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Foto: Flickr

Protestos, recessão, emigração: Netanyahu coloca Israel em “perigo existencial”

Segundo analistas, conflitos sociais e políticos gerados pela guerra contínua de Netanyahu levam Israel a um cenário catastrófico, arriscando sua sobrevivência como Estado
Redação Misión Verdad
Missão Verdade
Caracas

Tradução:

Ana Corbisier

Depois de um ano de genocídio continuado contra a população palestina, aprofundaram-se em Israel os problemas internos por se manter em estado contínuo de guerra. Os governantes israelenses decidiram começar uma ofensiva contra o Hezbollah e o Líbano enquanto prolongam ataques contra Gaza, Cisjordânia, Iêmen, Iraque, Síria e Irã.

O governo de Benjamin Netanyahu está em um momento alto de sua gestão, bem alinhado com as correntes políticas e religiosas locais de extrema-direita e fundamentalismo talmúdico, reflexo da multiplicação de frentes militares em que se encontra em escala regional.

A situação atual está condicionada por três crises que se relacionam entre si, e que provavelmente determinarão os próximos meses neste país e, portanto, repercutam nas ações bélicas contra os países e grupos do Eixo da Resistência.

Crise social

No princípio deste ano sucederam-se jornadas de protestos sociais e greves trabalhistas em Israel dirigidas diretamente à direção governamental, especialmente devido à forma como o exército levou a cabo sua ofensiva supostamente contra o Hamas e outras organizações da resistência palestina.

Especificamente, a população israelense não gostou da maneira como o governo de Netanyahu gestiona a situação de reféns nacionais em Gaza e as tentativas de assinar um cessar-fogo.

De igual maneira, um membro do gabinete de guerra, o general Gadi Eisenkot, criticou o enfoque do primeiro-ministro em ambos os temas. A discórdia existente sobre a aproximação estratégica do exército tornou-se pública.

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As culpas em torno da figura de Netanyahu intensificaram-se desde então, tanto de funcionários locais como da população que se viu afetada diretamente pela guerra.

No entanto, a cidadania não protesta contra a guerra, só quanto à estratégia utilizada. Uma pesquisa de janeiro indicou que 88% acreditam que o crescente número de mortes palestinas são justificadas, e uma enorme maioria opina que as Forças de Defesa de Israel fazem uso adequado da força, ou até de muito pouca, em Gaza.

Outra pesquisa, de fevereiro, mostra que 63% dos israelenses se opõem à instauração de um Estado palestino.

De maneira que a própria sociedade israelense está comprometida com a política de continuação da guerra, ainda que pense que os líderes militares estão mal orientados. A percepção contribui para a ideia de que Israel já não é um Estado seguro e forte na área econômica.

Emigração comprova crise

Sem dúvida, um dos dados mais ilustrativos desta crise social é a emigração em massa que se deu no país desde 7 de outubro de 2023. Um artigo de The Jewish Independent afirma: “As estatísticas de emigração mostram que 42.185 israelenses abandonaram o país entre outubro de 2023 e março de 2024 sem terem regressado até julho deste ano”.

Apenas em outubro de 2023, 12.300 israelenses deixaram o país “e não tinham regressado até junho de 2024, em comparação com só 3.200 que se foram de forma permanente no ano anterior, um aumento de 285%”, informa uma nota do The Times of Israel.

O The Jewish Independent também afirma que “uma comparação entre a imigração total para Israel durante os primeiros oito meses de 2024, em comparação com os primeiros oito meses do ano anterior, mostra uma queda de 42%”.

Não há números mais atualizados até hoje, no entanto, as consequências a médio e longo prazo da emigração ainda estão por ver-se, sobretudo no plano econômico, em que o país se veria mais afetado.

Crise econômica

São múltiplos os informes sobre a queda da economia israelense devido à guerra. Em 28 de setembro, o ministro de Finanças, Bezalel Smotrich — que considera que “pode ser justo e moral” usar a fome como arma de guerra contra 2 milhões de palestinos —, disse que “a economia de Israel suporta o peso da guerra mais longa e mais cara da história do país”.

Um trabalho acadêmico do Instituto de Estudos de Segurança Nacional da Universidade de Tel Aviv afirma que, no melhor dos casos, o Produto Interno Bruto de Israel cairá em números negativos entre 2024 e 2025, e o máximo de crescimento previsto é de apenas 1%, sem contar com um déficit orçamentário de 15% aproximadamente.

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Além disso, o Banco de Israel estima que os custos relacionados com a guerra para o período 2023-2025 poderiam chegar a 55,6 bilhões de dólares, recursos que provavelmente serão obtidos mediante uma combinação de maior endividamento público e cortes orçamentários.

Economistas israelenses se manifestaram sobre a situação. A agência turca Anadolu Ajansi informou que, segundo especialistas na matéria, “a guerra de Gaza custou à economia israelense mais de 67,3 bilhões de dólares”.

  • “O establishment de Defesa quer um aumento anual de pelo menos 20 bilhões de NIS (5,39 bilhões de dólares)”, disse Rakefet Russak-Aminoach, ex-diretor executivo do Banco Leumi de Israel;
  • Jacob Frenkel, ex-governador do Banco Central de Israel, disse que “Israel começou o ano de 2023 sem déficit e desde então a situação se deteriorou. No final de julho, o déficit alcançou 8,1%, isto é, uns 155 bilhões de NIS (41,8 bilhões de dólares). É preciso cobri-lo”.
  • Uri Levin, ex-diretor executivo do Banco de Desconto de Israel, disse que o país não poderá reabilitar sua economia sem recuperar a confiança dos investidores internacionais.


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A isso se somam as perspectivas de qualificadoras de risco, que rebaixaram a classificação de crédito de Israel por fatores como a continuação do genocídio em Gaza e os riscos geopolíticos associados. Um trabalho do historiador econômico britânico Adam Tooze conclui que a geopolítica dos territórios palestinos ocupados e a economia política de Tel Aviv estão provocando o colapso do neoliberalismo de segurança nacional que serve de modelo a Israel, fruto das políticas de expansão colonial da administração de Netanyahu na última década.

Sem dúvida, isto está conectado diretamente com a imagem que Israel está mostrando ao mundo, e que encontra um correlato na desestabilização política que o próprio governo de Netanyahu experimenta portas adentro.

Crise política (e Netanyahu)

As contradições no gabinete de guerra levaram Netanyahu a dividir-se e a caotizar-se publicamente.

Recordemos que, no início, a instância era integrada pelo primeiro-ministro, o ministro de Defesa, Yoav Gallant, e o ministro de Assuntos Estratégicos, Ron Dermer, assim como pelos rivais políticos de Netanyahu, Benny Gantz e Gadi Eisenkot, que se uniram como parte de um governo de emergência nacional dias depois que estourou a guerra em outubro de 2023.

Mas em 9 de julho, Gantz renunciou a seu posto no ministério e exigiu de Netanyahu que convocasse novas eleições, o que não se cumpriu até o momento.

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Em janeiro, as críticas públicas de Gantz e Eisenkot à atual estratégia militar tinham mostrado um governo débil ante a situação. Gallant fez o mesmo, sem deixar de apoiar Netanyahu.

O certo é que a nomenclatura do atual gabinete de guerra só tem o uso de ainda mais força e a “vitória total” como parte central da estratégia militar. E tudo se concentra nas prerrogativas do primeiro-ministro.

Um informe do Crisis Group, assinado por Mairav Zonszein, analisa a crise política em Israel e indica dois elementos importantes:

  1. “Os militares querem uma visão e uma direção claras do gabinete de guerra, mas isso depende de uma decisão política sobre um plano para o dia seguinte, que ainda estão esperando. Muitos acreditam que isto se deve principalmente aos próprios interesses políticos de Netanyahu: permanecer no poder prolongando a guerra e agradando a sua base de extrema-direita, que rejeita a governança ou a condição de Estado palestino”.
  2. “Os líderes militares também têm outros problemas com Netanyahu. Responsabilizam-no por socavar a preparação militar de Israel mediante suas reformas judiciais e seu enfoque polarizador e incendiário em geral, e o acusam de desviar toda a culpa pelo desastre em curso para os militares, enquanto manobra para excluir a responsabilidade pessoal em uma futura investigação estatal. A exibição de inimizade entre os militares e o primeiro-ministro não tem paralelo na história israelense”.

Netanyahu enfrentará um processo judicial por acusações de corrupção a partir de dezembro, outro fator que o põe na corda bamba.

De tudo isso se depreende o fato de que o primeiro-ministro se encontra imerso em uma crise política que está levando Israel a um cenário catastrófico para sua sobrevivência como Estado, segundo vários analistas. The Times of Israel publicou em setembro, com a assinatura do colunista neoconservador David Horovitz, que sob seu governo este país “está em perigo existencial“.

Guerra impede ação da oposição

No entanto, apesar dos índices de aprovação historicamente baixos de Netanyahu e seu governo, os partidos de oposição não puderam tirar proveito político da situação, algo que poderia mudar caso fossem convocadas eleições.

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Depois de três décadas protagonizando o mundo político israelense, com óbvias repercussões internacionais, Netanyahu ainda está convencido de que é o único líder que pode conseguir a total segurança de Israel.

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Sua visão de que só pode escalar o cenário regional, que está atiçando para atacar o “eixo iraniano”, tem vários repúdios públicos. Além disso, afirma estar travando uma guerra existencial, um risco que reconhece, mas que está disposto a assumir.

“Prefiro ter má imprensa do que um bom obituário”, disse em uma entrevista para a revista estadunidense Time.

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Para Netanyahu, a pressão internacional no sentido de que Israel se torne um Estado pária é só uma consequência colateral de sua política, baseada no racismo, na limpeza étnica e no genocídio contra a Palestina e o resto de países na região da Ásia Ocidental que se oponham às guerras perenes que os Estados Unidos apoiam com nulas objeções.

É certo que as três crises descritas configuram sobretudo cenários de desestabilização e não de conclusão de um período ou fase, já que é perigoso afirmar que o regime de ocupação se encontra em estado de colapso. Mas também é perigosa a possibilidade de que qualquer destas arestas se aprofunde e sua influência se estenda para o resto da sociedade e para o Estado de Israel, de tal maneira que, em conjunto, gerem uma crise que ameace sua própria existência.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Redação Misión Verdad

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