Diante de um genocídio histórico, de tantas condenações públicas, de humilhações causadas pela “diplomacia” israelense e da pressão popular interna, como é possível que um governo de esquerda, liderado pelo maior partido de esquerda do país e presidido por uma figura histórica da esquerda brasileira ainda não tenha rompido com o “estado” fascista, ditatorial e criminoso de Israel?
A resposta se encontra na essência mesma do PT e da política dominante na esquerda brasileira há muitas décadas: a crença na conciliação e na colaboração entre a classe operária e a burguesia – e, com ela, o imperialismo internacional. Lula e o PT têm medo de desagradar a direita, a burguesia nacional e o imperialismo.
Afinal de contas, a direita brasileira cultiva fortes vínculos com Israel e com os Estados Unidos. Isso não é novidade para ninguém. São vínculos de dependência. Mas essa mesma direita também mantém fortes vínculos com a própria esquerda brasileira – e, aqui, a dependente é a esquerda, não a direita. Basta ver as relações com os dois prefeitos de capitais que foram recentemente a Israel para adquirir a tecnologia militar utilizada para exterminar palestinos, iranianos, libaneses, iemenitas, sírios, etc. Álvaro Damião (União Brasil), prefeito de Belo Horizonte, foi o vice na chapa de Fuad Noman (PSD), apoiada pelo PT nas eleições de 2024, e Cícero Lucena (PP), prefeito de João Pessoa, também recebeu o apoio do PT nas últimas eleições.

Também podemos lembrar que os partidos de direita com ministérios no governo Lula, considerados pelo PT como seus aliados, são todos alinhados com o sionismo. Para não dizer que os próprios senadores do PT votaram a favor da criação de um dia da “amizade” entre Brasil e Israel quando mais de 53 mil palestinos já haviam sido dizimados pelos “amigos” de tais senadores.
A dependência, no entanto, não é de Israel. Israel não passa de uma base militar do imperialismo americano e internacional para melhor dominar o Oriente Médio. O amo de Israel são os Estados Unidos. E os partidos e políticos que o PT pensa serem seus aliados estão às ordens do imperialismo americano. União Brasil, Republicanos, PP, PSD e MDB são representantes dos interesses imperialistas no Brasil.
Pertencem ao União Brasil Sérgio Moro (dispensa apresentações), Kim Kataguiri (cria dos magnatas do petróleo, os irmãos Koch) e Ronaldo Caiado (elogiado pelos banqueiros na Brazil Week em Nova Iorque). O Republicanos é o partido de Tarcísio de Freitas (ainda mais elogiado que Caiado na Brazil Week) e de Hamilton Mourão (com vínculos antigos com os militares americanos). Michel Temer, uma das principais lideranças do MDB, era informante da embaixada dos Estados Unidos e entregou o Brasil ao saque imperialista.
Energia para o genocídio: envio de combustível do Brasil a Israel sobe 44.000% desde 2023
Esses partidos, os quais o PT acredita serem seus aliados e que na verdade estão sabotando o governo desde o primeiro dia, estão entre os principais instrumentos de dominação da burguesia nacional e internacional sobre a política brasileira. E claro, como uma típica burguesia nacional, a burguesia brasileira atua em função da burguesia imperialista – assim como seus veículos de comunicação. Todos, portanto, são fortes propagandistas e agentes dos interesses dos Estados Unidos – o que inclui a defesa dos crimes de Israel.
Nesse cenário, como Lula poderia romper com Israel? O rompimento com Israel significa o rompimento, ao menos parcial, com a burguesia brasileira, com os Estados Unidos e com a burguesia internacional, que tem Israel como seu testa de ferro na região mais importante do mundo do ponto de vista do comércio internacional e da extração de recursos naturais.
Em outras palavras: o que prende Lula e o PT e os impede de romper com Israel é precisamente a sua relação (de submissão) com os partidos da direita brasileira, a burguesia nacional e o imperialismo. Lula não romperá efetivamente com Israel se não romper com seus “aliados” internos – embora tenha ainda mais motivos para romper com estes, uma vez que se passam por aliados ao mesmo tempo que fazem uma campanha crescente de desestabilização e golpe contra o governo. E esses “aliados” compõem com o PT uma frente tão ampla que chega a englobar até mesmo o PL de Bolsonaro em diversos municípios Brasil afora.
E por que Lula e o PT não rompem com aqueles que eles mesmos sabem que os estão sabotando? Por medo de confrontar a burguesia e o imperialismo dentro do Brasil. Por medo de se desfazer das relações que mantiveram há décadas com os seus representantes. Porque muitos políticos do próprio PT dependem dessas relações.
Leia mais notícias sobre Gaza na seção Genocídio Palestino.
A militância que exige nas ruas e tem realizado campanhas pelo rompimento com Israel, no entanto, não depende dessas relações. Ela deve ter claro o quão importante é aumentar as pressões pelo rompimento com Israel: o tensionamento das relações com Israel tensiona também as relações do PT com a direita, a burguesia e o imperialismo. Romper com Israel não significa apenas um gesto de apoio e solidariedade ao povo palestino, mas desnudará os agentes do imperialismo no Brasil, agudizará a luta de classes e mobilizará os trabalhadores e as massas populares para um grande enfrentamento com a burguesia – o que é necessário para superar todas as desgraças que afligem e oprimem o povo brasileiro, sobretudo em um momento em que quem dá as cartas e coloca toda a esquerda contra a parede é a direita e a burguesia.
Os trabalhadores e movimentos populares precisam ter claro que o grande obstáculo para o rompimento com Israel é a política de conciliação com a burguesia. E que é urgente superar essa política.
Continuidade de Lula e PT exige ruptura com burguesia e “aliados” de direita