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Centro de Saúde da UNRWA em Jabalia, Gaza, após ataque de Israel (Foto: UNRWA / Flickr)

Ataque de Israel à ONU renderia chuva de sanções, mas tudo podem os aliados de Washington

Ofensivas e desprezo de Israel contra as agências da ONU não são novos, ainda que o Estado sionista tenha sido criado precisamente por decisão da organização
Jesús A. Núñez Villaverde
El Diário.Es
Madri

Tradução:

Guilherme Ribeiro

Os recentes ataques à ONU por parte de Israel não são novos nem resultado de um erro de cálculo. Pelo contrário, são o resultado de um esforço consciente para se livrar da vigilância do (teórico) guardião das regras de jogo estabelecidas após o final da II Guerra Mundial. Essas regras foram criadas para regular as relações entre os Estados, tentando evitar um novo desastre planetário que nos devolvesse à lei da selva. Por isso, esquecendo que é um país criado precisamente por uma decisão da ONU, a história da relação de Israel com a ONU está repleta de desprezos e ataques.

Desprezos sem fim incluem o reiterado descumprimento de dezenas de resoluções da Assembleia Geral, aproveitando que nenhuma delas é vinculante, e até do Conselho de Segurança (nas raras ocasiões em que os Estados Unidos renunciaram a usar seu direito de veto para proteger seu principal aliado no Oriente Médio). Israel considera-se liberado tanto para incumprir suas obrigações como potência ocupante em Gaza e na Cisjordânia, quanto para declarar Jerusalém como sua capital “única, eterna e indivisível”, em contrariedade ao Plano de Partição de 1947, que estabelecia que a cidade seria internacional com um “corpus separatum” projetado para garantir o acesso a crentes das três religiões do Livro.

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Esse desprezo inclui gestos tão deploráveis quanto o realizado em maio passado pelo embaixador de Tel Aviv na ONU, que triturou a Carta fundacional da organização em plena Assembleia; ou outros momentos em que o tom se eleva para qualificar a própria organização como uma entidade antissemita, assim como a Corte Internacional de Justiça e a Corte Penal Internacional, seguindo um roteiro já tão clássico quanto inadmissível que visa calar críticas e denúncias, não contra um povo ou uma religião, mas contra aqueles que violam sistematicamente o direito internacional. Nessa linha, o governo de Netanyahu declarou, na semana passada, o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, como pessoa non grata.

Se isso não bastasse, Israel não hesitou em colocar a organização (suas instituições, trabalhadores e representantes) na mira de suas armas. Assim, seguindo um padrão que remonta décadas, voltou a apontar contra os capacetes azuis da UNIFIL, operação internacional de paz implantada no Líbano desde 1978, e contra a UNRWA, Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinos. No primeiro caso, atreveu-se não apenas a exigir a retirada dos 10.500 efetivos posicionados ao longo da Linha Azul, mas, diante da negativa da missão em atender a seus desejos, partiu diretamente para o ataque contra seu quartel-general e contra alguns de seus postos de observação. São, sem dúvida, ataques deliberados que buscam, mais uma vez, se livrar de testemunhas incômodas que, além disso, têm a missão de relatar as violações da Resolução 1701 do Conselho de Segurança.

No segundo caso, a gama de ações violentas é muito mais ampla. Por um lado, o governo israelense há muito tenta eliminar a existência da UNRWA, impondo obstáculos burocráticos à sua atividade no Território Ocupado Palestino, com o objetivo de que não possa ajudar a população e não conheça diretamente o que tanto os colonos quanto as forças israelenses fazem diariamente. Por outro lado, já são mais de 200 os trabalhadores da agência assassinados pelas Forças de Defesa de Israel (FDI) neste último ano; um macabro balanço que supera, e muito, o que ocorreu até agora com a ONU em qualquer outro cenário de conflito em que esteve presente.

Nenhum castigo a Israel

A isso se somam repetidos ataques à sua sede central em Jerusalém, a mesma que agora o governo israelense acabou de confiscar com o objetivo (ainda mais sarcástico) de construir 1.440 moradias para colonos. E no horizonte — enquanto Tel Aviv aspira a redefinir o conceito de pessoa palestina refugiada para restringi-lo aos cerca de 400 mil ainda vivos da Nakba (em vez dos mais de 5,7 milhões registrados na UNRWA) —, já está em andamento no Parlamento israelense (Knesset) o processo para declarar a agência como organização terrorista.

Um comportamento, em suma, que a qualquer outro Estado do planeta teria custado um aluvião de sanções diplomáticas, econômicas e até militares; mas que, no caso de Israel, com a direta cumplicidade de Washington, permanece sem qualquer tipo de punição. Vale lembrar que tanto a UNIFIL quanto a UNRWA informam pontualmente às autoridades militares israelenses sobre a localização de suas instalações e de seus movimentos, portanto, não há como alegar desconhecimento por parte das FDI toda vez que cometem um assassinato de militares ou trabalhadores de ambas as instâncias ou destroem suas instalações.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Jesús A. Núñez Villaverde Codiretor do Instituto de Estudos sobre Conflitos e Ação Humanitária (IECAH)

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