A notícia do depoimento público da vice-presidenta, via zoom, no Tribunal Federal de Cassação Penal, na chamada “Causa do dólar futuro” criou um terremoto no Poder Judicial na Argentina e merece um destaque pela sua importância política para o país, para a região e para o mundo. Conheça na íntegra sua intervenção completa
Cristina Kirchner pediu para fazer sua declaração presencial, oral e pública, nesta causa no Tribunal de Cassação Penal. Dado que foi renegado o pedido e decidido realizar-se virtualmente por zoom, insistiu e conseguiu que a audiência fosse pública e televisionada. A transmissão em direto, por vários canais de TV, em plena semana, na manhã de 5a. feira, teve uma repercussão bombástica, considerando o horário: uma audiência de mais de 1 milhão de pessoas. Grande entusiasmo, particularmente nos círculos progressistas, militantes, redes e meios independentes. Como dito pelo sociólogo Emir Sader no seu artigo no Brasil247, “a declaração da vice-presidenta, Cristina Kirchner, destroça o lawfare e o judiciário argentino”.
Trata-se da audiência pública de uma das maiores líderes de massas na Argentina, à altura de Eva Peron; ex-presidenta por duas gestões seguidas, agora vice-presidenta junto a Alberto Fernandez na Frente de Todos, e presidenta do Senado da República, perseguida por mais de 10 causas sem provas, incluindo esta em questão, a “Causa do dólar futuro”, arrastada sem provas de delito por 5 anos desde 2015, promovida por juízes e procuradores corruptos, cúmplices da casta econômica de Macri e dos poderes midiáticos (Clarin/La Nación), para manter vivo o esquema político denigratório do “lawfare” contra ela, contra lideranças políticas do kirchnerismo, e da esquerda e governos progressistas da década passada na América Latina. Nada alheio ao que vivemos no Brasil na perseguição judicial-midiática contra Lula e Dilma, com consequências políticas nefastas ao povo brasileiro conduzido à trágica ascensão do bolsonarismo no Brasil.
A coragem militante e inteligência política de Cristina Kirchner, somaram-se à sua experiência de estadista e advogada de formação. Numa brilhante declaração em audiência pública, tida como uma aula magistral de direito e política, não poupou palavras; fez o feitiço voltar-se contra o feiticeiro. De acusada passou a ser acusadora. Os juízes foram colocados, com nome e sobrenome, no banco dos réus. Cristina provou que quem se beneficiou com o dólar futuro, foram Macri, seus funcionários de governo e os seus nomeados diretores do Banco Central, que desvalorizaram bruscamente a moeda nacional, e usufruíram desta ação. Inflados pelo show midiático mentiroso do Clarin/La Nación, acusaram de administração fraudulenta à ex-presidenta Cristina Kirchner, seu ex-ministro da Economia Axel Kicilloff (que enfrentou os Fundos Abutres de Nova Iorque), e seus ex-diretores do Banco Central, dias antes do 2o. turno das eleições de 2015; desta forma, com o fraude político, Macri venceu ao candidato da Frente para a Vitória, Daniel Scioli, e ao assumir o governo, possibilitou a subida brusca do dólar (a taxa de cambio era controlada no governo kirchnerista), favorecendo o enriquecimento ilícito próprio, de compradores amigos e altos financistas do governo macrista, com a cumplicidade de juízes e donos dos grandes meios de comunicação. Como explica Cristina Kirchner, as decisões dos juízes, com a participação ativa do famoso juiz Bonadio, o Moro argentino, terminaram dando vitória eleitoral a Macri , afetando, consequentemente, o bem estar, o patrimônio e a vida das pessoas; a cumplicidade do Poder Judicial levou ao empobrecimento e o retorno ao endividamento impagável com o FMI (2016/2019), que já havia sido superado pelos governos kirchneristas. Isso é lawfare.
A manobra destes agentes do lawfare na Argentina, consiste em arrastar esta causa (como as outras) por muito tempo para desengavetá-la à medida da necessidade política do poder financeiro concentrado, acionando o show midiático; antes, serviu para por o Macri no poder; agora, para desacreditar o governo da Frente de Todos de Alberto/Cristina. A primeira audiência para o depoimento de Cristina no passado coincidiu, propositalmente, com um dia pessoalmente emotivo para a ex-presidenta, e histórico de mobilizações para o povo pelo aniversário da morte de Néstor Kirchner. Recentemente, esta última audiência foi convocada pelo Tribunal para o dia 1 de março, dia do discurso de abertura do presidente Alberto no Congresso da Nação; data em que, institucionalmente, toca à vice-presidenta abrir a sessão. O Tribunal de Cassação Penal teve que corrigir a manobra e realizá-la 3 dias depois.
Mas, Cristina Kirchner, deu um xeque-mate, ou a primeira rodada da Reforma e da luta Judicial anunciada por Alberto Fernandez na abertura do Congresso; um verdadeiro nocaute ao poder Judicial, desnudando-o como corrupto e cúmplice da entrega da soberania de uma nação. Não fez uma defesa de si mesma, mas do sistema democrático de justiça, da República, e dos interesses do povo argentino, a verdadeira vítima deste saqueio imoral dos fundos públicos produto do lawfare. O lawfare visa essencialmente um golpe econômico-finaceiro internacional. A força da convicção de Cristina estava nas suas palavras e no seu dedo apontado, via zoom, diretamente aos juízes, aos promotores e aos meios hegemônicos de comunicação. Responsabilizou-os, emocionada ao borde das lágrimas, pelo estado de pobreza e endividamento a que o país foi reduzido, a ponto de não se poder dar uma aposentadoria digna aos idosos, hoje vítimas fatais da pandemia. Apontou a situação antidemocrática de impunidade dos juízes, livres do controle popular a que são submetidos os membros dos poderes Executivo e Legislativo. Nos últimos anos do seu governo, Cristina Kirchner defendeu um projeto de democratização da Justiça onde o Conselho eleitor dos juízes fosse baseado no voto popular. E continua batalhando, porque existe uma Milagro Salas, ainda presa (há mais de 5 anos), e inclusive, tantas vítimas de femicídios diante de uma “Justiça” parcial, incompetente ou morosa. As mulheres as estarão recordando neste 8 de março.
A declaração pública ao vivo, de Cristina Kirchner, foi um ato político histórico. Muitos argentinos dizem, cheios de esperança que, com isto, ela “marcou um antes e um depois”. É o início do fim político do lawfare, que poderá estimular a derrubada do dominó que se estende ao Brasil, onde a Lava Jato resiste a despencar-se definitivamente e restabelecer a liberdade e os direitos políticos do ex-presidente Lula. O fato é que, como no Brasil, muitos autores ou defensores da Lava Jato já pensam em pular fora do barco. Na Argentina, com o nocaute que deu Cristina nesta causa de lawfare, os seus promotores já estão no banco dos réus. Fala-se na hipótese de que a causa de dólar futuro seja arquivada ou anulada. Mas, Cristina Kirchner pretende ir a fundo; não aceita a anulação e faz questão de provar a sua inocência e do seu governo num Tribunal Oral e público. Desta forma, os acusadores, transformados em acusados, poderão ser condenados.
Twitter / Cristina Kirchner
Declaração pública ao vivo de Cristina Kirchner foi um ato político histórico.
Outra importância deste ato de Cristina Kirchner é que num golpe só, de 48 minutos ao vivo, evidenciou vários problemas. O judicial, o político, mas também o midiático. Ao mesmo tempo que criticou, deu um exemplo de como há que fazer. Foi uma flor de lição comunicacional. Algo que sempre fez durante o seu governo, nos balcões internos da Casa Rosada, na TV Pública e nas cadeias nacionais de TV-Rádio: comunicar diretamente aos cidadãos seus atos e medidas de governo. Nesta 5a. feira, desde o Tribunal de Cassação virtual, a vice-presidenta de Alberto Fernandez, renasceu como aquela estadista dos balcões da Casa Rosada que construiu consciência, sobretudo da juventude; deu uma aula magistral de política e voltou a falar com o povo inclusive dando uma força necessária em tempos duros de Pandemia. Isso, sem fazer perder o brilho do presidente, ao contrário, reforçando a confiança de que o povo argentino conta com dois brilhantes mandatários, um homem e uma mulher, unidos e sintonizados na direção do país.
Axel Kicillof, ex-ministro da economia e atual governador da Provincia de Buenos Aires (FdT) também fez sua declaração por zoom, numa precisa defesa técnica, provando que não cometeram nenhum delito. Acusaram que no seu governo o Estado perdeu 55 bilhões de pesos; mas ficou evidente que Macri, sim, fez manobras para receber 44 bilhões de pesos para sua campanha eleitoral, eleger-se, e voltar a deixar uma estrondosa dívida com o FMI de 44 bilhões de dólares ao atual governo de Frente de Todos. Cristina chama a limpar já este sistema de Justiça corrupto para romper definitivamente este ciclo, onde a cada 20 anos, se cai no default, se desendivida o país (como fizeram Néstor/Cristina Kirchner, e lutam por fazer agora Alberto/Guzmán), e em seguida retornam novamente outros abutres com o lawfare, para voltar a arrasar o país. Nunca mais!
As forças populares de apoio a Lula, Dilma, Rafael Correa, Evo Morales e Lopez Obrador acabam de receber com esta declaração fulminante de Cristina Kirchner um grande estímulo para derrotar unidos o lawfare no continente. O partido judicial-midiático na Argentina reagirá, sem dúvidas, frente a esta enorme derrota política, com mais violência midiática e provocações . O presidente Alberto Fernandez, na abertura anual do Congresso, acabou de acionar o controle cruzado de poderes entre Parlamento e Justiça para investigar o crime de endividamente do país por parte do ex-presidente Macri.
“Podem me chamar a depor 20 vezes mais. Podem me prender, mas não vou calar. Vou estar sempre com vocês. Não vejam este fato como um ataque a uma pessoa”. São palavras de Cristina Kirchner, dirigida ao povo na saída de uma das suas tantas audiência. Recordando que Cristina é mulher e grande líder; teve a força como sempre, para enfrentar o poder central, protagonizar este empurrão histórico, decidida a não permitir mais semelhantes atrocidades do lawfare, com a certeza de que o povo peronista a acompanhará e seguirá bradando: “Se tocarem na Cristina, vai se armar um grande tumulto!!”.
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