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ToggleNa última quinta-feira (26), perguntado por jornalistas se a decisão da recente cúpula da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) – realizada em 25 e 25 de junho — de aumentar o gasto militar de seus membros para 5% do Produto Interno Bruto representa uma “ameaça à segurança da Rússia”, o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov, ironizou:
“Creio que, de fato, há uma ameaça. Que cresce a cada ano. É a ameaça contra os contribuintes da União Europeia e da Grã-Bretanha, que nos últimos três anos estão, francamente, sendo roubados. Em vez de empregar os recursos arrecadados com seus impostos para resolver os cada vez mais agudos problemas econômicos e sociais que enfrentam, esse dinheiro está sendo usado para financiar uma guerra sem sentido na Ucrânia, do ponto de vista da completa falta de perspectivas e resultados”.
Segundo Lavrov, se antes os europeus queriam a “derrota estratégica” da Rússia, agora buscam uma “trégua urgente” na Ucrânia, enquanto “continuam fornecendo armamento” a Kiev.
“Quanto à meta de 5% do PIB, não penso que vá nos afetar: terá uma influência que mal será notada em nossa segurança”, enfatizou.
Conflito Israel x Irã
Sobre o conflito armado no Oriente Médio entre Israel, Estados Unidos e Irã, o chanceler russo afirmou que tudo aponta para a viabilidade de um arranjo político: “Me parece que todos estão interessados em que a situação se encaminhe para um aspecto político. Assim declarou o presidente dos EUA, Donald Trump, e o Irã disse que manterá o cessar-fogo, se Israel não retomar as ações bélicas”, comentou Lavrov, ao término da reunião que manteve em Moscou com seu homólogo do Laos, Thongsavanh Phomvihane.
O chanceler russo também criticou que, no contexto do atual cessar de hostilidades, Israel recorra a uma “retórica alarmante”. Mencionou como exemplo que o chefe do Estado-Maior israelense (Eyal Zamir) declarou que o cessar-fogo “segue vigente principalmente devido à necessidade de terminar a operação contra o Hamas e, depois, retomar, sem falta, a contra o Irã”.

Os ataques de Israel e dos Estados Unidos contra o Irã afetaram o regime de não proliferação de armas nucleares, denunciou ainda Lavrov. “Sem dúvida alguma, as ações agressivas de Israel e, depois, dos Estados Unidos, ao atacar as instalações do programa atômico pacífico do Irã, danificaram o regime de não proliferação (de armas nucleares)”.
O representante sustentou que a Secretaria do Organismo Internacional de Energia Atômica (OIEA) elaborou seu mais recente informe sob “forte pressão” de Alemanha, Grã-Bretanha, França e Estados Unidos. “Muitas das formulações desse informe têm um sentido ambíguo, o que foi imediatamente aproveitado pelos quatro países ocidentais ao redigir uma resolução baseada nos equívocos e insinuações exageradas do informe apresentado pelo secretário-geral, Rafael Grossi, que conseguiu apenas a metade necessária dos votos da junta de governadores da OIEA”.
Lavrov: Países ocidentais baseiam relatório sobre instalações nucleares do Irã em equívocos e insinuações (Foto:
No entanto, “o tom deliberadamente alarmista (do informe) deu a Israel um pretexto adicional para iniciar a operação, escudando-se também na opinião da OIEA”, apontou. Assim, todos “devem ser cautelosos”, em primeiro lugar o diretor-geral e o restante do pessoal dessa organização internacional, e “se concentrar ao máximo em cumprir suas tarefas profissionais, assim como evitar que estas se politizem”, recomendou Lavrov.
O apoio da Rússia ao Irã
De acordo com o secretário de imprensa do presidente Vladimir Putin, Dmitri Peskov, desde que Israel lançou o primeiro míssil contra o Irã, Moscou defendeu que se descartasse uma solução militar e que se excluísse por completo qualquer ataque injustificado contra um país soberano e com direito a desenvolver energia atômica para fins pacíficos, exigindo que a resolução das controvérsias fosse buscada por meios políticos e diplomáticos.
Ao rejeitar as críticas daqueles que consideram que a Rússia deu menos apoio ao Irã do que poderia durante os bombardeios dos Estados Unidos e de Israel, Peskov afirmou: “Agora há muitos que querem atiçar o fogo para prejudicar as relações de parceria entre Moscou e Teerã. Na realidade, ao adotar uma posição firme, a Rússia ajudou o Irã e, é claro, temos a intenção de continuar impulsionando os laços bilaterais”.
Em 23 de junho, antes do anúncio de Trump sobre “o fim da guerra dos 12 dias”, Peskov de fato declarou que o ataque estadunidense contra um aliado estratégico da Rússia não iria afetar o incipiente diálogo para normalizar os laços entre Moscou e Washington.
“Trata-se de coisas diferentes. Com o Irã mantemos uma relação de parceria estratégica, mas também estamos comprometidos com a restauração das nossas relações com os Estados Unidos. Ambas as vertentes são muito importantes”, declarou à televisão russa.
Comparações injustas
Em 24 de junho, ao participar das Leituras de Primakov — fórum organizado anualmente pelo Instituto de Economia Mundial e Relações Internacionais de Moscou em memória do notável político russo Yevgueni Primakov, que foi primeiro-ministro, chanceler e diretor do serviço de inteligência exterior da Rússia — o chefe da diplomacia russa, Serguei Lavrov, afirmou que é injusto comparar o conflito entre Israel e Irã com aquele travado pela Rússia contra a Ucrânia.
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“Dizer que essas guerras são semelhantes é injusto”, afirmou Lavrov, e explicou: “O descumprimento, por parte da Ucrânia, de suas obrigações de não criar ameaças militares à segurança da Rússia, e a destruição legal de tudo que é russo, são as causas originais (da operação militar especial russa no país eslavo vizinho), cuja continuidade não tínhamos o direito de permitir, não permitimos e não permitiremos”.
Por outro lado, segundo o chanceler russo, o conflito entre Israel e Irã “se deve às suspeitas do Estado judeu sobre uma suposta violação, por parte de Teerã, das condições do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, o que não foi confirmado por especialistas internacionais”.
E acrescentou: “Aliás, o idioma hebraico não está proibido no Irã; há sinagogas lá e o judaísmo não é proscrito”.
Lavrov destacou que a campanha militar russa na Ucrânia não depende do grau de envolvimento dos Estados Unidos e seus aliados no conflito armado do Oriente Médio. “De forma alguma, nossas ações não dependem disso”, garantiu.
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O presidente Vladimir Putin, em seu encontro com dirigentes de agências de notícias em São Petersburgo há duas semanas, já havia afirmado que a guerra entre Israel e Irã e o conflito armado entre Rússia e Ucrânia “não são a mesma coisa, mas fundamentalmente diferentes”, porque “a Rússia não busca a capitulação da Ucrânia, apenas quer que se reconheça a realidade criada no terreno”, como o chefe do Kremlin se refere à anexação de quase 20% do território ucraniano.
Rússia e China sobre o conflito Israel-Irã
Em 19 de junho, informou o Kremlin, os líderes da Rússia, Vladimir Putin, e da China, Xi Jinping, conversaram ao telefone e “coincidiram em condenar de modo enfático as ações de Israel (que atacou o Irã), ações que violam a Carta da Organização das Nações Unidas (ONU) e outras normas do direito internacional”.
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“Tanto Moscou como Pequim estão convencidos, com base em princípios, de que o arranjo da atual situação e das questões relacionadas ao programa nuclear iraniano não tem uma solução de força e que essa solução só pode ser alcançada por meio de métodos políticos e diplomáticos”, afirmou Yuri Ushakov, assessor de assuntos internacionais da presidência russa, ao resumir a conversa entre Putin e Xi.
Segundo Ushakov, o mandatário russo, ao compartilhar com seu colega chinês o conteúdo de suas recentes conversas telefônicas “com figuras-chave no contexto da confrontação entre Israel e Irã”, reiterou a disposição da Rússia de atuar como mediadora. O presidente chinês, acrescentou o funcionário do Kremlin, concordou que uma gestão de intermediação “poderia contribuir para uma desescalada da atual situação”.
Pequim, por meio da agência oficial de notícias Xinhua, também divulgou informações sobre a conversa entre os líderes chinês e russo. Ao expor a posição da China, Xi assinalou que “se o Oriente Médio é instável, o mundo inteiro não está a salvo”, pois “o conflito entre Israel e Irã provocou uma escalada repentina da tensão na região e tem um grave impacto na segurança mundial”.
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Para ele, “a força militar constitui um método incorreto para resolver as controvérsias internacionais e só aumenta o ódio e as divergências”. Por isso, considera o mandatário chinês, “as partes envolvidas no conflito, especialmente Israel, devem cessar imediatamente as operações militares para evitar uma espiral de escalada e que a guerra se estenda além da região, assim como respeitar estritamente o direito internacional, evitar categoricamente a morte de civis e facilitar a evacuação de cidadãos de terceiros países”.
Na opinião de Xi, “a via fundamental para sair da crise é por meio do diálogo e das negociações, sem os quais não será possível alcançar uma paz duradoura”.
O presidente da China considera ainda que a comunidade internacional, em particular as grandes potências que têm influência especial sobre as partes em conflito, “deveria redobrar os esforços para reduzir a tensão, e não o contrário”, numa alusão aos Estados Unidos. Nesse sentido, o Conselho de Segurança da ONU deveria desempenhar um papel fundamental.
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