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Foto: Thomas Hawk / Flickr

Exemplo de democracia: 6% dos votos de só 6 estados podem definir eleição nos EUA

Para um país que não para de fazer sermão ao resto do mundo sobre a democracia, os EUA são um país pouco democrático
Jim Cason, David Brooks
La Jornada
Washington, DC

Tradução:

Beatriz Cannabrava

Festejando o sucesso da Convenção Nacional Democrata da semana passada, a candidata presidencial do partido, Kamala Harris, e seu companheiro de chapa, Tim Walz, iniciam nesta quarta-feira (28) uma turnê de ônibus pelo estado-chave da Geórgia, enquanto seus oponentes republicanos Donald Trump e J.D. Vance realizarão múltiplos eventos na Pensilvânia e em Michigan.

Esses estados não foram selecionados pelas campanhas ao acaso, mas são três dos seis ou sete estados “chave” em torno dos quais muito provavelmente se definirá o resultado nacional da eleição presidencial no dia 5 de novembro.

As pesquisas indicam que a contenda eleitoral presidencial está muito acirrada e, portanto, o enfoque nas últimas dez semanas será sobre esses estados-chave, entre os quais estão Pensilvânia, Michigan, Wisconsin, Geórgia, Arizona, Nevada e possivelmente Carolina do Norte. Nesses estados, os candidatos estão virtualmente empatados, embora a nível nacional Harris esteja ganhando por três pontos, segundo a média das principais pesquisas. Mas não há voto direto nacional para presidente neste país, e na prática são realizadas 50 eleições estaduais, e com uma ou duas exceções, quem ganhar cada estado ganha todos os votos eleitorais desse estado no concurso para acumular os 270 ou mais que são necessários para ganhar a Casa Branca.

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Mais de 154 milhões de pessoas participaram na eleição nacional de 2020, mas Joe Biden ganhou apenas por uma margem entre 100 mil a 300 mil votos no total. O site noticioso e de análise política Axios examinou o eleitorado potencial de 2024 e concluiu que “aproximadamente 244 milhões de estadunidenses terão o direito de votar. Mas 99,5% de nós não seremos os que decidem: ou não votamos, ou sempre votamos da mesma maneira, ou vivemos em estados onde é virtualmente certo que serão vermelhos (republicanos) ou azuis (democratas)”. Ou seja, “6% dos eleitores em seis estados” poderão acabar decidindo esta eleição, segundo um analista democrata entrevistado pelo Axios.

Democracia torpe

Para um país que não para de fazer sermão ao resto do mundo sobre a democracia, os Estados Unidos são um país pouco democrático. Em 48 dos 50 estados, ao vencedor do voto desse estado é concedido todos os votos eleitorais dessa entidade, mesmo que seja vencido por uma margem microscópica.

Além disso, por um sistema eleitoral que concede a pequenos estados um poder não proporcional no voto eleitoral, o candidato que ganha a maioria dos votos a nível nacional não necessariamente vence a presidência. Em 2000, por exemplo, o democrata Al Gore ganhou mais votos a nível nacional, mas perdeu para George Bush, e em 2016, Hillary Clinton também ganhou mais votos a nível nacional, mas perdeu a eleição e Trump chegou à Casa Branca.

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No entanto, a dinâmica do número muito reduzido de estados que provavelmente determinará os resultados da eleição oferece oportunidades para outras vozes. Por exemplo, Trump venceu Michigan contra Clinton em 2016 por uma margem de apenas 10 mil votos. Mas este ano, mais de 100 mil eleitores desse mesmo estado votaram nas primárias por delegados “não comprometidos” com Harris – em todo o país, 700 mil votaram assim nas primárias – tudo em demanda por uma mudança na política para o apoio incondicional dos Estados Unidos a Israel e sua guerra genocida em Gaza.

O efeito Gaza

Apesar de manifestações, protestos e um chamado de líderes progressistas dentro do partido, Kamala Harris só conseguiu colocar breves comentários de preocupação com a “situação” em Gaza, misturados com uma firme defesa do direito de Israel de “se defender”, e ela e sua campanha recusaram conceder o pedido de vários delegados e legisladores do partido para permitir que um orador palestino falasse por alguns minutos do púlpito diante da convenção.

“Queremos derrotar Trump”, explicou Abbas Alawieh, um delegado “não comprometido” de Michigan na semana passada durante a convenção. “Mas para poder mobilizar os nossos a favor da vice-presidente Harris, precisamos ouvir dela que apoia um cessar-fogo imediato e um embargo de armas sobre Israel. Ela está em risco de perder o estado de Michigan”. Esse estado tem uma comunidade árabe-estadunidense que poderia impactar diretamente em quem ganha esse estado.

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Harris mencionou, na noite final da convenção em Chicago, a necessidade de um fim à guerra de Israel em Gaza e a libertação dos reféns. Ela acrescentou que com isso “o sofrimento em Gaza chega ao fim, e o povo palestino poderá alcançar seu direito à dignidade, segurança, liberdade e autodeterminação”. Mas como comentou um delegado “não comprometido” ao La Jornada, que solicitou anonimato, “chamar por um cessar-fogo enquanto envia bombas” não convence. Uma veterana analista estadunidense sobre o Oriente Médio resumiu a convenção (em referência à repetida mensagem da campanha “alegre” de Harris) como “Alegria em meio ao genocídio”.

Outro tema decisivo nos EUA, a imigração 

Outro tema que poderia descarrilar o ímpeto de Harris e Walz desde a convenção é o da imigração. No dia em que Harris fez seu discurso aceitando formalmente a candidatura de seu partido, Trump estava visitando Montezuma Pass, no Arizona, para elogiar o muro fronteiriço que ele diz ter construído, embora essa seção tenha sido realmente construída durante o governo de Barack Obama. Lá, o ex-presidente criticou novamente Harris pelo fracasso de seu governo em “controlar” os cruzamentos não autorizados da fronteira – ignorou por completo que, devido aos esforços do México, o fluxo de migrantes na fronteira foi reduzido em quase 50%.

Pesquisas realizadas pela rádio nacional pública NPR e a CNN registram uma vantagem mínima de Harris sobre Trump nos estados-chave de Michigan, Wisconsin e Pensilvânia, mas é tão pequena que está dentro da margem de erro. Quando se pergunta aos eleitores qual candidato manejará melhor a fronteira, amplas maiorias favorecem Trump.

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Embora Harris tenha se atrevido a mencionar a frase “caminho à cidadania” em seu discurso na convenção, ela só o fez após repetir a ênfase em assegurar a fronteira, e líderes imigrantes e defensores dos direitos dos imigrantes foram relegados a um plano secundário durante a convenção.

Alguns do Partido Democrata creem que isso é um erro. “Nossa política foi empurrada tanto para a direita sobre a migração por Donald Trump que já é hora de lutar… para realinhar nossa política sobre a migração a onde estava há poucos anos”, comentou o deputado Greg Casar, do Texas, em entrevista ao Democracy Now.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Jim Cason Correspondente do La Jornada e membro do Friends Committee On National Legislation nos EUA, trabalhou por mais de 30 anos pela mudança social como ativista e jornalista. Foi ainda editor sênior da AllAfrica.com, o maior distribuidor de notícias e informações sobre a África no mundo.
David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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