de-wannsee-verdad-y-mito/
- https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(24)01169-3/fulltext
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* Imagens na capa:
– Vítimas do holocausto em campo de concentração de Auschwitz em maio de 1944: Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos
– Vítimas palestinas em Gaza em abril de 2025: Hosny Salah / Pixabay