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Brad Lander, candidato democrata à prefeitura de Nova York, sendo detido (Foto: Reprodução / X)

Prisão de opositores a Trump alarma política nos EUA; republicanos ameaçam matar manifestantes

Recentemente, Brad Lander, candidato democrata à prefeitura de Nova York, foi violentamente detido por tentar proteger imigrantes; ofensiva vira regra e já atinge senador, prefeito e juíza que se posicionaram contra políticas de Trump

David Brooks, Jim Cason
La Jornada
Washington

Tradução:

Beatriz Cannabrava

Em 17 de junho, forças federais detiveram violentamente Brad Lander, controlador da cidade de Nova York e um dos principais candidatos democratas à prefeitura da maior cidade dos Estados Unidos. A prisão, realizada nos corredores de um edifício do governo, fora de um tribunal migratório e diante de testemunhas e câmeras, foi apenas mais um episódio de uma série de detenções radicais contra políticos opositores ao presidente Donald Trump.

Nos 150 dias em que o magnata está no poder, agentes armados e procuradores federais já haviam detido e algemado um senador federal, o prefeito da principal cidade de Nova Jersey, uma juíza de condado em Milwaukee – contra quem, junto a uma deputada federal, estão movendo um processo penal – além de terem algemado uma assessora de um deputado federal em frente ao seu escritório.

A ameaça de repressão contra manifestantes se concretizou em várias partes do país, algo que se intensificou com o envio de até 4 mil membros da Guarda Nacional e 700 fuzileiros navais a Los Angeles, enquanto o presidente ameaça fazer o mesmo em outras grandes cidades. A polícia local, em várias dessas cidades, também respondeu com golpes, prisões, gás lacrimogêneo e granadas de efeito moral contra os manifestantes. O fato de que os incidentes violentos por parte dos manifestantes foram isolados – cometidos por um número minúsculo entre os milhares que saíram às ruas em protesto – é ignorado pelas autoridades federais, que preferem as imagens de “caos” para justificar suas manobras repressivas.

Brad Lander, preso por defender imigrantes

A detenção de Brad Lander foi denunciada por políticos democratas e líderes cívicos como “mais uma barbaridade” do governo Trump. Porta-vozes do Departamento de Segurança Interna justificaram a ação, acusando formalmente Lander de obstrução e até agressão a agentes federais, enquanto ele acompanhava um migrante em sua audiência num tribunal migratório.

Lander, como outros, estava tentando proteger imigrantes da nova tática dos agentes federais: prendê-los no momento em que comparecem ao tribunal para tratar de seus casos. Quando os promotores desconsideram o processo, os solicitantes de asilo ficam expostos legalmente, o que permite que os agentes efetuem a detenção.

Mas, além de discutir se essa tática é legal ou não, as imagens de um político eleito sendo perseguido por agentes federais mascarados e sem identificação, obrigado a colocar os braços para trás para ser algemado e levado a uma sala de detenção, abalaram os meios políticos do país.

Recentemente, o senador federal da Califórnia, Alex Padilla, foi jogado ao chão e algemado por agentes federais por ousar fazer uma pergunta à secretária de Segurança Interna, Kristi Noem, em Los Angeles. Ao ser liberto algumas horas depois, comentou que, se isso pôde acontecer a um senador federal diante dos olhos do público, “imaginem o que acontece com os trabalhadores migrantes nas ruas e nos campos” durante as operações de repressão.

Não são casos isolados

Esses incidentes, junto à prisão brusca de Ras Baraka — prefeito de Newark, Nova Jersey, por insistir que tinha o direito de observar o que ocorria em um centro de detenção de migrantes em sua própria cidade —, a perseguição penal a uma deputada federal que também estava lá naquele dia, a detenção de uma juíza de condado em Wisconsin — acusada de tentar evitar a prisão de um imigrante — e a detenção de uma assessora do deputado federal democrata Jerrold Nadler em frente ao seu escritório em Nova York, já não podem ser vistos como erros ou excessos isolados de agentes federais. Agora, é preciso supor que são ordens claras para reprimir todo político que se oponha às políticas anti-imigrantes do governo republicano.

A senadora democrata Tina Smith, de Minnesota, perguntou ao New York Times: “Os membros do Congresso precisam de escoltas de segurança para se protegerem do Poder Executivo?”

Temor de violência por parte de extremistas

O deputado Hakeem Jeffries, líder da minoria democrata da Câmara dos Deputados, em declaração após a prisão de Lander, advertiu que “o ataque agressivo contra funcionários eleitos democratas inevitavelmente fará com que esses servidores públicos também sejam marcados para morrer pelas mãos de extremistas violentos. O governo Trump e sua tropa de agentes mascarados devem mudar de rumo antes que seja tarde demais. Isto é os Estados Unidos“.

Outros parlamentares afirmam que todos esses incidentes e o envio de tropas são sinais claros de “autoritarismo”.

Vale ainda lembrar que, como se viu em Los Angeles, Trump está preparado para ordenar o envio de tropas militares armadas contra cidadãos estadunidenses nas ruas. Ele declarou que se arrepende de não ter ordenado o uso das Forças Armadas para reprimir os protestos contra a brutalidade policial, organizados pelo movimento Black Lives Matter, em várias cidades, incluindo Portland, Minneapolis e a própria capital federal, durante seu primeiro mandato em 2020.

De fato, ele mesmo perguntou ao então secretário de Defesa, Mark Esper, se não poderiam autorizar os soldados a atirar contra os manifestantes em Washington, ao que Esper respondeu: “Isso seria ilegal” e recusou-se a cumprir a ordem. Seu novo secretário de Defesa, Pete Hegseth, evitou responder, na semana passada, a uma senadora que perguntou se ele ordenou que as tropas enviadas às ruas usem força letal.

Nos estados com governos republicanos aliados de Trump, como Texas e Flórida, governadores e autoridades locais eleitos não hesitaram em ameaçar os manifestantes com violência. O governador do Texas, Greg Abbott, mobilizou 5 mil efetivos da Guarda Nacional diante da convocação das manifestações “Não temos reis”, realizadas em 14 de junho. Um xerife da Flórida afirmou em entrevista coletiva: “Mataremos quem desafiar as autoridades, caso joguem um tijolo ou apontem uma arma contra nossos policiais”. Já a procuradora-geral do estado propôs “desnaturalizar e deportar” a deputada federal democrata Ilhan Omar por ousar criticar o desfile militar organizado por Trump também em 14 de junho.

Mas as táticas de intimidação política não estão funcionando, como ficou claro no fim de semana, quando ao menos 3 milhões de pessoas saíram às ruas para repudiar o “autoritarismo” do governo Trump, incluindo seus ataques anti-imigrantes.

Ao mesmo tempo, mais cidadãos estão escoltando migrantes em suas audiências com as autoridades em várias partes do país, incluindo outros funcionários públicos, voluntários solidários e líderes religiosos. Na semana passada, por exemplo, o bispo Michael Pham, um refugiado vietnamita, se dedicou a mobilizar padres e líderes de congregações católicas para acompanhar migrantes em suas audiências nos tribunais de San Diego e em outras localidades.

A seguir, confira detalhes das manifestações “Não temos reis” e do desfile militar organizado pela equipe de Trump, ambos em 14 de junho.

250 anos do exército: uma festa para Trump

Em 14 de junho, o presidente Donald Trump transformou a celebração do 250º aniversário do Exército dos Estados Unidos em uma festa de aniversário para si mesmo, com um desfile militar que incluiu cerca de 6 mil soldados marchando, tanques, armamentos pesados, helicópteros e aviões e, claro, bandas militares, que ocuparam o centro da capital.

Trombetas do Exército tocaram uma saudação ao comandante-chefe, enquanto armas militares dispararam quando Trump chegou ao seu pódio de honra, acompanhado de sua esposa, para observar o desfile. Com o público gritando “USA, USA”, Trump levantou o punho, com seu gabinete sentado na tribuna sob um teto que os protegia da chuva, e com dois tanques de 60 toneladas estacionados a seus lados. Um locutor identificava as diferentes unidades que desfilavam.

A chuva incessante certamente reduziu o tamanho do público, que se esperava ser de menos de 10 mil pessoas no parque central da capital, conhecido como o Mall. Mas Trump recusou-se a admitir o que certamente desejava: uma participação muito maior. Ao concluir o desfile, o vice-presidente JD Vance tomou o pódio para oferecer uma saudação ao Exército antes de se virar para dizer ao seu chefe: “Feliz aniversário, Sr. Presidente”. Vale lembrar que, repetidas vezes, insistiu-se que este evento era uma homenagem ao Exército, e não um presente ao mandatário.

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Trump iniciou seu discurso declarando que o Exército “é a força de combate mais grandiosa e feroz que jamais passou pela face da Terra”. Acrescentou que o Exército “cravou suas baionetas no coração de impérios sinistros, esmagou as ambições de tiranos malévolos, e, sob as esteiras dos tanques estadunidenses, fez tanto em forçar o próprio diabo a uma retirada plena. Uma e outra vez, os inimigos dos Estados Unidos aprenderam que, se ameaçarem este país, sua derrota será certa e sua queda será completa”.

Com isso, os presentes foram ouvidos cantando “Happy Birthday” ao comandante-chefe da força mais letal do planeta, e o homenageado pediu que Deus abençoasse os Estados Unidos.

No início do evento, soldados paraquedistas saltaram de aviões e aterrissaram sobre o Mall, e um deles correu até a tribuna para entregar uma bandeira estadunidense ao presidente. Seguiu-se um espetáculo pouco usual — desfiles militares não são uma rotina neste país —, que continuou com soldados vestindo uniformes e equipamentos históricos para recordar os 250 anos do Exército.

Este presidente tem buscado privatizar grande parte do setor público, e este evento não foi exceção. O locutor, ao descrever os contingentes do desfile, interrompeu repetidamente seu comentário para declarar: “Agradecemos especialmente ao nosso patrocinador Lockheed Martin”, e, em seguida, a outras empresas privadas que possuem contratos com o governo estadunidense e fabricam as armas exibidas no desfile.

O desfile e outras partes do espetáculo militar se destacaram pela exibição de todo tipo de armamento, incluindo helicópteros de ataque, tanques, bazucas, drones, cães robóticos e diferentes tipos de armas computadorizadas. Muito desse equipamento foi exposto ao longo do Mall durante o dia, antes do desfile, algo que o Exército usou como um esforço de recrutamento, que incluiu brindes, fotos com soldados e convites para inspecionar as armas.

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Caminhando ao longo do dia por essa área, o La Jornada observou, entre outras cenas, um menino de 10 anos carregando uma arma antitanque, dois adolescentes testando fuzis semiautomáticos e centenas de crianças subindo em helicópteros de ataque Apache, veículos militares blindados ou obuses de 155 milímetros.

Não houve referências à nova missão das forças militares de prender e deportar migrantes. Mas era notável que os sobrenomes dos soldados ao redor dos obuses — Diaz, Gonzalez, Martínez, Delfina — sugeriam que eles próprios poderiam ser imigrantes ou filhos e netos de imigrantes.

Ninguém se atreveu a lembrar que o comandante que liderava este espetáculo militar havia evitado seu próprio serviço militar obrigatório, usando como justificativa uma condição médica que muitos outros de seus contemporâneos não conseguiram obter.

Durante o show de Trump, protestos em todo o país

“O desfile de Trump não tem a ver com patriotismo, tem a ver com poder”, declarou Naveed Shah, veterano do Exército e hoje líder da organização Common Defense, um dos oradores diante de milhares reunidos em uma manifestação na Filadélfia. Ele destacou que, segundo uma pesquisa recente, 70% dos veteranos militares do país desaprovam o desfile militar de aniversário do mandatário. “Estamos aqui, e em todo o país, para reafirmar nosso apoio à Constituição dos Estados Unidos, e não a um político, nem a um partido político, nem a nenhum rei”.

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O protesto na Filadélfia foi um dos mais de 2 mil atos realizados também em 14 de junho durante o espetáculo de Trump. As mobilizações foram registradas em todos os 50 estados dos EUA, na maior expressão de repúdio e resistência contra as políticas do republicano desde o início de sua segunda presidência. Sob a consigna “Não temos reis”, as manifestações formaram um coro massivo contra seus abusos e corrupção de poder, suas políticas anti-imigrantes e os ataques aos programas de saúde e educação.

“Não deixaremos a democracia morrer”, afirmou Martin Luther King III, filho do lendário líder dos movimentos por justiça social e direitos civis. “Estamos profundamente preocupados com os esforços de usar o medo como arma, usar a imigração como bode expiatório e silenciar a voz do povo por meio da força marcial. Vamos nos levantar, vamos marchar.” Leah Greenberg, cofundadora da rede de grupos Indivisible (inivisíveis, em tradução literal), que ajudou a organizar o dia de ação, acrescentou: “Estamos aqui hoje porque estamos assistindo a Trump destruir a democracia estadunidense em tempo real”.

Uma capitã militar e veterana de combate aposentada declarou, durante um ato de protesto em Washington contra o atual comandante-chefe: “Enquanto os Fuzileiros Navais têm permissão para aterrorizar nossas comunidades, enquanto nossos impostos são usados para as fantasias ditatoriais do nosso presidente e para bombardear e impor fome a crianças – este não é o país que merecemos, não é digno do nosso sacrifício. Se nossos líderes e os tribunais não enfrentarem esse megalômano, então nós teremos que ser os líderes que estávamos esperando para frear esse autoritarismo, agora”.

Manifestações por todo o país

Os organizadores do “Dia do Não Temos Reis” optaram por não convocar uma marcha em Washington. A ideia era realizar centenas de atos em todas as comunidades ao redor do país, criando um mosaico nacional de protesto em vez de uma ou duas grandes concentrações.

Em Nova York, dezenas de milhares marcharam pela Quinta Avenida a partir da Rua 42, epicentro de Manhattan, com seus coros ecoando entre os arranha-céus. O refrão de “Não vamos mais tolerar isso”, da velha e famosa banda de metal Twisted Sister, foi entoado com acompanhamento de tambores e metais. Em outra esquina, soavam os versos de “Todos vocês fascistas serão derrotados”, de Woody Guthrie, enquanto cartazes contra o Serviço de Imigração e Alfândega (ICE) brincavam com o duplo sentido da palavra “ice” (gelo): “Podemos derreter o ICE”, “Gosto do ICE triturado” ou simplesmente “Fuck ICE”. Também havia inúmeros cartazes satirizando Trump como rei, com frases como “Sem reis, não passarão”, “Não há coroas para palhaços” e “A única minoria destruindo este país é a dos multimilionários”.

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Mas o que mais chamou atenção foi a expressiva participação não apenas nas grandes cidades, mas também em pequenos povoados pelo país. “Nem reis, nem führers, nem ditadores”, dizia um cartaz em uma manifestação com cerca de 3.500 pessoas em Westport, Connecticut. “Chinga tu migra. Viva a raça!”, dizia outro cartaz na conservadora Adrian, Michigan, onde 800 pessoas protestaram em frente à prefeitura. No pequeno Woodstock, Virgínia, mais de 400 manifestantes também empunharam cartazes com o lema “Não temos reis”, segundo relatou um médico militar aposentado ao jornal La Jornada.

Dezenas de milhares em Chicago, gritando “Fora Donald Trump”, lotaram a Praça Daley, no centro da cidade. Ocorreram outras concentrações semelhantes em Dallas, Detroit, Pittsburgh, Boston, Milwaukee, Atlanta, San Antonio, Salt Lake City e, ao longo da costa oeste, de Seattle a San Diego.

Uma das maiores foi em Los Angeles. “Que direito você tem de destruir nossas famílias?”, questionava um dos cartazes, em meio a um mar de faixas carregadas por dezenas de milhares na cidade, que tem respondido de forma feroz e, em grande parte pacífica, contra as operações de imigração e a militarização da repressão promovida pelo governo Trump.

Trump oscilou em suas respostas às manifestações planejadas contra ele: por um lado, zombando das acusações de que age como um rei e, por outro, ameaçando com violência os manifestantes. “Não me sinto como um rei, tenho que passar pelo inferno para conseguir aprovar as coisas”, comentou recentemente, enfatizando: “Não, nós não somos um rei” (usando o plural). Porém, como destacou o New York Times, vale lembrar que, em fevereiro, ao se autoelogiar por uma de suas conquistas, ele terminou um tuíte com a frase: “Longa vida ao rei”, referindo-se a si mesmo. E com tom de monarca, advertiu há poucos dias que qualquer manifestante que ousasse protestar durante sua celebração em Washington em 14 de junho enfrentaria uma “força muito forte”.

A força do movimento “Não temos reis”

O novo movimento progressista descentralizado nos Estados Unidos, formado por dezenas de milhares de pessoas que resistem à agenda política imediata de Donald Trump tanto nas ruas quanto em escolas, universidades e centros culturais, está construindo estruturas de longo prazo para conquistar poder nos níveis local, estadual e nacional.

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O senador federal independente Bernie Sanders é um dos líderes desse esforço, mas também participa de uma coalizão diversa de sindicatos, igrejas, grupos de direitos civis, da comunidade LGBTQIA+, de imigrantes, junto a ambientalistas e ativistas comunitários.

Os eventos “Não temos reis” buscam ir além das necessárias e urgentes ações cotidianas para impedir batidas de agentes de imigração, protestar contra o desmantelamento de agências federais e programas de bem-estar social, e condenar a cumplicidade de políticos, empresários e instituições estadunidenses com o genocídio de palestinos por Israel.

A organização desses atos contra a agenda política de Trump começou pouco depois que o mandatário venceu a eleição em novembro do ano passado, quando cerca de 135 mil pessoas se somaram a uma teleconferência para planejar rotas de resistência diante da segunda chegada do republicano à Casa Branca. Pouco antes de sua posse em janeiro, uma coalizão organizou atos de protesto em todos os 50 estados da União.

No último dia 5 de abril, uma ampla coalizão de organizações organizou protestos em mais de mil cidades e vilarejos ao redor do país sob o simples lema “Mãos pra cima”, em resposta aos ataques contra imigrantes, serviços de saúde, proteções trabalhistas, agências de bem-estar social e mais. “A ideia era reunir o maior número possível de diferentes grupos em oposição à agenda de Trump, e funcionou”, comentou um organizador que solicitou anonimato. Os protestos continuaram, com outra série de ações — marchas e comícios — em todo o país no último 1º de maio, lideradas por sindicatos e organizações de imigrantes.

A coalizão Invisible

Um consenso entre essas forças progressistas diversas é a ira contra líderes do Partido Democrata por sua falta de disposição em confrontar o novo governo de Trump, junto com a decisão de alguns escritórios de advocacia proeminentes, universidades e meios de comunicação de se submeterem às exigências e ameaças do presidente (com algumas exceções notáveis, incluindo, por ora, Harvard, a rádio pública nacional NPR e um escritório de advocacia). Todos pediram a renúncia do senador Chuck Schumer, o líder da bancada democrata no Senado. “Todas essas instituições, todos esses líderes, estão levantando o dedo para cima para tentar ver em que direção o vento sopra”, criticou Ezra Levin, um dos fundadores da organização Indivisible, ao condenar o oportunismo e a covardia de políticos e outros diante de Trump.

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A Indivisible é composta por uma rede de mais de 2 mil grupos locais afiliados ao redor do país. Cada grupo se encarrega de organizar eventos em suas localidades, em coordenação com outras filiais em nível nacional. Recentemente, convidou historiadores para sessões informativas com seus membros sobre outras épocas em que líderes autoritários chegaram ao poder em países usando mecanismos democráticos. A tarefa agora, dizem, é construir um movimento progressista duradouro para resistir ao governo autoritário. “Se sua teoria para vencer autoritários é o protesto pacífico em massa… então tem que ser em massa”, declarou uma das fundadoras, Leah Greenberg, durante uma teleconferência da organização, conforme relatou o The Guardian. “Tem que ser avassalador. E você não estala os dedos e simplesmente chega a isso. Você tem que construir, construir com tempo.”

Para manter sua coalizão o mais ampla possível, a Indivisible constrói sua mensagem em torno de um simples “não a Trump”, e as filiais locais planejam suas próprias ações e reivindicações com base nas prioridades e preocupações locais.

O projeto de Sanders: preparar líderes progressistas

Paralelamente a esse esforço, o senador Sanders, trabalhando com a deputada federal Alexandria Ocasio-Cortez e outros legisladores progressistas, começou a organizar comícios chamados de “Luta contra a oligarquia”, convocando dezenas de milhares de simpatizantes e ativistas, inclusive em estados onde as maiorias votaram pelos republicanos. Mais da metade dos participantes desses comícios nunca havia participado de eventos anteriores com Sanders, e um terço não se identifica como democrata, relata Faiz Shakir, um dos organizadores desses comícios, que anteriormente liderou a campanha presidencial de Sanders em 2020. Sanders destaca que o foco não deve ser apenas Trump, mas os bilionários e oligarcas por trás do presidente que estão impulsionando a agenda de cortes de impostos para os mais ricos e a desregulamentação prescrita pelo neoliberalismo.

Sanders também criticou explicitamente a liderança do Partido Democrata, incluindo sua ex-candidata presidencial Kamala Harris. “A diferença que tenho com a liderança democrata não é sobre a necessidade de uma oposição vigorosa a Trump. É sobre formular uma agenda que ressoe com as famílias trabalhadoras. E acredito que há muitas pessoas que votaram em Trump que apoiariam essa agenda”, comentou ao Washington Post em uma entrevista recente.

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Sanders, que continua sendo o líder progressista nacional mais popular, lançou duas campanhas para a presidência, mas agora afirma que se dedica a ajudar a construir a próxima geração de líderes progressistas neste país. Ele contatou organizadores em mais de 18 estados para ajudar na construção desse movimento progressista, e cerca de 7.500 pessoas se juntaram a uma teleconferência organizada recentemente para recrutar candidatos a cargos eletivos nos níveis local, estadual e federal. É notável que mais da metade desses novos candidatos está optando por fazer campanha como “independentes” em vez de se filiar ao Partido Democrata, informou o senador.

Sanders, aos 83 anos de idade, tem sido mais bem-sucedido em convocar os jovens do que muitos outros líderes e organizadores políticos. Foi ovacionado ao ser apresentado pelo músico Clairo no festival Coachella, na Califórnia, onde incentivou os jovens a “se levantarem” contra a indústria dos combustíveis fósseis, as seguradoras e os que buscam anular conquistas sociais e direitos das mulheres, dos trabalhadores e das minorias.

Suprema Corte dos EUA bloqueia ação do México contra fabricantes de armas

Em 5 de junho, a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu bloquear a ação do governo do México contra fabricantes de armas estadunidenses. O processo acusa as corporações de fomentar o tráfico ilegal de armas de fogo que alimenta a violência no território mexicano.

“A ação do México não alega de maneira plausível que os fabricantes de armas acusados ajudaram e instigaram as vendas ilegais de armas de fogo para traficantes mexicanos”, escreveu a autora da decisão, a juíza liberal Elena Kagan, em uma decisão unânime dos nove integrantes da Suprema Corte.

O governo do México argumenta que a Smith & Wesson e outros fabricantes e distribuidores de armas de fogo fracassaram em exercer o “devido cuidado” para garantir que seus produtos não acabassem no tráfico ilícito para o México.

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A Suprema Corte reconhece que o México enfrenta um “grave problema de violência com armas de fogo” e afirma: “temos poucas dúvidas de que, como alega a ação, algumas vendas desse tipo realmente ocorrem — e que os fabricantes sabem que isso acontece”. Assim, a decisão conclui que o governo mexicano não conseguiu comprovar a alegação de que os distribuidores vendem intencionalmente seus produtos para o mercado ilícito mexicano, nem que as fabricantes oferecem “assistência ampla, sistemática e culposa” a traficantes de armas ilegais.

Imunidade

Os fabricantes argumentaram que não podem ser responsabilizados legalmente, já que uma lei federal de 2006 protege os distribuidores contra ações judiciais movidas por pessoas prejudicadas pelo uso de seus produtos. O tribunal aceitou esse argumento.

“Estamos agradecidos porque a Suprema Corte concordou que não somos legalmente responsáveis por criminosos que fazem mau uso de nossos produtos para causar danos a outras pessoas — e muito menos por seu contrabando ao México para uso pelos cartéis de drogas”, escreveu Noel Francisco, advogado dos distribuidores, em uma mensagem divulgada no LinkedIn.

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Em declaração sobre a decisão, Jonathan Lowy, um dos advogados que representam o governo do México, expressou seu firme desacordo com a decisão do tribunal e, em especial, criticou a lei de 2006, que em grande medida protege os fabricantes de armas contra ações judiciais.

Lowy, que também é presidente da organização Ação Global contra a Violência Armada, destacou que o tribunal “não considerou as alegações detalhadas do México de que a indústria de armas dos Estados Unidos deliberadamente fornece armas a criminosos para lucrar com esse mercado”.

Mais importante ainda, acrescenta Lowy, “o tribunal também não aceitou os amplos argumentos dos fabricantes que os teriam imunizado contra praticamente toda responsabilidade por seus atos indevidos”.

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Em essência, o tribunal determinou que o México não comprovou sua acusação de que os fabricantes e distribuidores de armas agiram de forma deliberada, sabendo que suas armas seriam traficadas para o país. Mas essa decisão implica que o México pode preparar e apresentar um novo caso. “A Corte recusou aceitar os argumentos da indústria de armas de que nunca poderia ser causa de prejuízo ao México, e a decisão da Corte permite que os fabricantes e comerciantes de armas possam ser legalmente responsabilizados em casos futuros com fatos adicionais”, explicou Lowy.

Pablo Arrocha Olabuenaga, assessor legal da chancelaria do México, em uma declaração divulgada pela organização Ação Global contra a Violência de Armas, afirmou: “Estamos decepcionados com a decisão da Suprema Corte, mas igualmente convencidos da força de nossos argumentos e das provas em que se baseiam. Nos anima o apoio, tanto interno quanto internacional, às ações do México”.

Olabuenaga acrescentou que o governo mexicano continuará fazendo o que estiver ao alcance “para proteger os mexicanos” e conter o fluxo de armas ilícitas. “Seguiremos com nossa demanda contra comerciantes de armas no Arizona. Aguardamos uma decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos e estamos apresentando nosso caso à OEA, à ONU e ao governo dos Estados Unidos para que o fluxo ilícito de armas seja contido. Consideramos todas as opções para ampliar e apresentar novas ações legais. Estamos convencidos de que sairemos vitoriosos.”

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O caso contra os fabricantes de armas começou em 2021 com a apresentação da primeira ação judicial do México nos Estados Unidos. Mas os fabricantes de armas, processados por um tribunal federal em Massachusetts, argumentaram que as leis estadunidenses os protegem das acusações e que não foi comprovada a violação de nenhuma lei no comércio legal. Por isso, solicitaram que o juiz rejeitasse o caso por falta de mérito. Em 2024, um painel de três juízes da Corte de Apelações do Primeiro Circuito dos Estados Unidos, em Massachusetts, determinou que o governo do México poderia prosseguir com sua ação contra sete fabricantes estadunidenses, acusados de fabricar e distribuir armas nos Estados Unidos com pleno conhecimento de que seriam exportadas ilegalmente ao México.

Essa disputa legal foi concluída em 5 de junho com a decisão que marca o fim dessa ação específica. Uma ampla gama de organizações estadunidenses contrárias à violência armada apoiou a demanda do governo mexicano.

Nick Wilson, ex-funcionário que trabalhou com questões de violência armada na cidade de Baltimore e que atualmente atua no Center for American Progress, declarou no dia da decisão da Suprema Corte: “O fracasso em responsabilizar a indústria de armas por armar os cartéis de drogas mexicanos mina nossas prioridades de segurança nacional e imigração”. E destacou: “Felizmente, a Corte rejeitou o pedido da indústria de armas de blindar os fabricantes e vendedores de armas de fogo contra quase toda responsabilidade — mesmo quando agem ilegalmente”.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul Global – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.
Jim Cason Correspondente do La Jornada e membro do Friends Committee On National Legislation nos EUA, trabalhou por mais de 30 anos pela mudança social como ativista e jornalista. Foi ainda editor sênior da AllAfrica.com, o maior distribuidor de notícias e informações sobre a África no mundo.

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