São Paulo amanheceu caótica, debaixo d’água, com grande parte de suas principais vias interditadas. Não é a primeira vez e provavelmente não será a última.
São décadas, mais de século de desleixo, irresponsabilidade, incompetência, desvios, marginalização. De uma cidade que asfixiou seus rios e córregos. Que derrubou suas matas.
Jorge Araujo / Fotos Públicas
Uma cidade que priorizou o automóvel, a gasolina, a fumaça
Que jogou pras periferias milhões de pobres coitados, favelados, trafegando em trens e ônibus lotados em troca de salários de fome.
Que investiu na (in)sociabilidade cinza do cimento e do asfalto.
Que sempre definiu a destinação dos recursos públicos através de planos diretores desenhados pelo setor privado.
Que priorizou o automóvel, a gasolina, a fumaça.
Que enalteceu os enclaves fortificados, os espaços exclusivos, com seus nomes em francês, inglês e italiano, com toda a segurança e sofisticação que “você e sua família merecem”.
De uma cidade, enfim, que simboliza como poucas a sociedade brasileira e todas as suas mazelas.
Difícil, horas depois da cerimônia do Oscar, não relacionar a tempestade cenográfica de “Parasita” com o dilúvio paulistano desta segunda-feira: ambos a nos lembrar que, mesmo a contragosto, ricos, pobres e remediados estarão cada vez mais no mesmo barco do cataclisma mundial.
* Wagner Iglecias é doutor em Sociologia e professor da EACH e do PROLAM USP.
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