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Peru: O campeonato de corrupção

Jorge Rendón

Tradução:

Três presidentes da República do Peru figuram na lista da Odebrecht, o grande corruptor (que poderia ser também o grande eleitor), com uns 29 bilhões de dólares. Nada mal. Com sua expressão latina, palavras evasivas e sua memória para lembrar o nome dos bancos e os números das contas que significavam presentes, nosso país se perfila, por fim, com alguma possibilidade no grande campeonato mundial desse esporte de ricos e aventureiros.

Jorge Rendón Vásquez*
jorge-rendc3b3n-vc3a1squezTalvez se animem a dizer em defesa própria que a culpa é da Odebrecht.
E se alguém contar a má piada de que vão ser punidos, já podem cair de rir.

Três presidentes da República do Peru figuram na lista da Odebrecht.

Alfonso W. Quiroz, um historiador que fez da corrupção no Peru um tema para investigar (1), recordava que “os vice-reis concediam indultos no dia de seu santo ou de seu aniversário, a uma taxa média de até quatro mil pesos. Ao mesmo tempo exploraram em proveito próprio contratos privados para o fornecimento de pólvora e pagamento das guarnições, além de permitir um tráfico ilícito a certos comerciantes e capitães … todo funcionário, já fosse se alto ou de baixa hierarquia, o clero inclusive, estava obrigado a entregar-lhe obséquios para assim ganhar o favor do vice-rei” …”ao finalizar seu mandato, os corregedores e outras autoridades locais, inclusive os vice-reis, simplesmente subornavam o juiz encarregado da tradicional averiguação oficial para evitar o castigo efetivo”. Era tradicional que os julgamentos de residentes instaurados pelo Conselho de Índias contra os vice-reis e outros altos funcionários do vice-reinado do Peru terminassem com um carinhoso e leve tapinha na bochecha. (Ego te absolvo).
Nesse jogo de policiais e ladrões, os atores têm a quem seguir.
Jorge Juan y Antonio Ulloa, dois súditos espanhóis, escreveram, em mediados do século XVIII, várias denúncias sobre corrupção instalada na idiossincrasia da vida no vice-reino do Peru. Depois de muitos anos de verificar os fatos e redigi-los, encaminhou a seu rei, o soberano de todas as Espanhas. Talvez alguém no Conselho de Índias as tenha lido e, logo arquivado. O rei nunca chegou a se inteirar da existência desses documentos, nem se interessava. Um súdito britânico encontrou um exemplar em Madri e o levou a Londres, traduziu para o inglês e publicou como uma curiosidade. Por isso ficou conhecido.
Sabiam os denunciantes qual haveria de ser o destino de suas obras de investigação que, em muitas de suas partes estão carregadas de indignação? Acreditavam que seu senhor, o soberano de todas as Espanhas, faria alguma coisa para moralizar a seus súditos das colônias? Talvez em algum momento tenham suspeitado ter trabalhado inutilmente, ou talvez se consolassem pensando que algum historiador descobriria sua obra dois ou três séculos depois.
Não puderam imaginar que, consequência da Revolução  Francesa de 1789, o povo herdaria a soberania dos reis e que este novo soberanos herdaria também alguns dos maus costumes de seus antecessores.
Uma delas é sua atitude diante das denúncias de corrupção. Cada unidade deste personagem multitudinário fica sabendo delas pelos escândalos explorados pelos meios escritos e visuais e se sente como o espectador de um circo romano, aplaudindo o leões que comem os gladiadores de outros grupos caídos na arena que não souberam sair airosos da luta.  Assim é. Continuarão amando e louvando a seus preferidos e, claro, votando neles, talvez aguardando a surpresa de alguma novidade que os eleve aos primeiros lugares no campeonato de corrupção já que no futebol o país oferece apenas frustração.
Salvo melhor e mais ilustrada opinião.
[1] Historia de la corrupción en el Perú, Lima, Instituto de Estudios Peruanos, 2013.
 
*Colabora com Diálogos do Sul, de Lima, Peru


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Jorge Rendón Doutor em Direito pela Universidade Nacional Mayor de San Marcos e doutor em lei pela Université de Paris I (Sorbonne)

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