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Hanoi, capital do Vietnã (Foto: Minh Luu / Unsplash)

Top 15 em investimento estrangeiro, Vietnã reinventa socialismo e consolida protagonismo global

Com um Estado presente, mas não onipresente, e uma economia aberta, o Vietnã se projeta para o futuro como um ator confiável, dinâmico e relevante entre as nações do Sudeste Asiático

Gastón Fiorda
TIEMPO ARGENTINO
Buenos Aires

Tradução:

Ana Corbisier

Desde o fim da Guerra Fria e o colapso do bloco socialista, o Vietnã percorreu um caminho de inserção estratégica na comunidade internacional. Passou do isolamento diplomático a estabelecer relações com 165 países, incluindo os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). Aderiu ativamente a plataformas de integração regional como a Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) e seus órgãos derivados — Área de Livre Comércio (AFTA), Fórum Regional (ARF) e Área de Investimento (AIA) —, assim como a fóruns globais, incluindo a Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (APEC) e a Organização Mundial do Comércio (OMC), consolidando seu protagonismo econômico e geopolítico.

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Essa mudança de paradigma deveu-se à adoção do programa de reformas do Doi Moi, que representou uma guinada radical na concepção de seu desenvolvimento. O Vietnã abandonou a rigidez do planejamento estatal e a mercadofobia, adotando uma economia mista com presença de capital privado – e estrangeiro – sob regulamentações oficiais. Essa abertura foi pensada como uma forma de fortalecer sua soberania econômica por meio da atração de investimentos e tecnologia, sem ceder o controle estratégico do Estado sobre setores-chave, como o energético e o mineral.

A economia vietnamita cresceu 7,09% em 2024, superando as previsões oficiais de 6,5%, com um notável aumento de 14,3% nas exportações (405,53 bilhões de dólares) e um investimento estrangeiro direto (IED) de mais de 38 bilhões de dólares no ano, situando-se entre os 15 principais destinos globais de capital estrangeiro. Apenas no primeiro trimestre de 2025, recebeu mais de 11 bilhões em IED, um sinal de confiança estrutural em seu modelo de desenvolvimento.

Principais parceiros comerciais

No plano bilateral, a China continua sendo o principal parceiro comercial do Vietnã, com um intercâmbio que superou os 205 bilhões de dólares em 2024. Durante a recente visita do presidente Xi Jinping a Hanói, foram assinados 45 acordos em setores estratégicos como inteligência artificial, 5G, comércio agrícola, cooperação aduaneira e desenvolvimento de cadeias de suprimento.

Xi Jinping expressou a disposição da China em ampliar os investimentos no Vietnã e fortalecer os vínculos em setores tecnológicos avançados. Por sua vez, To Lam, secretário-geral do PCV, propôs que a transformação digital seja o eixo da cooperação bilateral, em consonância com a estratégia nacional de desenvolvimento do Vietnã até 2045.

Também houve um fortalecimento dos laços com os Estados Unidos, seu principal mercado de exportação (149,6 bilhões de dólares em comércio bilateral em 2024). No entanto, as fricções comerciais globais colocaram esse vínculo sob tensão, já que Washington decidiu modificar o regime tarifário, afetando as expectativas vietnamitas – medida que foi suspensa temporariamente após negociações iniciadas no início de 2025.

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No plano euroasiático, a União Europeia considera o Vietnã um parceiro confiável e prioritário na região. Em um recente encontro em Hanói, o embaixador da UE, Julien Guerrier, reafirmou o compromisso de Bruxelas em apoiar a meta vietnamita de tornar-se um país desenvolvido até 2045 e alcançar emissões líquidas zero em 2050. O Acordo de Livre Comércio UE-Vietnã (EVFTA) é uma das ferramentas fundamentais dessa parceria, permitindo acesso preferencial mútuo a mercados-chave.

Predomínio ideológico e renovação

Do ponto de vista histórico e material, o PCV reivindica o Doi Moi como uma manifestação dialética do socialismo vietnamita. A coexistência de elementos de mercado com mecanismos de planejamento centralizado não é vista como uma contradição insuperável, mas sim como uma forma particular de desenvolvimento socialista.

Essa concepção ganha relevância ao se considerar os efeitos sociais e econômicos positivos gerados pela abertura ao investimento estrangeiro, pela liberalização progressiva do comércio, pela descentralização da gestão econômica e pelo estímulo ao setor privado.

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A categoria-chave para compreender essa coexistência é a de “economia de mercado com orientação socialista”: um conceito híbrido que reconhece a funcionalidade de certas ferramentas de mercado para o desenvolvimento produtivo, mas que mantém como horizonte a justiça social, a propriedade coletiva nos setores estratégicos e a direção do Partido.

Em suma, em um mundo em reconfiguração, o Vietnã emerge como um caso singular de estabilidade, crescimento e diplomacia pragmática. Com um Estado presente, mas não onipresente, e uma economia aberta, projeta-se para o futuro como um ator confiável, dinâmico e relevante no conjunto de nações do Sudeste Asiático.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

Gastón Fiorda Jornalista, escritor, graduado em Filosofia, mestre em Direitos Humanos e doutorando em Ciências Sociais pela Universidade de Buenos Aires (UBA).

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