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Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia, e Mark Rutte, Secretário-Geral da Otan (Foto: Otan / Flickr)

Terrorismo, estupros, torturas: o que não te contaram sobre a ofensiva “ucraniana” em Kursk

Casas foram saqueadas e incendiadas, famílias inteiras foram executadas... Os crimes da Ucrânia em Kursk contaram com a ajuda de países como o Reino Unido e são ignorados pela ONU

Alessandra Scangarelli Brites
Revista Intertelas
Porto Alegre (RS)

Tradução:

Conflitos armados, em especial durante a era da comunicação globalizada, acabam impactando a cobertura de muitos veículos jornalísticos, em especial daqueles que têm a capacidade de atingir um grande público. Diferente do que muitos podem pensar, veículos de comunicação de massa acabam não sendo imparciais, como muitas vezes gostam de aparentar. Em especial, as grandes empresas privadas do ramo possuem seus interesses e alianças. No caso da grande mídia brasileira, é histórica a sua aproximação e cooperação com grandes veículos de países do chamado Ocidente, a exemplo de EUA e países da Europa Ocidental. Quando o assunto é o conflito entre Rússia e Ucrânia, é clara a preferência destas empresas pelas versões que exaltam e focam atenção na experiência ucraniana, não permitindo ao lado russo mostrar a sua realidade dos fatos.

Imagem de vídeo divulgado pelo Ministério da Defesa da Rússia, uma imagem mostra um carro queimado em uma rua em Sudzha depois que forças russas entraram na cidade em meio à operação militar da Rússia na Ucrânia, na região de Kursk, Rússia. (Foto: Sputnik)

Neste ano, a Revista Intertelas participou de uma teleconferência realizada no dia 5 de junho de 2025, em que a temática foi a libertação de Kursk. Essa região da Rússia foi invadida e ocupada por uma ofensiva das forças armadas ucranianas, no período de 2024 a 2025. Este fato demonstrou que, muito além de se defender, a Ucrânia parece ter o objetivo de também atacar. Conforme será exposto nesta publicação, soldados ucranianos cometeram crimes contra a população civil local. Os relatos dos acontecimentos, em especial dos residentes que testemunharam e sofreram com as atrocidades cometidas, precisam ser também divulgados, para que o público em geral possa ter uma visão maior e mais detalhada do contexto presente de uma guerra que já impactou a economia e a estabilidade global de forma profunda.

O dia 26 de abril de 2025 foi um dia histórico para as Forças Armadas da Federação Russa, pois derrotaram os grupos armados ucranianos que haviam lançado a incursão em terras russas. Ao abrir a teleconferência, a chefe da Delegação da Federação Russa para as Negociações de Viena sobre Segurança Militar e Controle de Armas, Iulia Zhdanova, relembrou que a região de Kursk foi centro de batalhas estratégicas contra as forças da Alemanha nazista, durante a Segunda Guerra Mundial. Décadas depois, mais uma vez, a localidade serviu de cenário para novos ataques que, tanto do ponto de vista ideológico, quanto das ações cometidas remontam ao período de extrema violência do passado.

A chefe da Delegação da Federação Russa para as Negociações de Viena sobre Segurança Militar e Controle de Armas, Iulia Zhdanova. (Foto: Sputnik)

Conforme Zhdanova, o regime de Kiev agiu de forma terrorista. “Este ataque foi apresentado à comunidade global como uma operação para demonstrar a capacidade militar do exército ucraniano e melhorar as posições de negociação da Ucrânia. No entanto, os civis tiveram que abandonar suas casas, perderam o contato com seus parentes e, durante os combates da ocupação, enfrentaram atrocidades e torturas por parte de combatentes ucranianos. No estágio atual, a propaganda ucraniana e ocidental tentou ocultar os crimes do regime de Kiev. Infelizmente, essas atrocidades são ignoradas pelas organizações internacionais, incluindo as Nações Unidas e a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa”.

Já o embaixador-geral do Ministério das Relações Exteriores da RússiaRodion Miroshnik, que representou a República Popular de Lugansk e o subgrupo político do Grupo de Contato sobre a Ucrânia, buscando soluções políticas e diplomáticas para a futura coexistência pacífica entre Donbass e a Ucrânia, salientou que o ataque ucraniano durou quase nove meses e atingiu em torno de 200 mil civis. Conforme ele, mais de 155 mil pessoas foram evacuadas da região, capturadas por combatentes ucranianos ou sofreram em áreas inseguras devido aos constantes bombardeios e provocações das unidades armadas da Ucrânia. De acordo com ele, não foi por acaso que a cidade de Sudzha foi escolhida como ponto de partida para a incursão, pois o país possuía um gasoduto operacional importante que bombeava 40 milhões de toneladas de gás natural por dia da Rússia para a Europa.

O embaixador-geral do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Rodion Miroshnik. (Foto: Sergei Bulkin/TASS)

O ataque terrorista em larga escala, como a incursão de combatentes em território russo, não poderia ter sido preparado e executado sem o apoio ocidental. Primeiro, as unidades invasoras receberam grande quantidade de equipamento militar estrangeiro e os soldados rendidos confirmaram que muitos deles foram treinados no Reino Unido e em vários outros países europeus. Segundo, a incursão foi planejada e implementada com base em inteligência e imagens de satélite. Unidades ucranianas conseguiram chegar à rodovia que atravessa Sudzha; bloquearam o movimento do comboio de evacuação de civis que buscavam fugir daquela área…Drones ucranianos atingiram não apenas civis que buscavam proteção e apoio, mas também aqueles que correram para ajudá-los. Drones neonazistas mataram uma equipe de ambulância que estava a caminho do socorro, ferindo cidadãos locais, e apenas uma médica de emergência sobreviveu.Rodion Miroshnik
Imagem do vídeo divulgado pelo Ministério da Defesa da Rússia mostra carros queimados e prédios danificados em Sudzha depois que as forças russas entraram na cidade em meio à operação militar da Rússia na Ucrânia, na região de Kursk, Rússia. (Foto: Sputnik)

Ainda de acordo com ele, saques desenfreados ocorreram nas moradias que os combatentes conseguiam alcançar e, depois que os objetos de maior valor foram levados pelos militares, para concluir o trabalho, nas aldeias saqueadas, grupos inteiros de civis foram levados. Depois disso, as aldeias saqueadas foram incendiadas rua por rua, usando drones e lança-chamas portáteis.

Quando as tropas russas começaram a libertar a região de Kursk, muitos corpos de civis com vestígios de tortura, violência sexual e morte violenta foram encontrados. Mulheres foram estupradas e baleadas na cabeça. Homens e idosos foram torturados e mortos a tiros em suas casas. Mais tarde, seus corpos foram levados para o porão como se fossem sacos de lixo.

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Nas palavras de Miroshnik, um Comitê de Investigação instaurou 480 processos criminais e 186 acusações criminais foram levadas aos tribunais. 87 foram concedidas e sentenças foram proferidas contra 162 pessoas. O número exato de mortos e torturados por combatentes ucranianos só será conhecido após o fim da investigação. Ele conclui:

Os crimes cometidos pelas forças ucranianas na região de Kursk e pela liderança da Ucrânia devem ser avaliados de forma justa sob o direito internacional, e os responsáveis ​​devem ser punidos. Isso não será apenas um triunfo da justiça, mas também a avaliação do comprometimento da comunidade internacional com as normas civilizadas do direito internacional humanitário.

Representando a alta comissária para os Direitos Humanos na Federação Russa, Tatiana Moskalkova, Sergei Romanovitch relatou que sua equipe tem trabalhado intensamente, e não apenas fornecendo ajuda humanitária. Entre as demais iniciativas estão a reacomodação temporária de 2 mil pessoas, a busca por desaparecidos e o auxílio em trazer de volta para a Rússia cidadãos que foram levados para a Ucrânia pelos soldados invasores.

O trabalho da Sra. Moskalkova foi um exemplo da extraordinária abordagem a essa situação. Ela atuou na área dos direitos humanos e interagiu com as pessoas deslocadas dessa região por um longo período. Graças à sua participação ativa, 132 pessoas deslocadas à força e transferidas da região de Kursk foram trazidas de volta.
No dia 11 de agosto de 2024, a Agência Prensa Latina publicou notícia em que relata que a comissária russa para os Direitos Humanos, Tatiana Moskalkova, solicitou à ONU que condenasse o terror desencadeado pela Ucrânia com uma incursão armada na província de Kursk. (Foto: Prensa Latina)

Houve várias etapas. A primeira foi em 22 de novembro. Conseguimos trazer de volta 42 pessoas. O envolvimento ativo de outros serviços também foi observado na cooperação com a Cruz Vermelha e, como resultado do trabalho conjunto, da Administração Presidencial, do Ministério da Defesa, do Ministério das Relações Exteriores, dos Serviços de Guarda-Costas, da Cruz Vermelha Russa e do Gabinete do Governador da Região de Kursk, conseguimos alcançar resultados significativos. Observando o primeiro retorno dos residentes capturados e então deslocados à força da região de Kursk, as informações começaram a chegar das pessoas em território ucraniano. Eles identificaram suas localizações e com a atuação da Cruz Vermelha Internacional, do Ministério da Defesa e do Alto Comissariado para Refugiados, solicitamos a assistência no repatriamento desses cidadãos.

Os relatos dos sobreviventes

Nikolai Ivanovitch Kozlov não conseguiu fugir quando as tropas ucranianas chegaram a sua aldeia, onde diversas casas foram saqueadas.

Os primeiros que entraram em nossa localidade trataram os civis da maneira normal, mas a partir de 22 e 23 de agosto de 2024, os incêndios criminosos começaram. A rua inteira estava em chamas. Então, todas aquelas ruas foram queimadas, assim como as vizinhas. Mesmo com problemas físicos, eu e minha esposa fugimos para salvar nossas vidas… Depois, em razão do frio, retornamos, mas soldados permaneceram impedindo as pessoas de pegarem água no poço, atiraram nelas. Tive vizinhos que foram mortos a tiros. As pessoas tinham medo do morrer em razão dos drones FPV que circulavam. Foi muito difícil e assustador. Depois de um tempo, começaram os bombardeios: janelas explodiram, mas ainda assim sobrevivemos.

O mesmo grau de violência e barbárie foi relatado por Elena Ivanovna Zhadanova, chefe do Conselho do Distrito de Sudzhanski, na região de Kursk. Segundo ela, desde os primeiros dias da invasão pelas forças armadas ucranianas, diversos assentamentos, principalmente as aldeias de Ivashkovskii, Pravda, Cherkasskoe, Porechnoe, Russkoe Porechnoe, Kasitsa, Kireevka, Bakhtinka e Leontvika foram ocupados.

No momento da invasão do território restavam 92 pessoas. Nos primeiros meses, 10 pessoas conseguiram milagrosamente sair de lá com vida. Para que vocês entendam, apenas idosos, principalmente idosos, permaneceram lá. Eles não queriam sair de suas casas. Disseram que era a terra deles e que não iriam a lugar nenhum.

Conforme Zhadanova, os sobreviventes contaram histórias realmente assustadoras, como a de moradores que permaneceram na região e sofreram ataques de drones FPV. Famílias inteiras foram mortas. Segundo ela, os soldados ucranianos não deixaram os moradores nem pegar água nos poços próximos, limitando muito liberdade de ir e vir.

Durante o período da libertação dos assentamentos das aldeias de Rusk e Cherkasy, no primeiro semestre de 2025, quando corpos começaram a ser retirados, visualmente mostravam que foram torturados. Traços de eletrochoques, braços e pernas quebrados, além de fraturas expostas de membros estavam visíveis nos corpos. Uma mulher nascida em 1941, que estava andando pela rua, levou dois tiros nas costas. O que essa avó poderia ter feito a eles? Ela morava nesta aldeia desde que nasceu e ela encontrou a morte lá de uma forma tão terrível… Eles queimaram casas de propósito, usando drones FPV. Eles destruíram completamente nossos assentamentos. Eles os varreram da face da Terra.

Elena Anatolyevna Drugan, que foi atingida por tiros, teve de fugir de seu prédio que colapsou após uma explosão, e viu pessoas serem mortas, também descreveu seus momentos de horror para o público. Nas palavras dela, os soldados chegaram no dia 6 de agosto de 2024. Por dois meses, eles não permitiram que sua família fosse ao centro da cidade para pegar mantimentos.

Em 18 de outubro de 2024, enquanto saíamos para pegar batatas e soltar os cachorros que permaneceram por lá, um tiroteio começou e fui atingida. Pensei que seríamos mortos. Atiraram em nossas pernas e mãos deliberadamente e riram da nossa situação. No mesmo dia, atiraram em um homem que simplesmente perguntou o que eles queriam, mas eles atiraram nele. Lembro ainda de duas mulheres, uma cadeirante e uma idosa. Jogaram uma granada que explodiu próximo delas, e a cadeirante pediu ajuda depois, e as pessoas a levaram embora.

pai de Drugan ficou com parte do corpo paralisado durante a ocupação e teve assistência de uma ajudante, chamada Olga. De acordo com Drugan, ela permaneceu em uma nova casa com outras pessoas e seu pai ficou morando em outro imóvel com outras pessoas e a ajudante.

Em 21 de outubro de 2024, nossos militares chegaram, mas Olga não conseguiu chegar até o meu pai porque havia unidades ucranianas ainda. À noite um tanque apareceu, começamos a ser atingidos com gás e houve explosões. Meu pai foi queimado vivo, meus braços e pernas foram atingidos por tiros. Drones mataram pessoas. Não foi permitido à população civil evacuar.
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A responsabilidade do ocidente e o apoio da Otan

Para o especialista e autor de publicações sobre conflitos armados recentes e sobre a história das Forças Armadas da Federação Russa, Ivan Konovalov, a incursão na região de Kursk foi, na verdade, uma ação de relações públicas de Zelensky e seus cúmplices. Contudo, em vez da demonstração de conquistas militares, a Ucrânia perdeu a iniciativa militar na linha de conflito e, sob pressão das forças militares russas, foi forçada a recuar.

No início desta incursão, as tropas ucranianas conseguiram conquistar cerca de 1.000 quilômetros quadrados de território e cerca de 90 assentamentos na região de Kursk. A seleção de alvos foi baseada nas informações fornecidas pelos países da Otan. Armas ocidentais como o BMP Bradley, o APC Stryker, o BMP Marder de fabricação alemã, o AMX-10 francês, o CV90 sueco, o US Mars-Pro, o Augur, o Humvee, o Shield italiano e o Shelby Senator canadense foram usados ​​na invasão.Ivan Konovalov

Já o chefe do Departamento de Projetos Especiais do Escritório do Alto Comissariado para os Direitos Humanos na Federação RussaIgor Kashin, apresentou uma análise jurídica da situação. Para além de violações das Convenções de Genebra e outros protocolos internacionais, ele disse que evidências foram submetidas à ONU e ao TPI, contudo não resultaram em ações concretas dessas organizações. Por fim, Olga Kirii, cineasta e documentarista russa, apresentou em suas imagens um cenário de devastação com escolas destruídas e residências e prédios em chamas. O documentário, que você pode conferir com áudio e legendas em inglês ao clicar na imagem abaixo, conta com depoimentos de soldados ucranianos admitindo terem matado, estuprado, roubado e atacado civis. Seu filme retrata uma realidade que muitos no ocidente pareceram querer ignorar, ou pior, escolheram compactuar com mais uma barbárie histórica contra inocentes.

“Kursk. Shoulder to Shoulder”, por Olga Kirii. Para assistir com áudio e legendas em inglês, clique na imagem. (Foto: Russia Today)


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

Alessandra Scangarelli Brites Jornalista (PUCRS) e pesquisadora. Especialista em Política Internacional (PUCRS) e Mestre em Estudos Estratégicos Internacionais (UFRGS). Editora-chefe da Revista Intertelas.

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