Pesquisar
Pesquisar
Zola Xavier da Silveira protesta no RJ contra ocupação da sede da Ures (Foto: Janete Celano)

Tomada pela ditadura em 1964, sede do movimento estudantil de RO segue ocupada por militares

Localizado no centro histórico de Porto Velho, o Palacete do Rio Madeira abrigou a União Rondoniense dos Estudantes Secundaristas (Ures), um polo de mobilização política e cultural que despertou a ira das oligarquias locais

Carolina Mello
Diálogos do Sul Global
Porto Velho

Tradução:

Em um ato público em memória do ex-deputado federal Rubens Paiva, realizado em janeiro de 2025, no Rio de Janeiro (RJ), um homem se destacou dos presentes ao levantar um cartaz com a frase “Rondônia, o Exército ocupa a sede dos estudantes desde o Golpe de 64”.

Seu nome é Zola Xavier da Silveira, jornalista e escritor, nascido no distrito de Fortaleza do Abunã, localizado a 263 km de Porto Velho (RO). Atualmente, mora no município de Maricá (RJ).

Em janeiro de 2008, Zola voltou à capital rondoniense para pesquisar sobre a vida de seu pai, o militante comunista e jornalista Dionísio Xavier da Silveira, conhecido como Dió, com quem perdeu contato desde que saiu de Rondônia, quando tinha 16 anos. 

Em meio às buscas, analisando jornais e documentos antigos, além de ouvir depoimentos de testemunhas e lideranças políticas que viveram na época, o jornalista descobriu histórias que não foram apenas esquecidas, mas propositalmente apagadas.

Após esse resgate, ele escreveu e publicou o livro Uma Frente Popular no Oeste do Brasil, lançado em 2023, onde faz uma revelação contundente: o imóvel hoje conhecido como Palacete Rio Madeira, localizado no centro histórico de Porto Velho, foi a sede da União Rondoniense dos Estudantes Secundaristas (Ures).

“Peles curtas” x “cutubas”

No início da segunda metade do século passado, as chaves do imóvel foram entregues nas mãos de João Lobo, então presidente da Ures, pelo deputado federal Renato Medeiros — a principal liderança dos “peles curtas”, grupo que constituía a Frente Popular e fazia oposição aos “cutubas”, que representavam os interesses das oligarquias do antigo Território Federal de Rondônia, que se tornaria estado somente em 1982.

Zola Xavier da Silveira protesta no RJ contra ocupação da sede da Ures (Foto: Janete Celano)

Com forte apoio do movimento estudantil, Medeiros foi eleito em 1962, em uma das mais trágicas campanhas políticas da história de Rondônia, por conta de um atentado político que aconteceu em seu comício.

Em uma noite de setembro daquele ano eleitoral, um caminhão basculante – ou “caminhão caçamba” – foi usado para atingir o público presente no ato político, deixando dezenas de feridos e dois mortos, que estão enterrados no Cemitério dos Inocentes, em Porto Velho. 

Nunca apurado pelas autoridades locais e superficialmente abordado pela imprensa da época, o episódio ficaria conhecido popularmente como “Caçambada Cutuba”.

Centro político e cultural tomado pela repressão

Considerada uma das maiores conquistas do movimento estudantil, a sede da Ures chegou a abrigar Centro Popular de Cultura (CPC), da União Nacional dos Estudantes (Une), e se tornou um verdadeiro polo de mobilização política e cultural, o que despertou a ira das classes dominantes. 

“Dali partiram campanhas de alfabetização, apresentações teatrais para operários da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré e camponeses da região, além da organização de movimentos em defesa das reformas de base do governo João Goulart”, descreve Zola Xavier.

Com o golpe de 1964, a repressão desmontou a estrutura estudantil, e o prédio foi tomado por ordem do tenente-coronel Cunha Menezes, interventor nomeado pelos militares, que cedeu o edifício ao uso das Forças Armadas.

A ocupação, como denuncia Zola, permanece até os dias atuais, sem qualquer perspectiva de devolução formal à sociedade. 

“Os militares deveriam agora, por uma questão de coerência, devolver esse prédio que não pertence às Forças Armadas. É um bem público que foi tomado”, pontua o escritor.

  • Texto alterado em 28/04/2025, às 18h00. Crédito na imagem: Janete Celano. “Cemitério da Saudade” foi modificado para “Cemitério dos Inocentes”.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

Carolina Mello Jornalista formada com mais de 10 anos de experiência na área de comunicação. Paulista de nascimento, rondoniense de coração. É fundadora do blog Rondônia Plural, onde escreve notícias e artigos sobre direitos humanos, política e meio ambiente.

LEIA tAMBÉM

A verdade sobre a PL 42525 Conib acusa Lula de antissemitismo para calar críticos ao sionismo
Após acusações de antissemitismo contra Lula, Fepal escancara real objetivo do PL 472/25
Operação Condor” apoio dos senadores Humberto Costa e Teresa Leitão
“Operação Condor”: apoio da senadora Teresa Leitão fortalece produção da série
Sal 500% mais caro comparação de preços Brasil x Argentina prova fracasso econômico Milei
Sal 500% mais caro: o que comparação de preços Brasil x Argentina revela sobre Milei
Mídia brasileira é o grande problema nacional, afirma Leonardo Attuch
"Mídia brasileira é o grande problema nacional", afirma Leonardo Attuch