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Imagens: Casa Branca / Mauro Lima

Biden tira Cuba da lista de terror e suspende algumas sanções; analistas avaliam medidas

Decisão anunciada a poucos dias do fim do mandato de Biden é considerada “hipócrita” por Amauri Chamorro e celebrada como uma “vitória popular” por Thiago Ávila. A maioria das restrições contra Cuba segue em vigor
Guilherme Ribeiro, Vanessa Martina-Silva
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

Faltando apenas seis dias para deixar a presidência dos Estados Unidos, o presidente democrata Joe Biden, declarou a retirada de Cuba da lista de países patrocinadores do terrorismo e anunciou a suspensão de algumas sanções que integram o bloqueio econômico imposto à Ilha. A decisão foi divulgada durante um pronunciamento na Casa Branca, na tarde desta terça-feira (14).

Segundo documento emitido pela Casa Branca:

  • O governo de Cuba não forneceu nenhum tipo de apoio ao terrorismo internacional nos últimos seis meses; e
  • O governo de Cuba garantiu que não apoiará atos de terrorismo internacional no futuro.


Outra medida relevante tomada por Biden, nos últimos momentos de sua gestão, foi o anúncio da suspensão de sanções impostas pelo ex-presidente Donald Trump. Essas restrições dificultavam transações financeiras com entidades cubanas, resultando em prejuízos significativos para a economia do país.

De acordo com o jornalista Jamil Chade, o gesto faz parte de um acordo relacionado à libertação de supostos prisioneiros políticos mantidos na Ilha. Ainda segundo ele, Brasil, Chile, Espanha, Colômbia e a União Europeia, além do Vaticano, teriam feito apelos nesse sentido. O Vaticano, inclusive, será responsável por negociar as libertações.

Neste sentido, nesta terça, o Ministério das Relações Exteriores de Cuba emitiu um comunicado informando que 553 pessoas foram libertadas no país como parte das conversas entre Díaz-Canel e o Papa Francisco. Esses cidadãos foram condenados com o devido processo legal e foram excarcerados “com base em uma análise cuidadosa”, diz o texto, que ressalta o compromisso com a “ordem interna e a segurança dos cidadãos”.

Medida tardia e com alto custo: a repercussão em Cuba

Em sua rede social X (ex-Twitter), o presidente cubano, Miguel Díaz-Canel, destacou que a medida é tardia e que seu país nunca deveria ter integrado essa lista. “É uma decisão na direção certa, embora tardia e de alcance limitado. O bloqueio continua de pé, assim como a maioria das medidas extremas implementadas desde 2017 para asfixiar a economia cubana e provocar carências ao nosso povo”.

Por sua vez, o chanceler cubano, Bruno Rodríguez, agradeceu aos governos e organismos multilaterais da sociedade civil pela mobilização que levou a essa medida, mas ponderou que:

“Estão mantidas a guerra econômica, as medidas adicionais extremas desde 2017, as operações de desinformação para responsabilizar Cuba pelo impacto do bloqueio e os programas milionários para atividades de ingerência no país. Também seguem de pé a perseguição ao fornecimento de combustível, aos programas de cooperação médica, às transações financeiras e comerciais, ao turismo, às viagens de estadunidenses ao país e a tudo que possa representar uma fonte de recursos para a população.”

Amauri Chamorro: ação de Biden é uma falácia

Em entrevista à Diálogos do Sul Global, o analista internacional classificou a postura do governo Biden como uma falácia, considerando que a resolução chega nos últimos instantes da atual administração:

“É uma ação de relações públicas de Biden para tentar fechar o governo como supostamente mais ao centro, mais humano. Mas, na verdade, é uma sem-vergonhice fazer isso agora”, afirma Chamorro, que observa: “Se isso fosse realmente aplicado, beneficiaria sensivelmente Cuba”.

Biden anunciou decisão sobre Cuba a apenas seis dias de terminar o governo (Foto: Casa Branca)

O consultor político explica que a história de quatro anos atrás vai se repetir: assim como Trump reincluiu a nação cubana após a retirada por Barack Obama, o republicano responderá da mesma forma agora:

“Muito provavelmente, inclusive, a equipe de Biden também vai decretar um cessar-fogo em Gaza, tudo para dizer que finalizaram o governo com uma ação humanitária, uma questão de direitos humanos”, avalia, acrescentando: “É uma palhaçada!”.

Ainda para o especialista, o retorno de Trump à Casa Branca deve trazer um período de ainda mais dificuldade para Cuba, considerando a nomeação de Marco Rubio como secretário de Estado — cargo correspondente a ministro das Relações Exteriores, “o segundo homem mais poderoso do governo”, destaca Chamorro:

“É filho de imigrantes cubanos, membro da ultradireita fascita da Flórida. Está entre os que patrocinaram a tentativa de assassinato de Fidel Castro. Realizou incontáveis ações terroristas contra Cuba, inclusive explodindo um avião da equipe olímpica cubana. Isso é Marco Rubio”, diz. E alerta: “Agora, imagine o que eles vão fazer contra Cuba assim que Trump assumir a presidência”.

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Thiago Ávila: resolução é vitória da mobilização em prol de Cuba

Cuba foi incluída pela primeira vez na lista de países patrocinadores do terrorismo em 1982 (Foto: Mauro Lima)

O internacionalista Thiago Ávila também comentou à Diálogos do Sul Global a retirada de Cuba da lista de países patrocinadores do terrorismo. Para o ativista, a decisão é hipócrita, “pois Biden realizou um mandato de caráter imperialista e agressivo contra Cuba”. Porém, acrescenta:

“Nada disso retira do povo cubano a vitória por ter se mobilizado (mais de meio milhão de pessoas nas ruas em marcha no dia 20 de dezembro de 2024) e pressionado pelo fim dessa violação”, afirma.

Para Ávila, o decreto desta terça-feira é ainda uma “vitória de todos os países que todos os anos votam para condenar os EUA nas Assembleias Gerais da Organização das Nações Unidas (ONU) belo bloqueio ilegal”, e de personalidades como o Papa Francisco, que denunciou a crueldade de aplicar estrangulamento econômico contra um povo por divergências ideológicas.

Quanto ao fato de a determinação ter ocorrido nos últimos dias do mandato democrata, o especialista qualifica como uma vitória pedagógica: “Mostra que um presidente imperialista sabe que o bloqueio é uma violação” e tenta “esconder suas violações” com a decisão, mesmo que tardia.

Questionado sobre o que esperar do governo Trump para Cuba, Ávila pontua que o cenário é preocupante, já que o segundo e o terceiro escalões do governo têm diversas relações com o “movimento golpista e de ingerência imperialista contra a ilha”. Nesse sentido ele avalia ainda que

“Essa vitória da pressão popular ajuda no sentido de demarcar politicamente que foi cometido um erro e uma violação e que apenas a intensificação da mobilização popular em solidariedade com Cuba pode impedir a sanha intervencionista dos Estados Unidos. Outros avanços, como a entrada de Cuba enquanto parceira do BRICS e o crescimento da pressão diplomática contra o bloqueio ajudam, mas tudo isso é mantido e ativado a partir da mobilização popular.”

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Cuba, EUA e a lista de países patrocinadores do terrorismo

A lista de Estados Patrocinadores do Terrorismo (SSOT, na sigla em inglês) é um mecanismo de política externa usado pelos EUA para sancionar países que, em tese, fornecem apoio a atos de terrorismo internacional. Além da ilha caribenha, Coreia do Norte, Irã e Síria compõem o grupo de nações atualmente.

Cuba foi incluída pela primeira vez na SSOT em 1982, pelo então presidente dos EUA Ronald Reagan. O país foi retirado só 33 anos depois, em 2015, pelo então presidente Barack Obama, em um movimento de normalização das relações entre os dois países.

Em 2021, porém, pouco antes de deixar o poder, Donald Trump decidiu incluir novamente Cuba na relação, o que significou retomar e agudizar as sanções que asfixiam o Estado caribenho, impedindo desde negócios e investimentos internacionais a ajudas humanitárias destinadas ao povo cubano.

“É um conjunto de leis e ações do governo dos EUA para impedir que os bancos negociem, tenham operações com Cuba. No dia a dia, faz com que os cubanos não possam ter cartão de crédito, um cartão”, explica Amauri Chamorro.

“Você não pode negociar com nada, fica isolado do mundo, da dinâmica financeira e comercial do planeta. Isso obviamente enforca o país”, conclui.

* Com informações de Wola e UOL.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Guilherme Ribeiro Jornalista graduado pela Unesp, estudante de Banco de Dados pela Fatec e colaborador na Revista Diálogos do Sul Global. Mais conteúdos em guilhermeribeiroportfolio.com
Vanessa Martina-Silva Trabalha há mais de dez anos com produção diária de conteúdo, sendo sete para portais na internet e um em comunicação corporativa, além de frilas para revistas. Vem construindo carreira em veículos independentes, por acreditar na função social do jornalismo e no seu papel transformador, em contraposição à notícia-mercadoria. Fez coberturas internacionais, incluindo: Primárias na Argentina (2011), pós-golpe no Paraguai (2012), Eleições na Venezuela (com Hugo Chávez (2012) e Nicolás Maduro (2013)); implementação da Lei de Meios na Argentina (2012); eleições argentinas no primeiro e segundo turnos (2015).

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