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ToggleO Brasil teve um ciclo de ouro no século 18 que criou uma plutocracia de governança local no Brasil e em Portugal, enriqueceu os membros da corte e financiou a revolução industrial na Inglaterra. Esse modelo adotado na colônia se eternizou.
A cada nova fronteira mineral aberta no país se vive um novo ciclo de ouro.
Nos anos 1980, a Serra Pelada, no sul do Pará, levou para lá uma multidão de garimpeiros, que extraíram 100 quilos de ouro por ano. Ninguém ficou rico e ninguém ficou sabendo para onde foi todo esse metal.
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O ouro parece inesgotável, assim como a cobiça pelo metal. O quadrilátero ferrífero de Minas Gerais, onde no século 18 se deu o ciclo do ouro, continua produzindo. As novas fronteiras se estendem pela Amazônia, Sul e Norte, agora explorado não mais manualmente, mas com máquinas, produzindo um dano ecológico muito maior.
Com a economia paralisada há pelo menos quatro décadas, desemprego estrutural e sem alternativa, o trabalhador vai à cata de ouro, invadindo terras indígenas e reservas florestais. Atrás do garimpeiro vem a grande empresa — 99% delas estrangeiras, a maioria canadense.
A Constituição de 1988 diz que a exploração de minério nas terras indígenas tem que ser amparada por lei aprovada pelo Congresso.
A Lei… ora a lei. Ninguém liga para isso. As maiores vítimas da predação ecológica do garimpo e das mineradoras são as terras indígenas.
Em Jacareacanga, por exemplo, destruíram a sede dos mundurucus e dos ianomâmis, o mesmo acontecendo com a Proteção Ambiental Tapajós, na Vila São José. Na região dos mundurucus, extraem 700 quilos de ouro por mês, 70% através de atividade ilegal, segundo o Greenpeace. Um negócio de R$ 4,5 bilhões por ano.
O ouro no Brasil tem duas fontes: a cata manual — garimpo — e a extração industrial — subterrânea ou a céu aberto — praticadas por grandes empresas.
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Estima-se que de 1500 a 2000 foram extraídos 3 mil toneladas de ouro. Segundo estudo publicado em maio de 2020 pelo Instituto Escolhas, o garimpo corresponde a 20% do total produzido. Isso considerando o que é controlado, mas deve ser muito mais, dado o descontrole do garimpo ilegal.
Entre janeiro de 2015 e maio de 2018, 610 quilos de ouro clandestino foram negociados por R$ 70 milhões, segundo o Ministério Público, e entre 2019 e 2020, com a nova corrida do ouro foram extraídas 85 toneladas de ouro.
Em 2020, o país exportou 29 toneladas de ouro, a maioria de extração ilegal. Com os preços melhores, houve um incremento de 11% na receita alcançando R$ 37 bilhões. A China, em 2019, levou 62% do exportado, em 2020, levou 72%. O país é também um dos maiores produtores.
A tabela, feita pelo Instituto Escolhas, mostra os municípios maiores produtores em 2020, de acordo com o valor da operação, em R$ e a quantidade de dinheiro recolhido pelo Contribuição Financeira sobre Exploração Mineral (CFEM).
Os valores acima são oficiais, ou seja, do mundo legal, não contabilizando o que é a economia informal e ilegal na produção de ouro. Aí as opiniões divergem e vão de 20% até os que estimam que o informal seria o dobro do formal.
Quem é que pega e leva esse nosso ouro?
Pesquisando, descobrimos que todo o ouro do país é produzido oficialmente é por empresas estrangeiras, como revelam os dados de cada um dos municípios produtores.
EcoRed.org
A Constituição de 1988 diz que a exploração de minério nas terras indígenas tem que ser amparada por lei aprovada pelo CongressoOu
1 Paracatu – Canadense Kinross Gold Corporation em Paracatu, Minas Gerais, mina de 110 km², considerada a maior mina de ouro em céu aberto do mundo e, desde 1987, a população local está exposta à intoxicação maciça sem que as autoridades tomem providências.
2 Itaituba – Serabi Gold, dona da Palito Mining e da Coringa Gold Projets, está localizada no Tapajós, em área de 53 mil hectares, com matriz em Londres. A canadense Kenai Resources Ltd., opera nos EUA e no Brasil e quem fez as prospecções para o projeto de ouro São Chico, distrito Jardim do Ouro, região de Tapajós, uma jazida pequena, mas de alto teor, localizada a 30 quilômetros da Mina Palito. A Kenai pertence integralmente à Serabi. Em 2020, foram produzidos um total de 32.003 onças.
3 Sabará – A AngloGold Ashanti é uma empresa sul-africana que veio para o Brasil ainda no tempo em que o apartheid separava, oficialmente, a população africana e negra dos brancos colonizadores. Hoje, opera em mais de 10 países e produz milhões de onças de ouro, equivalentes a 10% da produção mundial. No Brasil, ela assumiu o lugar da inglesa Saint John d’el Rey Mining Co, que explorava a mina do Morro Velho, em São João del Rei, Minas Gerais. Em 2004, houve a fusão entre a Anglo Gold e a Ashanti Goldfields, dando origem à Anglo Gold Ashanti, cuja mina Cuiabá, a mais de mil metros de profundidade, produziu o recorde de 7 milhões de onças. Em 2018, assumiu o controle da Mineração São Bento, em 2012 da Mineração Serra Grande (4 milhões de onças), em Goiás. Em 2019, o país investiu US$ 120 milhões no Brasil.
4 Jacobina – Jacobina Mineração e Comércio Ltda, controlada pela canadense Yamana Gold, explora minas de ouro da Argentina, Brasil, Chile, México e Canadá. Está há 15 anos no Brasil. Na Bahia, explora cinco minas de ouro subterrâneas: Canavieiras, João Belo, Morro do Cuscuz, Morro do Vento e Serra do Córrego. Parte da barragem rompeu afetando a cidade A produção total da empresa, em 2018, foi de 1.041.350 onças equivalentes, incluindo 940.619 onças de ouro e 8,02 milhões de onças de prata. Este ano espera produzir mais de 1,1 milhão de onças de equivalentes de ouro e 120 milhões de libras de cobre este ano com um dos menores custos da indústria.
5 Santa Bárbara – em Minas Gerais, a Mina de Ouro Pilar da Jaguar Mining que também explora o Complexo de Minas de Ouro Caeté (Pilar e Roça Grande e a Planta Caeté) que produz 95 mil onças de ouro, além da mina de ouro Paciência, perto de Belo Horizonte, adquirida da canadense Leagold.
6 Godofredo Viana – pequeno município no Norte de Maranhão, onde opera a Mineração Aurizona, do grupo canadense Equinox Gold. A barragem já rompeu uma vez, alagando e destruindo estradas. Produção 120,000-130,000 oz. Opera minas na Califórnia, EUA e Sonora, no México. No Brasil, além da Aurizona tem a mina de ouro Fazenda, na Bahia com produção de 60,000-65,000 oz., Em Goiás, explora a mina Pilar produzindo 25,000-30,000 oz e em Minas Gerais a RDM com produção de 55,000-60,000 oz. e está em fase de construção da mina Santa Luz, projetada para produzir ~100,000 OZ PER YEAR
7 Crixás – pequeno lugarejo em Goiás possui Operação Serra Grande, complexo com quatro minas, uma das mais rentáveis minas de ouro do país, explorada pela sociedade formada pelo Anglo Gold Ashanti, e a Newinco Comércio Participações, subsidiária da canadense Kinross, que explora ouro em céu aberto em Paracatu, e opera em uma dezena de países das Américas e da África. A AGA se diz a maior produtora de ouro do Brasil e a terceira do mundo. Operam com indústria química, energia e gestão imobiliária. Em Minas Gerais opera duas minas, Cuiabá, em Sabará, e Lamego, em Caeté, e uma planta metalúrgica em Nova Lima e três minas em Santa Bárbara. A produção global da empresa foi de 15 toneladas em 2020, 15% disso no Brasil, equivalente a 1.027 oz. A empresa chegou no Brasil no século 19 como Saint John del Rey Mining Co. em Nova Lima e hoje opera em nove países.
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8 Pedra Branca do Amapari – município no Amapá, onde talvez mais prolifera o garimpo informal, cujo ouro vem sendo explorado pela australiana Beadell Resources, na mina de ouro Tucano comprada em 2003 da Anglo Gold, cuja produção em 2014, a terceira maior do país foi de quase 154.000 onças e 120,000 to 130,000 onças de ouro em 2020. Em Tartarugalzinho, explora o projeto Tartaruga, com recursos auferidos em 337,ooo oz. Em 2019 a Geadell foi adquirida pelo grupo canadense Great Panther Silver Limited, que opera no Brasil, México e Peru. A empresa também produz minério de ferro na região. Aí também opera a britânica Zamin Amapá Mineração que está paralisada, em recuperação. 19 sítios arqueológicos foram classificados como destruídos
9 Peixoto de Azevedo – município ao Norte de Mato Grosso, na Amazônia, já foi responsável por 10% de todo o ouro produzido no país. Terra indígena e de garimpo ilegal. P.A. Gold Mineração e Metalurgia, controlada pela canadense Gold & Silver Mining Industry. Também opera no município a Fides Gold Mineradora S.A, cujo principal projeto é a Mina União, no município de Matupá, que parece ser propriedade brasileira, capitalizada com fundos de investimentos
10 Barrocas – no Nordeste baiano, ouro extraído pela Fazenda Brasileiro Desenvolvimento Mineral Ltda, empresa da Leagold, que explora ouro e prata e comprou essa mina da Brio Gold, que antes comprara da canadense Yamana. Essa mina subterrânea processa mais de mil toneladas por ano. Em 2020, Leia Gold e a Equinox Gold se fundiram, que passou a explorar seis minas nos EUA, México e Brasil e produzindo cerca de 20 toneladas em 2020. No Brasil, pela Equinox, a Mineração Aurizona, Luna Gold Pesquisas, Luna Gold Participações e Luna Gold Investimento e Desenvolvimento Mineral; pela Leagold: Mineração Riacho dos Machados e Pilar de Goiás Desenvolvimento Mineral. A empresa resultante é Equinox, uma das maiores do mundo
Vale anotar que neste primeiro decênio do século 21 a Bahia se destaca como uma nova grande província mineral, atraindo mineradoras do mundo inteiro. Ouro e tálio, de grande valor, níquel, bauxita e ferro. É o maior produtor de urânio, cromo e outros minerais raros.
11 Poconé – no Pantanal de Mato Grosso, há pouco tempo se cavava no chão das ruas para catar ouro. Virou a capital do ouro com tanta gente que bamburrou. Quem leva? O Projeto ouro Lima, a Poconé Mining Co e outro projeto Livramento Gold project, controlada pela canadense Valterra Resource, que explora minas no Canadá e no México.
12 Nossa Senhora do Livramento, nascida de um garimpo perto de Cuiabá, no Mato Grosso. Em outubro de 2019, rompeu a barragem. A V & M Mineração, é responsável por 60% da produção anual de minério de ferro do mercado interno brasileiro. A V & M é uma joint venture entre a francesa Vallourec e a alemã Mannesmann.
13 Pontes e Lacerda, também na Amazônia mato-grossense, zona de garimpo desenfreado, industrialmente explorado pela Apoema Mineração do o mesmo grupo do Mineração Tarauacá, controlada pela canadense Aura Minerals com exploração nos EUA, México e América Central. Aura está iniciando o projeto aurífero Alma no Tocantins. Também explora o projeto Serra da Borda Mineração e Metalurgia, nos municípios de Pontes e Lacerda e Porto Esperidião em Mato Grosso, era da Yamana Gold foi comprada pela Aura em 2016
14 Matupá – Projeto Ouro de Matupá, em Alta Floresta também da Aura Minerals que Já explora Projeto Ernesto Pau-a-Pique também em Mato Grosso, controla a Mineração Apoema, que explora a mina de ouro São Francisco, em Nova Lacerda, Mato Grosso, e a Mineração Vale Verde, na mina Serrote da Laje, em Craíbas, Alagoas. No primeiro trimestre de 2021 a Áurea bateu recorde produzindo 66.782 onças equivalentes de ouro, 68% mais que em 2020 e pretende dobrar a produção até 2024. Em 2020, produziu 205 mil onças e pretende chegar a 400 mil. A Aura Minerals teve lucro líquido de US$ 57 milhões no quarto trimestre de 2020; a receita líquida trimestral foi recorde, de US$ 100 milhões.
15 Riacho dos Machados – Pequeno município no Norte de Minas, Vale do Jequitinhonha, cuja mina de ouro vem sendo explorada pela Leagold Mining, adquirida da também canadense Carpathian Gold que manteve a mina fechada por 12 anos. Nos anos 1990, a mina pertencia à Vale do Rio Doce. Sindicatos e entidades vêm denunciando práticas ilegais como alteamento de barragem e utilização de água de poços artesianos, mas embalde.
16 Conceição do Pará, no Oeste de Minas Gerais, a Mineração Turmalina, da Jaguar Mining, atingiu em 2020 mil metros de profundidade. A Mina de Ouro Turmalina, na região ferrífera, a 130 Km de Belo Horizonte, onde já foi grande produtora de ouro em séculos passados e, até 1983 foi responsável por 40% da produção nacional de ouro. Agora é propriedade da Jaguar Mining Inc, detém a maior área de ouro no quadrilátero ferrífero de Minas Gerais, algo em torno de 26 mil hectares.
17 Novo Progresso – município no Sudoeste do Pará, na Terra Indígena Baú, um dos campeões em garimpo ilegal, a mina Coringa Gold Project, de ouro e prata, da Mineradora Chapleau Exploração Mineral, (registrada como Anfield Gold Corp), que em 2017 foi adquirida pela também canadense Serabi Gold . Vale observar que a maioria dos projetos na Amazônia estão em áreas indígenas.
18 Pilar de Goiás – Cidade tombada pelo Iphan, com pouco mais de dois mil habitantes, com a mina de ouro explorada pelo Brio Gold comprada recentemente pela Leagold Mining, que tem a Yamana como sócia. A Brio explora minas no Brasil e no México. Com a aquisição a produção passa a 400 mil onças por ano.
19 Nova Xavantina, Getúlio Vargas pensou em transferir a capital para essa região na serra do Roncador, onde os bandeirantes descobriram ouro, que hoje está sendo explorado pela NX Gold. A Mina Santo Antônio produz anualmente umas 40 mil onças de ouro e 25 mil onças de prata. Controlada pela canadense Ero Copper, proprietária da Caraíba Mineração que explora três minas de cobre na Bahia (Vermelho, Surubim e Pilar) e no Pará (Carajás).
20 Porteirinha, na árida região Norte de Minas Gerais, nova fronteira para mineração de ferro e ouro, este explorado pela Mineração Riacho dos Machados, do grupo canadense Carpathian Gold. Sindicato dos trabalhadores denunciou alteamento ilegal na barragem de rejeitos de ouro. Capacidade de produzir 8 mil onças de ouro por mês.
O projeto de Mineração Volta Grande, da Belo Sun, canadense, está com problemas com ambientalistas e povos indígenas. Conseguiu uma área de 2.400 hectares em Altamira e três Palmeiras, Sul do Pará, na região do médio Xingu, onde também está o projeto da represa da usina de Belo Monte. Situada na Terra Indígena Trincheira Bacajá, do povo M ̃ebengo Kreo Xikrin.
Paulo Cannabrava Filho, é jornalista e editor da Diálogos do Sul
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