Não surpreende que Israel continue negando o uso de palestinos como escudos humanos na Faixa de Gaza, apesar da sucessão de testemunhos que documentam esse crime — o mais recente sendo o chocante relatório da agência Associated Press, baseado em relatos de palestinos detidos e de ex-oficiais israelenses.
A ironia é que aqueles forçados a entrar em casas suspeitas, desarmados, sob a mira de armas e com câmeras israelenses fixadas em suas cabeças, estavam, naquele momento, em uma rara “liberdade”, pois não tiveram as mãos algemadas nem os olhos vendados, como ocorre em outras situações de detenção. Aquela foi a hora da morte suspensa — não a do alívio.
Esse uso sistemático de civis como ferramentas na batalha — como instrumentos de inspeção de campo e de camuflagem — não é um ato individual ou uma exceção circunstancial, mas uma prática na qual as ordens partem dos “níveis superiores” do exército, segundo o testemunho de um dos oficiais israelenses. O que se revela agora é apenas a ponta do iceberg do que os palestinos vêm sofrendo há décadas, mas cuja gravidade se intensifica com os reconhecimentos internos de soldados e oficiais que foram instrumentos na execução do crime.
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Apesar desses testemunhos, o exército israelense continua a promover uma narrativa falsa, alegando que “o uso de civis como escudos humanos é absolutamente proibido”, como se a realidade da ocupação permitisse qualquer regra ética ou legal de engajamento. Essa negação oficial não inocenta Israel — ao contrário, a condena em dobro. Ela reflete uma insistência em inverter a verdade, enganar a opinião pública global e fugir da responsabilização jurídica.
O que acontece em Gaza não são meros excessos, mas um padrão recorrente de violações que configuram crimes de guerra consumados de acordo com o direito internacional humanitário. Ainda assim, os tribunais internacionais não se moveram com seriedade, e Israel segue impune, porque a comunidade internacional continua a aplicar a justiça de forma seletiva.
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Estamos diante de um novo teste para a consciência do mundo. Permanecerão esses testemunhos como tinta sobre papel nos arquivos dos relatórios jornalísticos? Ou se tornarão o ponto de partida para levar os criminosos aos tribunais internacionais? Sem uma vontade internacional firme, Israel continuará avançando em sua política de impunidade, enquanto o povo palestino segue pagando o preço com seu corpo, sua alma e sua dignidade.

Revelar a verdade não é suficiente — é necessário que ela se traduza em justiça efetiva. Do contrário, o crime de usar palestinos como escudos humanos será apenas mais um elo numa longa cadeia de crimes cometidos sob o silêncio do mundo.
Edição de texto: Alexandre Rocha