O mundo está ficando sem tempo para pôr fim e reverter os danos ocasionados pelas mudanças climáticas: os atuais padrões de desenvolvimento e as poucas ações ambientais podem levar o planeta a um ponto de não retorno.
Estas não são precisamente previsões catastrofistas de autores de ficção científica, são alertas de numerosos informes científicos, que encontram eco na ONU, objetivando chamar a atenção de toda a comunidade internacional.
Para mover à ação e buscar maiores compromissos de seus 193 Estados membros, o organismo multilateral organizou em 23 de setembro a Cúpula de Ação Climática, para a qual o secretário geral, António Guterres, pediu aos líderes mundiais que trouxessem planos concretos e não apenas discursos.
A mudança climática é uma tragédia que já se sente, e para as novas gerações o impacto será ainda mais dramático, advertiu o máximo representante das Nações Unidas em seu chamado.
A grande devastação que o furacão Dorian deixou nas Bahamas é uma amostra disso, expressou, e vemos como aumentam os eventos extremos desse tipo.
Agora mais do que nunca é necessário tomar medidas para enfrentar esses problemas e esperamos que na Cúpula de Ação Climática os países adotem maiores compromissos para alcançar a neutralidade do carbono até 2050, reduzir as emissões contaminantes e aumentar suas ambições em relação com as metas traçadas no Acordo de Paris, sublinhou o diplomata português.
Do mesmo modo, pediu que fossem incrementados os esforços em temas de mitigação e adaptação.
Guterres também assegurou que urge criar um modelo mais justo de desenvolvimento se queremos enfrentar as mudanças climáticas, e agradeceu aos jovens por sua liderança.
Ao se dirigir aos participantes da Cúpula juvenil sobre o clima, em 21 de setembro na sede das Nações Unidas em Nova York, sublinhou que muitas pessoas sofrem e morrem devido ao impacto das mudanças climáticas.
“Não vivemos uma globalização justa e aqueles que mais sofrem as mudanças climáticas são aqueles que menos contribuem para ela”, observou.
“Observo que as mudanças climáticas se movem muito mais rápido que nós, mas ainda há subsídios para os combustíveis fósseis e fábricas que queimam carvão, e nas reuniões internacionais é muito difícil o acordo em torno de temas que são óbvios, como a necessidade de acabar com tais práticas. Devemos seguir uma agenda de ação climática e globalização justa”, insistiu o secretário geral, para que os recursos possam ser distribuídos de maneira melhor.
“Mas a minha geração está fracassando nesse caminho, por isso confio nos jovens para mudar de rumo”, asseverou.
A secretaria geral adjunta da ONU, Amina Mohammed, também apelou a demonstrar liderança na Cúpula de Ação Climática, pois a situação atual é urgente e deve-se fazer algo quanto antes.
Enfatizou que todos os setores devem se unir aos planos que surjam no calor da reunião; os oradores proporão medidas concretas, e já há algumas iniciativas que têm sido propostas, mas é necessário contar com fundos para desenvolvê-las.
Insistiu em que faz falta acelerar as ações se queremos enfrentar a crise climática e alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e apontou que há que investir mais em energias renováveis para fazer a transição a sistemas limpos, e conseguir a neutralidade de carbono. Há que ser mais ambiciosos, insistiu.
ONU News
Cúpula Climática das Nações Unidas
O que diz a ciência
Este fim de semana, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) publicou um relatório que destaca a urgência de uma transformação em setores como o uso da terra e da energia para evitar um aumento perigoso da temperatura global com impactos potencialmente irreversíveis.
Existe uma evidente e crescente brecha entre os objetivos acordados para abordar o aquecimento global e a realidade, ressalta o informe Unidos na Ciência, que reúne detalhes sobre o estado atual do clima e apresenta tendências nas emissões e concentrações atmosféricas de gases de efeito estufa.
Esta pesquisa, realizada pela OMM e as principais organizações de ciência climática do mundo, examina ferramentas para apoiar a mitigação e a adaptação.
A temperatura global média para 2015-2019 está a caminho de ser a mais quente que qualquer outro período equivalente registrado.
Atualmente se estima em 1,1 graus Celsius, um grau mais alto que nos tempos pré-industriais (1850-1900).
Nos últimos anos, as ondas de calor têm sido as mais letais e afetaram todos os continentes: esses fenômenos, junto a incêndios recordes e outros eventos devastadores como os ciclones tropicais, as inundações e a seca têm hoje grande impacto no desenvolvimento socioeconômico e no meio ambiente.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o número de pessoas expostas às ondas de calor aumentou em todo o mundo, contribuindo para um maior risco de doença ou morte relacionada com esse problema.
Entretanto, informe da OMM indica que as maiores perdas econômicas mundiais estão ligadas a ciclones tropicais. A temporada de 2018 foi especialmente ativa, com o maior número de tormentas tropicais de todos os anos no século XXI.
Da mesma forma, prossegue a diminuição contínua do gelo marinho e da massa de gelo tanto na capa ártica como na antártica.
O aumento do nível do mar se acelera devido a uma maior taxa de aquecimento e derretimento das camadas de gelo da Groenlândia e da Antártida Ocidental.
Além disso, produziu-se um aumento geral de 26 por cento na acidez do oceano desde o começo da era industrial.
Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, as situações climáticas extremas se encontram entre os principais impulsionadores dos recentes aumentos da fome no nível mundial.
Amplas áreas da África, América Central, Brasil e do Caribe, assim como da Austrália, experimentaram grande aumento na frequência das condições de seca de 2015 a 2017, em comparação com os últimos 14 anos.
Nestes momentos, os níveis dos principais gases de efeito estufa de longa duração, dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O), alcançam níveis recordes.
As tendências econômicas e energéticas atuais sugerem que as emissões serão pelo menos tão altas em 2019 como em 2018, e se a economia global se descarbonizar ao mesmo ritmo que nos últimos 10 anos, isso conduziria a um aumento nas emissões globais.
Se a brecha de emissões não se fechar até 2030, é muito possível que o objetivo de um aumento de temperatura muito inferior a dois graus Celsius esteja fora de alcance. Por isso, advertem as autoridades da ONU, é tão importante incrementar as ambições imediatamente.
A Plataforma Intergovernamental de Ciência e Política sobre Biodiversidade e Serviços dos Ecossistemas também desenvolveu estudos sobre os devastadores efeitos da mudança climática, que provam que ao redor de um milhão de espécies estão em perigo de extinção no mundo e a vida diminui a taxas sem precedentes.
Entre as espécies mais ameaçadas se encontram os anfíbios, os corais e os mamíferos marinhos.
A diminuição das espécies de plantas e animais na Terra terá graves impactos nas pessoas de todos o mundo, mas a resposta global atual é insuficiente e urge uma mudança transformadora para proteger e restaurar a vida na natureza, insistiram os autores do estudo.
O informe oferece uma gama de possíveis cenários para as próximas décadas e está baseado no conhecimento indígena e local para traçar o caminho a seguir.
De acordo com Robert Watson, químico britânico implicado na realização do relatório, a saúde dos ecossistemas está se deteriorando mais rapidamente do que nunca.
“Estamos erodindo os alicerces de nossas economias, meios de vida, segurança alimentar, saúde e qualidade de vida em todo o mundo”.
Mas pontuou que não é demasiado tarde para fazer uma diferença se começarmos a agir agora em todos os níveis, desde o local até o global. Nesse sentido, necessita-se uma mudança urgente e totalmente transformadora.
*Correspondente de Prensa Latina nas Nações Unidas
**Tradução: Beatriz Cannabrava
***Prensa Latina, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.
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