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Não chores por mim, Argentina, chores por ti

Desde domingo (19), ouvimos por todos os meios de comunicação tentativas de entender e explicar o que significará a nova gestão do país vizinho
Caio Teixeira
ComunicaSul
Buenos Aires

Tradução:

Milei, assim como Bolsonaro, nunca escondeu o que pretendia. Sempre deixou explícitas as promessas de dolarizar a economia, fechar o Banco Central e privatizar absolutamente tudo o que ainda não foi entregue.

Nas suas primeiras manifestações, o presidente eleito já afirmou que vai privatizar os meios de comunicação públicos e a empresa petroleira YPF pela segunda vez. Depois de vendida por Menen, ela foi reestatizada por Cristina Kirchner. Apesar de esta segunda-feira pós-eleição ter sido feriado na Argentina, as ações da YPF já subiram na Bolsa de Nova Iorque, deixando claro o interesse do capital internacional em literalmente comprar o país vizinho.

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Muitos economistas prevêem uma corrida ao dólar tão logo abra o mercado nesta terça (21) o que deve provocar o aumento drástico do seu valor e consequente impacto na capacidade de compra dos salários pagos em pesos que começam a desvalorizar no momento em que são recebidos.

Milei conseguirá maiorias no Congresso para aprovar seu programa?

Do Brasil, a maior interrogação é se Milei terá maioria no Congresso para aprovar suas mudanças radicais. Pois bem, os peronistas elegeram 107 deputados na coalizão de Massa e mais 7 dissidentes independentes que se posicionam à direita da bancada majoritária, cujos votos são sempre uma incógnita. A direita tradicional da coalizão Juntos por el Cambio, de Patrícia Bullrich vai contar com 94 deputados que tendem a atuar em bloco com os 39 deputados eleitos pela coalizão de Milei. Além, desses há mais 4 deputados da Frente de Esquerda e outros 6 não alinhados com nenhuma dessas forças. No Senado a situação é mais favorável aos peronistas que elegeram 35 senadores contra 24 do Juntos por el Cambio de Bullrich, 7 de Milei, 3 peronistas de direita e outros 3 não alinhados a nenhum desses.

Para saber mais sobre a disputa eleitoral no país, confira nossa editoria especial: Eleições na Argentina.

Para aprovação de leis comuns é necessário o voto de metade mais um dos membros de cada casa, e, em alguns casos, apenas dos presentes e o novo governo em tese os teria. Já para reformas constitucionais, o quórum exigido é de 3/5, ou seja 155 deputados e 43 senadores e Milei não os tem. Ou seja, se votarem em bloco os peronistas conseguem sozinhos impedir qualquer reforma constitucional, mas não são suficientes para impedir aprovação de leis ordinárias. Entretanto, a direita de Milei-Bullrich escolherá os presidentes da Câmara e do Senado para o que necessitam apenas de maioria simples.

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Desde domingo (19), ouvimos por todos os meios de comunicação tentativas de entender e explicar o que significará a nova gestão do país vizinho

Foto: Hernán Piñera/Flickr

Preparem-se para o pior, servidores públicos, vocês vão perder empregos e direitos e os usuários amargarão cortes nos serviços essenciais




Não vai ser tão fácil

Ocorre que durante o governo de Carlos Menen, contemporâneo de Fernando Henrique Cardoso no Brasil e parceiro na implementação do neoliberalismo nos anos 90, se eliminou da Constituição os impedimentos para privatizar estatais, necessitando para isso apenas uma lei. Entretanto para extinguir a moeda nacional e o Banco Central é necessária uma reforma constitucional e isso só será possível se os direitistas conseguirem cooptar deputados e senadores peronistas. Para dolarizar a economia do país, Milei vai ter muito trabalho e obstáculos. Além disso, enfrentará interesses de parte empresariado e dos bancos que durante a campanha já se manifestaram, contrários à medida.

Talvez sabendo das dificuldades, ele já admitiu que o processo de troca de moeda pode durar de 12 a 18 meses. A medida atende diretamente aos interesses estadunidenses que querem a todo custo impedir o abandono do dólar como moeda de transações internacionais em curso no mundo a partir da iniciativa dos BRICS e do próprio Mercosul que já deixou de utilizar aquela moeda no comércio entre os membros do grupo. Neste sentido, o presidente eleito da Argentina já declarou que a política externa do país se alinhará aos EUA e Israel, que serão destino de suas primeiras visitas oficiais, exatamente como fez Bolsonaro.


Trabalhadores preparem-se para as primeiras medidas

Durante esta segunda-feira Milei falou a diversos veículos de comunicação e antecipou algumas medidas que devem ser prioritárias e outras nem tanto. Os trabalhadores que o agraciaram com seus votos já podem ter uma ideia do que os espera.

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Dentre outras coisas, fiel ao princípio de Estado Zero, prometeu revogar a “Lei dos Aluguéis”, uma conquista dos inquilinos que estabelece prazo mínimo para os contratos, índices máximos de reajuste, proibição de cobrança antecipada e de vinculação ao dólar, dentre outras garantias essenciais a quem vive de salários. Os aluguéis serão tratados como contratos comerciais acertados livremente entre proprietários e inquilinos estabelecendo assim, a “liberdade” dos especuladores de cobrar o que bem entenderem.

Sobre a YPF, disse que vai demorar até dois anos para privatizar pois a empresa tem que ser preparada antes de colocada à venda. A “preparação” é o padrão em todas as privatizações e significa demissão em massa para que os novos donos possam recontratar pela metade do salário. É o que acontece em 100% dos casos.
As melhorias no valor ridículo das aposentadorias, promessa de campanha, vão ter que esperar, sem prazo, pois “há outros temas na frente”.

A espera não fica por aí. O primeiro ato anunciado para o “ajuste fiscal” será paralisar as obras públicas, o que, segundo economistas pode significar de imediato algo em torno de 250 mil empregos extintos. Aliás, ele afirmou textualmente que “o setor público vai pagar o ajuste”. Ou seja, preparem-se para o pior, servidores públicos, vocês vão perder empregos e direitos e os usuários amargarão cortes nos serviços essenciais. E preparem-se logo para golpes duros pois o futuro presidente avisou: “não há lugar para gradualismos nem fraquezas”. Em nome da “liberdade”, o autointitulado “libertário” avisa que serão anulados todos os controles de preços impostos pelo Estado.

Finalmente, sobre a política monetária, perguntado sobre a dolarização, avisou que a primeira medida será fechar o Banco Central e deixar as pessoas livres para escolher que moeda usar. E pensem bem antes de protestar pois Milei, hoje, deixou claro que vai reprimir duramente manifestações. Tudo em nome da Liberdade, é claro.

Caio Teixeira | De Buenos Aires, para ComunicaSul.


*A reprodução deste conteúdo é livre e gratuita, desde que citadas a fonte e a lista de entidades apoiadoras da cobertura. A Agência ComunicaSul está cobrindo as eleições de 2023 na Argentina graças ao apoio das seguintes entidades: jornal Hora do Povo, Diálogos do Sul, Barão de Itararé, Portal Vermelho, Correio da Cidadania, Agência Saiba Mais, Agência Sindical, Viomundo, Fórum 21, Instituto Cultiva, Asociación Judicial Bonaerense, Unión de Personal Superior y Profesional de Empresas Aerocomerciales (UPSA), Sol y Sombra Bar, Federação dos Trabalhadores em Instituições Financeiras do RS (Fetrafi-RS); Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe-RS); Sindicato dos Metalúrgicos de Guarulhos; Federação dos Comerciários de Santa Catarina; Confederação Equatoriana de Organizações Sindicais Livres (CEOSL); Sindicato dos Comerciários do Espírito Santo; Sindicato dos Hoteleiros do Amazonas; Sindicato dos Trabalhadores das Áreas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisa, e de Fundações Públicas do Rio Grande do Sul (Semapi-RS); Federação dos Empregados e Empregadas no Comércio e Serviços do Estado do Ceará (Fetrace); Federação dos Trabalhadores no Comércio e Serviços da CUT Rio Grande do Sul (Fetracs-RS); Intersindical, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Central Única dos Trabalhadores do Paraná (CUT-PR); Associação dos Assistentes Sociais e Psicólogos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (AASPTJ-SP), Federação dos/as Trabalhadores/as em Empresas de Crédito do Paraná (FETEC-PR), Sindicato dos Trabalhadores em Água, Resíduos e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema-SP); Sindicato dos Trabalhadores em Água, Resíduos e Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina  (Sintaema-SC), Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada no Estado do Paraná (Sintrapav-PR), Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp Sudeste-Centro), Sindicato dos Escritores no Estado de São Paulo, Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário Federal de Santa Catarina (Sintrajusc-SC); Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina (Sinjusc-SC), Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário Federal em Pernambuco (Sintrajuf-PE), mandatos populares do vereador Werner Rempel (PCdoB/Santa Maria-RS) e da deputada federal Juliana Cardoso (PT-SP) e dezenas de contribuições individuais.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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