Pesquisar
Pesquisar

Quatro deveres das esquerdas diante do conflito entre Rússia e Ucrânia

O professor da UFRJ, Carlos Eduardo Martins, elenca pontos sobre defesa da democracia, socialismo e pluralidade dos direitos humanos
Carlos Eduardo Martins
Diálogos do Sul Global
Rio de Janeiro (RJ)

Tradução:

Diante dos conflitos entre Rússia e Ucrânia, há diversas questões que devem ser consideradas e observadas por indivíduos alinhados à esquerda para que seja possível tomar posicionamentos e emitir declarações. A situação, por si só, é profundamente complexa. Para nos ajudar, Carlos Eduardo da Rosa Martins, professor do Programa de Pós-Graduação em Economia Política Internacional (PEPI) e do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IRID/UFRJ), elaborou uma lista com quatro deveres das esquerdas diante do tema. Confira:

1 – O expansionismo militar da OTAN em direção ao Leste Europeu para inviabilizar o desenho geoeconômico de uma Eurásia. Desde o fim da URSS, a Rússia perdeu 5 milhões de quilômetros quadrados de território e 140 milhões de habitantes. Tal expansionismo é patrocinado pelos Estados Unidos e busca impedir a aproximação econômica e política entre a Rússia e a União Europeia, aproximação cada vez mais natural em função da dependência energética crescente da Europa em relação à Rússia. 
Os Estados Unidos fazem o possível para impedir a construção do Nord Stream 2, gasoduto que atravessa a Ucrânia para abastecer a Europa, e principalmente a Alemanha.  Os Estados Unidos conquistaram sua hegemonia com uma Europa politicamente débil, ocupada militarmente, dividida pela guerra fria, e após isso, por um neoliberalismo monetário radical que jogou os países europeus uns contra os outros. Reduzir a Europa a um apêndice atlântico norte-americano é um objetivo estratégico dos Estados Unidos para manter sua influência no mundo e isso requer sua divisão política;   2 – Criar um conflito fronteiriço na Ucrânia é fundamental para azedar as relações entre Rússia e União Europeia. O golpe de Estado de 2014, contra o presidente eleito na Ucrânia pro Rússia, faz parte das ações estadunidenses para minar a criação de um bloco político eurasiano, com epicentro na China e na Rússia, e que tende a se converter num bloco maior, eixo geopolítico do Sul Global, com desdobramentos e articulações na América Latina e na África. Os golpes de Estado que sofremos na América Latina  são parte dessa tentativa de impedimento;
O professor da UFRJ, Carlos Eduardo Martins, elenca pontos sobre defesa da democracia, socialismo e pluralidade dos direitos humanos

Montagem
O que a esquerda deve levar em consideração na hora de tomar um lado no conflito Russía x Ucrânia?

3 – Está claríssimo que a ordem neoliberal acabou, que o comércio mundial será  cada vez mais politicamente regulado e que existem dois grandes blocos em confrontação: o liderado pelo imperialismo norte-americano e outro que se confronta a ele e tem por isso que ser necessariamente anti-imperialista. Neste novo bloco, a força está na elaboração de um projeto de desenvolvimento global capaz de ganhar apoios, adesões e não no protagonismo militar.  Tanto China quanto a Rússia foram vítimas históricas do imperialismo ocidental e nunca criaram um império global, apenas importantes poderes regionais. Antes de serem imperialistas,  China e Rússia têm  que ser obrigatoriamente anti-imperialistas.

4 – É   fundamental defendermos um mundo multipolar, a existência de poderes regionais, a democracia, o socialismo e combater qualquer tentativa de império mundial, como fica claro nos discursos de Biden sobre a defesa de uma ordem mundial dirigida pelos Estados Unidos. Não há nada similar a isso do lado sino-russo. O documento de 4 fevereiro de Putin e Xi Jinping  defende uma ordem multipolar, um projeto de desenvolvimento global, democratização das relações internacionais para maior atuação de organismos multilaterais mais representativos, um projeto global de defesa do meio-ambiente  e defesa da democracia e dos direitos humanos assimiladas às  diferenças culturais locais. Claro, que  o calcanhar de Aquiles deste documento é  a completa relativização da democracia, que passa a estar totalmente vinculada a características locais. Entretanto, a democracia “ocidental” está longe de ser democracia de fato, como sabemos, e a ênfase deve estar nos temas geopolíticos que são os decisivos.

Cabe, portanto, às esquerdas:

  1. Condenar o expansionismo do imperialismo norte-americano que busca impedir a emergência de um novo bloco do Sul Global, com epicentro sino-russo, neste momento. Denunciar que as ações de expansão ao Leste da Europa se assemelham ao cerco a Cuba e Venezuela. Os EUA não aceitam a existência de poderes emergentes da periferia e nem a existência de fortes integrações regionais, ameaças ao seu imperialismo mundial. Por isso fustigam a Rússia no Leste e a China no mar da China através da AUKUS e da transferência de submarinos nucleares à Austrália. Podemos nos perguntar,  qual seria a reação dos EUA se a China e a Russia deslocassem armamento pesado  para Cuba, como a URSS tentou fazer em 1961?

  2. Condenar o Golpe de Estado na Ucrânia de 2014
  3. Defender as repúblicas separatistas de Donetsk e Lugansk
Defender a democracia, o socialismo e a pluralidade dos direitos humanos, o que inclui a questão LGBT+

As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

Assista na TV Diálogos do Sul


Se você chegou até aqui é porque valoriza o conteúdo jornalístico e de qualidade.

A Diálogos do Sul é herdeira virtual da Revista Cadernos do Terceiro Mundo. Como defensores deste legado, todos os nossos conteúdos se pautam pela mesma ética e qualidade de produção jornalística.

Você pode apoiar a revista Diálogos do Sul de diversas formas. Veja como:

  • PIX CNPJ: 58.726.829/0001-56 

  • Cartão de crédito no Catarse: acesse aqui
  • Boletoacesse aqui
  • Assinatura pelo Paypalacesse aqui
  • Transferência bancária
    Nova Sociedade
    Banco Itaú
    Agência – 0713
    Conta Corrente – 24192-5
    CNPJ: 58726829/0001-56
  1.        Por favor, enviar o comprovante para o e-mail: assinaturas@websul.org.br 


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Carlos Eduardo Martins

LEIA tAMBÉM

Ataque de Israel à ONU renderia chuva de sanções, mas tudo podem os aliados de Washington
Ataque de Israel à ONU renderia chuva de sanções, mas tudo podem os aliados de Washington
Ucrânia acumula perdas de território e está cercada pela Rússia em Donbass
Ucrânia acumula perdas de território e está cercada pela Rússia em Donbass
Ucrânia_Kursk_Otan
Kremlin: ação da Ucrânia em Kursk prova que Otan atacaria Rússia
Casa em Kursk após ataques da Ucrãnia
Ucrânia pode tentar usar região russa de Kursk como moeda de troca após fim da guerra