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Grupo de mulheres lutam por políticas de gênero e equidade na União Europeia

Último triunfo foi a eleição da juíza Ekaterini Sakellaropoulou como presidenta da República Helênica, primeira mulher na história da Grécia a chegar ao cargo
Mario Muñoz Lozano
Prensa Latina
Havana

Tradução:

Preteridas durante séculos, as mulheres vão acessando, pouco a pouco, diferentes instâncias de poder em uma União Europeia (UE) orgulhosa de seus planos de igualdade de gênero, apesar das críticas públicas e de organizações feministas.

O último destes triunfos foi a eleição, em 22 de janeiro último, da juíza Ekaterini Sakellaropoulou, de 63 anos, como presidenta da República Helênica, transformando-se na primeira mulher na história da Grécia a chegar a este cargo.

A advogada também foi a primeira mulher a presidir o Conselho de Estado de seu país, o máximo tribunal administrativo grego, e é reconhecida por sua defesa dos direitos dos refugiados, das minorias e das liberdades civis.

Em 2019, o bloco rompeu seu teto de cristal com as nomeações da alemã Úrsula von der Leyen, da dinamarquesa Margrethe Vestager e da francesa Christine Lagarde, para três dos mais importantes cargos da Comissão Europeia, que iniciou suas funções em 1º de dezembro último.

A primeira, com seus 60 anos, como presidenta, guiará o destino da UE durante os próximos cinco anos e é hoje a cara visível do bloco. Médica de profissão, é mãe de sete filhos, foi ministra da Família e da Defesa da Alemanha.

Em uma das vice-presidências executivas está Vestager, de 51 anos, que tem a seu cargo o manejo dos fios de uma Europa que fortalecerá suas políticas em busca de sua completa inserção na chamada Era Digital.

A política dinamarquesa foi comissária de Concorrência durante o mandato anterior do Executivo europeu e ministra de Assuntos Econômicos e do Interior de seu país, de 2011 a 2014.

Junto a elas, em outra grande cátedra do bloco, está Lagarde, de 64 anos, que dirige o Banco Central Europeu (BCE), o segundo do planeta, depois da Reserva Federal estadunidense.

A advogada e economista francesa foi diretora gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI) desde 2011 até julho do ano passado e, muito antes, ministra de Finanças de seu país.

Outras 10 mulheres integram a lista do grupo de comissários que dirigem a Comissão Europeia, uma batalha pela equidade de gênero que durante os últimos meses do ano passado liderou as negociações para a aprovação do novo Executivo comunitário.

Nessa lista de mulheres de êxito na política não pode faltar a chanceler alemã Angela Merkel que dirige, desde 2005, a primeira potência econômica do bloco comunitário e foi reeleita para um quarto mandato em março de 2018.

A física e política alemã, de 65 anos, foi pioneira em aceder a este cargo em seu país e a revista Forbes a considerou em várias ocasiões “a mulher mais poderosa do mundo”.

Em outubro passado, Sophie Wilmes, de 44 anos, foi nomeada primeira-ministra interina da Bélgica, única também a ocupar esse posto, embora seu Governo se limite a gerir os assuntos cotidianos, já que o país não conta com um Executivo pleno desde dezembro de 2018.

Desde 2015, Kolinda Grabar Kitarovic, de 51 anos, preside o Estado croata, cargo que cederá em 18 de fevereiro a Zoran Milanovic, que a derrotou no segundo turno das eleições presidenciais, em 5 de janeiro.

Depois de ganhar as eleições legislativas, Mette Frederiksen, com 41 anos, tornou-se em junho passado a primeira-ministra mais jovem da história da Dinamarca.

As palmas vão para Sanna Marin, de 34 anos, eleita em 10 de dezembro pelo parlamento da Finlândia como primeira-ministra daquele país, ganhando o título de chefe de Governo mais jovem do mundo.

Marin encabeça uma coalizão de centro-esquerda, integrada por cinco partidos, dos quais quatro são liderados por mulheres, três delas com menos de 35 anos.

A Estônia é outro dos países do bloco dirigido por uma dama. Neste caso Kersti Kaljulaid, de 50 anos, ex membro do Tribunal de Contas Europeu, presidenta daquele país desde outubro de 2016, – ainda que o cargo seja essencialmente honorário.

Investida em junho passado, a advogada Zuzana Caputova, de 46 anos, também aparece na lista das primeiras mulheres a conquistar a presidência de um país, neste caso a Eslováquia. Nova na política, em março de 2019 venceu amplamente o candidato do partido oficialista de então.

Fora do bloco comunitário, mas na região, aparecem ainda as primeiras-ministras da Noruega, Erna Solberg e da Islândia, Katrin Jakobsdottir, junto às presidentas da Geórgia, Salomé Zourabichvili e da Sérvia, Ana Brnabic.

Último triunfo foi a eleição da juíza Ekaterini Sakellaropoulou como presidenta da República Helênica, primeira mulher na história da Grécia a chegar ao cargo

ONU Mulheres
As mulheres vão acessando, pouco a pouco, diferentes instâncias de poder em uma União Europeia (UE)

Sem mãe no berço

Tal realidade era impossível na década de 1950, quando nasceu a Comunidade Europeia. Não houve mães fundadoras implicadas em sua formação; as mulheres viram-na como um clube de industriais brancos aos quais pouco importava seu bem-estar.

Em 1957, a França insistiu em introduzir no tratado de Roma o artigo 119: igual salário por igual trabalho. Mas não porque apoiasse o empoderamento econômico feminino, e sim pelo temor de que seu setor têxtil enfrentasse a “concorrência desleal” da Bélgica, onde as mulheres ganhavam muito menos do que os homens.

As advogadas defensoras dos direitos das mulheres tardaram quase 20 anos a obter sentenças judiciais que tornassem vinculante o artigo 119 em todos os Estados-membros, o que propiciou a base para novas diretrizes, programas de ação e, finalmente, mudanças nos tratados.

Na primeira cúpula europeia Mulheres no Poder, celebrada em Atenas, em 3 de novembro de 1992, reconheceu-se que as preocupações das mulheres deviam ter sido incorporadas desde o princípio, quando se estabeleceu a estrutura da Comunidade.

A cúpula proclamou a necessidade de buscar uma repartição equilibrada dos poderes públicos e políticos entre mulheres e homens e reivindicou a igualdade de participação na tomada de decisões.

Já em meados da década de 1990, os especialistas em questões de gênero elogiaram a UE e a consideraram a instituição mais orientada à igualdade no mundo.

Há apenas duas décadas, a UE aprovou a “integração da perspectiva de gênero” como sua posição política oficial sobre a igualdade de gênero.

Na época, a iniciativa foi considerada uma perspectiva revolucionária para acelerar o progresso e obter importantes conquistas neste âmbito, em um continente onde as decisões políticas, econômicas e sociais sempre foram “coisa de homem”.

Políticas de gênero na União Europeia

A integração da perspectiva de gênero foi estabelecida ao nível internacional como a principal estratégia global para a igualdade de gênero a partir da Quarta Conferência Mundial das Nações Unidas sobre a Mulher, realizada em Beijing, em 1995.

A iniciativa passou a ser o enfoque político oficial da UE e de seus Estados-membros em sua base jurídica, o Tratado de Amsterdam (1997), que se compromete a eliminar as desigualdades entre o homem e a mulher e promover a igualdade em todas as ações.

Com seus Programas de Ação Comunitária, incrementaram-se as políticas de gênero, desde as de igualdade de oportunidades, passando pela ação positiva, até as políticas transversais e de paridade.

No entanto, as medidas tomadas não bastam e os problemas de gênero sobrevivem em um significativo número de países do bloco, onde mais se ouvem os discursos sobre igualdade no mundo. Mas no interior de suas nações os cidadãos criticam a pouca aplicação direta das normas favoráveis ao gênero, começando pela igualdade de salário.

Em média, as europeias ganham 16,2% menos que os homens, segundo dados de 2016 do Escritório Europeu de Estatística (Eurostat).

Em declarações recentes, a presidenta do Executivo europeu, Úrsula von der Leyen, comprometeu-se a acabar com a diferença salarial no marco da estratégia pela igualdade de gênero.

Lamentavelmente, as diretrizes da UE estabelecem normas mínimas e objetivos comuns, mas as decisões sobre como aplicar suas numerosas políticas de inclusão social e de luta contra a discriminação dependem dos governos dos Estados-membros.

Frequentemente as manobras e as argúcias nacionais atrasam, diluem ou bloqueiam por completo as políticas com perspectiva de gênero. Por isso exige-se dos Estados mais atrasados gerar bases de dados desagregados por sexo, apresentar informes nacionais e submeter-se aos vereditos dos tribunais supranacionais.

Sem a força dos regulamentos comunitários, muitos Estados-membros continuariam negando-se a aprovar leis firmes contra a discriminação no trabalho, o assédio sexual e a violência doméstica.

A estratégia Europa 2020 pretende aumentar até 75% a participação feminina no mercado de trabalho, mas isso só garantirá uma maior independência econômica se elas puderem trabalhar em tempo integral; são muitas as mulheres presas a empregos mal pagos, parciais ou precários no setor de serviços.

No entanto, a ampliação das definições dos direitos das mulheres está se incorporando aos tratados da legislação europeia, juridicamente vinculantes para todos os Estados-membros.

O artigo 13 do Tratado de Amsterdam, por exemplo, proíbe a discriminação por motivos de sexo, origem racial ou étnica, religião ou crença, biocapacidade e idade, assim como por orientação sexual.

A UE reduziu os obstáculos à autonomia econômica das mulheres, originados pela segregação profissional e a falta de representação feminina nos órgãos consultivos, nas estruturas de gestão e mesmo nos conselhos de administração das empresas.

Buscando fortalecer os papéis de gênero e as responsabilidades familiares dos homens, nos últimos anos foram estendidas as políticas de licença paternidade remunerada.

Sem dúvida, ainda que em ritmo lento e com não poucos “brancos” ainda, a UE caminha na vanguarda global da promoção de políticas em favor da equidade de gênero, ainda mais agora quando muitas mulheres dirigem os destinos do Velho Continente.

Elas serão as encarregadas de romper o malefício. Como reconheceu em 2008 a comissária europeia Margot Wallstrom, a governança comunitária foi um “reino de homens velhos… que tramam a portas fechadas”, o que permite que “os homens velhos elejam homens velhos, como sempre”.


*Mario Muñoz Lozano, Jornalista da Redação Internacional de Prensa Latina.

**Prensa Latina, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

***Tradução: Beatriz Cannabrava

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Mario Muñoz Lozano

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