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Resta se perguntar: o mundo perecerá vítima da carga nuclear que hoje assoma na ponta dos mísseis? (Imagem: Rawpixel)

Uma humanidade em risco entre guerras justas e guerras injustas

O aumento da tensão entre os Estados beligerantes representa, sem dúvida, um risco à sobrevivência dos seres humanos; em momentos como esse, é válido recordar uma das lições deixadas por Lenin

Gustavo Espinoza M.
Diálogos do Sul Global
Lima

Tradução:

Beatriz Cannabrava

A guerra se perfila perigosamente no horizonte dos povos, não só como uma ameaça imensa, mas também como uma realidade tangível.

Além dos discursos incendiários, das ameaças agressivas e das proclamações exaltadas, estão os fatos, e eles se expressam em cidades bombardeadas, céu iluminado por mísseis e explosões, numa crescente soma de mortos e afetados pela insensatez de um conflito que se desenvolve pela vontade de alguns, mas que compromete a sorte de muitos.

A guerra – costuma-se dizer – é um fenômeno em que pessoas que se odeiam não se enfrentam; e em que pessoas que não têm razão alguma para se odiar, se enfrentam e se matam.

Essa é um pouco a diferença entre governantes que orquestram operativos militares e governados que simplesmente vão à frente com a ideia de que acabar com a vida do rival será o único modo de assegurar a própria vida.

Irã, a fortaleza persa

Hoje ninguém duvida de que a guerra escalou um passo mais alto desde que Israel atacou de surpresa o Irã – um país muito rico em petróleo e urânio – provocando inclusive a morte de cientistas nucleares altamente qualificados e de chefes revolucionários de primeiro escalão, como o comandante geral da Guarda Revolucionária Islâmica, Hossein Salami.

Curiosamente, o Irã não é propriamente uma nação árabe, mas persa, com cultura e história próprias, e que por optar por soberania e independência, carrega sobre os ombros o mesmo ódio dirigido por Israel.

Terra de Dario – “aquele que busca sempre o bem” – a Pérsia de hoje é um dos países mais importantes da região e um dos mais poderosos. Une às riquezas naturais que possui uma vasta cultura, uma história lendária e um povo igualmente lendário que se abriu caminho lutando duramente contra a adversidade.

Ainda se recorda a tragédia de Mohammad Mosaddegh, derrubado por um golpe de Estado em agosto de 1953, preparado pela inteligência britânica e pela CIA, por ter nacionalizado o petróleo. Hoje, além do petróleo, o Irã tem urânio. E por isso é um bocado saboroso e apetecido pelo “Ocidente”.

O governo sionista de Israel, melhor armado e com mais experiência de guerra que seu adversário de hoje, decidiu golpeá-lo de surpresa, atacando o regime dos aiatolás.

Aparentemente, apenas Donald Trump sabia da ação, motivo pelo qual determinou a retirada de seu pessoal diplomático de Teerã 24 horas antes que caíssem os primeiros projéteis enviados desde Tel Aviv.

Forças subestimadas

Desde então, não cessaram os ataques, nem sobre o céu iraniano, nem sobre o céu israelense. E a destruição registrada em um e outro país tem sido tão ostensiva que ninguém pôde ocultá-la. Pela primeira vez, Netanyahu encontrou verdadeira resistência.

Em suas incursões anteriores, destinadas a bombardear solo palestino, tudo lhe saiu mais fácil. As crianças não lhe responderam com fogo cruzado. Simplesmente morreram.

Agora os habitantes de Israel têm que suportar, como nunca antes, o ataque de adversários decididos e bem armados, que não estiveram dispostos a lhes ceder a iniciativa e lhes responderam golpe a golpe. Dotados de mísseis balísticos de primeiro nível, os governantes de Teerã jogaram de igual para igual com seus pares de Tel Aviv na cancha da morte.

A crise gerou o alinhamento automático das forças que operam no âmbito mundial. Rússia e China expressaram sua vontade solidária com o país atacado. A mesma predisposição veio da República Popular Democrática da Coreia e, naturalmente, do Vietnã. Mas o mundo árabe, incluindo a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos, também fechou filas com a antiga Pérsia.

A grande estratégia do Império não mudou: em Washington, continua-se pensando que a guerra já iniciada culminará no enfrentamento com a China (Foto: Rawpixel)

Os governantes de Israel – a camarilha sionista de Netanyahu – parecem não se dar conta da magnitude da força que têm pela frente. E por isso cometem erros quase infantis: recentemente enviaram à China aviões caça furtivos para missões de espionagem. Detectados, estes foram apagados do espaço, como se nunca o tivessem visitado. E isso deve ser levado muito a sério por aqueles que os enviaram para uma morte certeira. Parecem não ter consciência de que, num enfrentamento com a República Popular da China, não durariam nem cinco minutos.

Ucrânia, uma guerra perdida

De todo modo, Israel tem aliados. Os Estados Unidos são o primeiro, mas também a União Europeia e a Inglaterra. Por ora, essa aliança anda ocupada na Ucrânia, onde sabem que têm uma causa perdida, mas ânimo bélico não lhes falta. Soma-se também a Argentina de Milei, que se sente parte do trio de uma amarga aliança. Um trípode sinistro, com Israel e os Estados Unidos.

A Casa Branca, principal aliado de Israel, não está em seu melhor momento. E não é para menos: enfrenta duras crises econômicas, sociais e políticas, além de ser golpeada por severas contradições internas que a levaram a um sério enfrentamento entre o governo federal e a administração estadual da Califórnia, que encontrou respaldo em vastas regiões e numerosas cidades da União.

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Hoje, curiosamente, nas terras do Tio Sam, a instabilidade e o desgoverno são expressões paralelas. Nas ruas, há violência e caos. Também morte – e nos mais altos níveis.

A Ucrânia, governada por uma tenebrosa camarilha neonazista, perde a cada dia dezenas de quilômetros no território que formalmente administra. Na prática, o avanço das tropas russas por aquele solo torna-se indetenível. Por saberem disso, os meios de comunicação optaram por se calar, uma sutil maneira de “defender” a liberdade de imprensa: reservar-se o direito de não informar quando estão perdendo.

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É previsível que, em algumas semanas, Zelensky se veja forçado a capitular ou fugir. Sua administração já não se sustenta. E seus próprios aliados lhe vaticinam uma derrota anunciada.

Não obstante, a grande estratégia do Império não mudou. Em Washington, continua-se pensando que a guerra já iniciada culminará no enfrentamento com a China. Resta se perguntar, no entanto, se o mundo chegará a esse momento ou se perecerá antes, vítima da carga nuclear que hoje assoma na ponta dos mísseis.

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À medida que passam os dias e se tensionam ainda mais as relações entre os Estados beligerantes, aumentará o risco à sobrevivência da humanidade.

Neste contexto, a bandeira dos povos é a paz. No entanto, é lícito recordar também a diferença que fez Lenin entre guerras justas e guerras injustas. A agressão israelense contra os povos árabes e contra o Irã é o típico exemplo de uma guerra injusta.

E a que enfrenta o Irã, em defesa de sua independência e soberania, ou o povo palestino, por seu direito a existir, são guerras justas.

E também é justa – justíssima, sem dúvida – a que o mundo trava contra o ressurgimento do fascismo. Não devemos esquecê-lo.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

Gustavo Espinoza M. Jornalista e colaborador da Diálogos de Sul em Lima, Peru, é diretor da edição peruana da Resumen Latinoamericano e professor universitário de língua e literatura. Em sua trajetória de lutas, foi líder da Federação de Estudantes do Peru e da Confederação Geral do Trabalho do Peru. Escreveu “Mariátegui y nuestro tiempo” e “Memorias de un comunista peruano”, entre outras obras. Acompanhou e militou contra o golpe de Estado no Chile e a ditadura de Pinochet.

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