O governo dos Estados Unidos deixou claro seu apoio inequívoco a Israel ao emitir o único voto contrário e com isso anular uma resolução ante o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas redigida pelo Brasil, que apelava apenas por “uma pausa humanitária” no conflito de Israel e palestinos em Gaza – uma posição que nem os aliados mais próximos de Washington como França e Reino Unido estavam dispostos e endossar, mas que aparentemente tem enorme apoio entre o público estadunidense.
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O veto estadunidense serviu para sublinhar a mensagem da viagem do presidente Joe Biden de abraçar pessoalmente a posição do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, mesmo depois que líderes palestinos e árabes expressaram que não se reuniriam com o mandatário estadunidense até que se possa frear o conflito armado.
Porém, o voto no Conselho de Segurança também serviu para demonstrar um crescente isolamento dos Estados Unidos em sua posição de apoiar plenamente o direito de Israel de responder ao ataque de Hamas com um tremendo ataque contra a população civil de Gaza – 12 dos 15 membros do Conselho de Segurança votaram a favor da “pausa humanitária”, Rússia e Reino Unido se abstiveram e só Washington votou contra.
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Buscando explicar o veto, a embaixadora estadunidense ante a ONU afirmou que a resolução fracassou em reconhecer “o direito de Israel à autodefesa” – palavras-chave empregadas para apoiar a estratégia militar israelense. Funcionários estadunidenses argumentam que, no privado, Biden está propondo a mesura na resposta de Israel e que publicamente reitera que as democracias devem apegar-se às “regras de guerra” internacionais como parte desta estratégia diplomática.
Latuff
99 dos 100 senadores federais aprovaram uma resolução de apoio ao chamado "direito de Israel à sua autodefesa", sem mencionar Gaza
Termo proibido
Mas o circuito oficial de Washington continua proibindo, mesmo ante o crime de guerra de bombardear um hospital, o uso da expressão “cessar-fogo” ou “diminuição” em suas referências ao conflito. De fato, nesta quarta-feira (18), a embaixadora Thomas-Greenfield repetiu a acusação de que são “as ações do Hamas que criaram isto – esta crise humanitária severa”, enquanto funcionários no Pentágono se recusaram nesta semana a comentar sobre se acreditam que o crescente número de civis assassinados nos bombardeios de Israel são todos simpatizantes ou militantes do Hamas, ou civis usados pelo Hamas como “escudos humanos”.
Enquanto isso, o governo de Biden continua tratando de mostrar que, junto a seu apoio pleno a Israel, também está “preocupado” com a emergência humanitária em Gaza. O Departamento de Estado anunciou que a Casa Branca prepara um pacote de 100 milhões de dólares em ajuda humanitária para a população civil em Gaza, declarando que “civis não devem ser culpados e não deveriam sofrer pelo terrorismo horrendo do Hamas.
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As vidas civis devem ser protegidas e a assistência deve chegar urgentemente aos mais necessitados”. Além disso, reafirma que está trabalhando com “sócios” na região para “enfatizar a importância de manter a lei de guerra”. Diz que a assistência será dirigida para “mais de um milhão de pessoas deslocadas e afetadas pelo conflito”, embora evite abundar na causa desta crise humanitária, incluindo quem ordenou o deslocamento e o bombardeio desta população.
Além disso, o comunicado não menciona que o governo de Biden está preparando um pacote de talvez dezenas de bilhões de dólares em assistência para Israel e Ucrânia em suas respectivas guerras.
Alguns analistas estadunidenses advertem sobre a decisão de Biden de prosseguir com sua viagem depois do bombardeio do hospital em Gaza, com o subsequente cancelamento do encontro com os países árabes, e por seu apoio a Israel, enquanto se incrementa a taxa de mortes dentro de Gaza, comentou o professor Rashid Khalidi da Universidade de Columbia, especialista na história da relação entre Israel, a Palestina e os Estados Unidos, em entrevista à Democracy Now nesta quarta-feira.
Ele aponta que, ante o engano sistemático de Israel sobre suas operações militares no passado, e o fato e ter lançado pelo menos 6 mil bombas sobre Gaza nos últimos 11 dias, será muito difícil convencer o mundo árabe e quase qualquer ator, com exceção dos Estados Unidos e da Europa, de que o do hospital não foi culpa de Israel.
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Com Biden continuamente apoiando incondicionalmente Israel, como o fez em sua visita hoje, “fez os Estados Unidos responsáveis aos olhos do mundo por tudo isto”, o que terá consequências não só em Israel e nos territórios palestinos. Grande parte do mundo perceberá os Estados Unidos como cúmplices de Israel em tudo o que acontecer em seguida.
Mas o crescente isolamento de Washington no nível internacional não está prejudicando o presidente Biden dentro de seu próprio país. Pesquisas registram um crescente apoio para Israel e maiorias de simpatizantes de ambos os partidos políticos nacionais apoiam o envio de mais assistência militar ao governo de Netanyahu.
99 dos 100 senadores federais endossaram uma resolução que será aprovada nos próximos dias condenando o Hamas, brindando apoio incondicional ao chamado direito de Israel à sua autodefesa, mas sem uma só menção à situação em Gaza. Biden anunciou que oferecerá uma mensagem à nação ao vivo pela televisão sobre estes temas.
Jim Cason e David Brooks | La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.
Tradução: Beatriz Cannabrava
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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